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1650 II SÉRIE - NÚMERO 53-RC

crática, que têm uma composição, no meu entendimento, complicada e pouco significativa em termos democráticos.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, esta apaixonante questão faz-me recordar um velho debate académico acerca das questões do funcionalismo. Malinovsky, como é sabido, defendia a teoria do funcionalismo integral, na convicção de que a todo o órgão corresponde necessariamente uma função. Depois veio a ser superado nessa teoria por Robert Merton, quando dizia que há órgãos que deixaram de desempenhar funções...

O Sr. Almeida Santos (PS): - O caso do apêndice.

Risos.

Vozes.

O Sr. Jorge Lacão (PS): -... e é mesmo... dando lugar à teoria do equivalente funcional: é possível encontrar mais do que uma função desempenhada por um único órgão. Na verdade, e lá vamos ao caso, a realidade demonstra-nos que a assembleia municipal vê absorver funções tradicionais do conselho municipal. E por isso se explica que, na maior parte dos municípios portugueses, o conselho municipal tenha perdido a sua função porque, como órgão ao qual competia um certo tipo de representatividade social, se esgotou nessa potencialidade de representatividade, por força da existência de um outro órgão com legitimidade democrática directa - e esta é a chave da questão. Repare-se como os normativos constitucionais, em matéria de órgãos autárquicos, numa avaliação sistemática, não primam pelo grau de coerência. Enquanto no artigo 214.° se diz que "a organização das autarquias locais compreende..." - e apenas se cita - "... uma assembleia eleita dotada de poderes deliberativos e um órgão colegial executivo perante ela responsável", no artigo 250.° fala-se em três órgãos representativos. Ou seja, aparece mais um órgão que está definido como órgão representativo, mas ao qual não são constitucionalmente atribuídos quaisquer tipo de funções. O estranho disto é aparecer, no plano constitucional, um órgão que, além de ser facultativo, não tendo funções constitucionalmente definidas, todavia aparece com a natureza de órgão representativo. À luz dos princípios democráticos da representatividade consignados no artigo 116.°, a regra geral é a de que a representatividade autárquica também advém do sufrágio directo, secreto, periódico, constituindo a regra geral de designação dos titulares. Assim sendo, parece inconsistente e incoerente, no plano da estrutura e da lógica constitucionais, manter a constitucionalizacão do conselho municipal. Questão diferente: se for suprimida a referência ao conselho municipal, não poderão amanhã as autarquias, por via de legislação ordinária, vir a constituir órgãos de natureza consultiva? Evidentemente que podem.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Podem?! O Sr. Jorge Lacão (PS): - Podem!

O Sr. José Magalhães (PCP): - Com base em quê?

O Sr. Jorge Lacão (PS): - No artigo 239.°, quando lhe diz que "as atribuições e a organização das autarquias locais, bem como a competência dos seus órgãos, serão reguladas por lei", etc.. Ora, a lei, em matéria de atribuições dos órgãos autárquicos, pode-lhes conferir, como atribuição possível, a de constituírem órgãos, não de natureza representativa, mesmo que se trate de representação em sentido orgânico, mas de natureza consultiva. E, tal como o Sr. Deputado hoje, por legislação ordinária, pode criar órgãos consultivos que não intervêm na estrutura nem limitam as competências dos órgãos representativos, pode amanhã, para as autarquias locais, encontrar uma solução de tipo semelhante. Pode ter, inclusive, a faculdade genérica de constituir mais do que um órgão de tipo consultivo, quer para a assembleia municipal, quer sobretudo para o executivo municipal, onde isso mais se justifica - assessorias consultivas que não têm a natureza de órgãos representativos. Para concluir, justamente o que mais choca é ver colocado, em pé de igualdade, um órgão representativo cuia natureza não é a da representação directa, mas a da representação orgânica. Por boas e velhas razões, vale a pena eliminar esta paridade, tanto mais que a realidade a não justifica e a teoria constitucional muito menos.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, gostaria só de formular uma pergunta ao Sr. Deputado Jorge Lacão.

Há pouco tinha-se estabelecido uma espécie de consenso alargado, embora mortuário, em torno da ideia de que uma opção, como a proposta pelo PS e pelo PSD, tinha uma eficácia extintiva alargada porque seria uma eficácia proscritiva. O Sr. Deputado Jorge Lacão surge-nos com uma teoria que, a ser sufragada generalizadamente, teria um alcance totalmente diferente. Só que, por azar, essa teoria surge como uma vox insular no meio desta Comissão...

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Salvo seja, não é verdade?

O Sr. José Magalhães (PCP): - Exacto. Seria até uma honra, Sr. Deputado Jorge Lacão, se fosse no sentido que lhe ocorre, pelos vistos.

É que V. Exa. nem sequer tem nove ilhas - está sozinho na ilha única. E, nessa matéria, não se abona em nada que eu tivesse percebido. Gostaria só que o Sr. Deputado pudesse certificar para a acta quais as razões em que funda a sua teoria de que a extinção não é extinção e de que a proscrição não é proscrição, podendo o legislador ordinário "recuperar" estes conselhos agora liquidados, pela vontade conjugada do PS e do PSD, num momento adiante. Porque, ou o Sr. Deputado deixa essa hipótese bastante gizada e fundamentada, ou, se não a deixa gizada e fundamentada, é uma forma piedosa - e revelando alguma má consciência - de enterrar, não enterrando, o instituto. Das duas, uma: ou V. Exa. acha que deve ser enterrado, e diga-o, ou acha que não o deve ser, e diga-o também. Num caso junta-se a nós e noutro caso junta-