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20 DE DEZEMBRO DE 1988 1973

muito mais corajoso. Nós não teríamos tido a coragem de revogar, o PSD acha que isso é perfeitamente revogável. Faço-lhe duas perguntas muito simples: acha que nós devemos entusiasmar os juizes a dizer que não aplicam, uma lei porque ela caducou, porque não é aplicada há 30 anos? "Há 30 anos que não tenho conhecimento da aplicabilidade desta lei, portanto é uma lei sem conteúdo, não a aplico, 'passem muito bem', absolvo este criminoso porque há 30 anos que não se comete um crime destes". Acha que devemos fazer isso? Primeira pergunta. E acha que é mesmo medo respeitar uma Constituição democrática? Devo dizer que não tive medo de não respeitar a Constituição do último regime, que não era democrática. Violei-a o mais que pude, sei lá o que eu combati contra ela! Mas tenho muito medo da violação de uma Constituição democrática, do não respeito de uma Constituição democrática. E o que VV. Exas. estão a fazer é não respeitar uma Constituição democrática numa das suas normas. E não me explicaram ainda, nem o Sr. Deputado Pedro Roseta, nem ninguém, porque é que esta norma é uma norma que não deve ser respeitada enquanto todas as outras devem. Porquê esta exclusão? Esta é a única que não merece respeito? Muito bem, digam porquê, expliquem-me! Mas não me digam: "esta deve ser revogada por acto de coragem". Porquê?

Eu perguntei há bocado ao Sr. Deputado Pedro Roseta, mas ele não me respondeu, se a leitura é "terão de não respeitar", "podem não respeitar". É isso? Mas porquê? As palavras não valem todas o mesmo no texto constitucional? Estas são gafadas? Estas, com um golpe de coragem, põem-se no cesto dos papéis e as outras não? Têm de me explicar isto, para ver se eu entendo.

Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

Pedia-lhe que fosse rápido, como eu tentei ser, para ver se conseguíamos ir embora. Se não terei de delegar em si a liderança dos trabalhos.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, creio que isso será praticamente inevitável, uma vez que estão ainda em aberto as questões suscitadas pela intervenção do Sr. Deputado António Vitorino e pela própria intervenção do Sr. Deputado Almeida Santos.

O Sr. Presidente: - Não! Não vamos acabar hoje. Penso que, no próximo dia em que discutirmos os aspectos regimentais, continuaremos a discussão. Eu é que não posso levá-la para além de dez minutos, quinze minutos no máximo.

Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sra. Deputada Assunção Esteves: Gostaria de manifestar o acordo e o desacordo em relação à intervenção que produziu. E isto porque a Sra. Deputada, receando colar-se ao PCP, limitou-se a dizer alguma coisa que alguém, colado ou descolado ao PCP, sempre constatará lendo o projecto de revisão constitucional do PS, ou seja, que o PS é contraditório. E é contraditório em todos aqueles pontos que a Sra. Deputada enunciou. Portanto, o Sr. Deputado Pedro Roseta tem razão parcial em soltar gritarias de júbilo, como fez, pelo facto de o PS decair da sua posição de 1982. É que o PS decai mesmo da sua posição de 1982...

O Sr. Presidente: - Não! Muda de posição, altera-a.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Muda de posição em relação à sua posição de 1982 e muda de posição em termos de deixar em aberto o que outrem deixava fechado. Mas isso é todo um outro capítulo. Esta é a parte em que eu estou de acordo. Congratulo-me por V. Exa. estar de acordo comigo quando sublinha aquilo que é evidente na posição contraditória do PS.

A parte em que não concordo é tudo o mais. E tudo o mais é o essencial. A Sra. Deputada Assunção Esteves, na parte em que não reproduz aquilo que disse o Sr. Deputado Pedro Roseta, de outra forma, e trazendo à colação, em nome das gerações novas, Kant - o que é, pelo menos, curioso e é interessante (fico interessado por esse apelo à releitura de Kant) - fá-lo em condições que me deixam alguma perplexidade. Se bem percebi, a Sra. Deputada sustentou primeiro que, do acto voluntário do 19 de Julho, teria decorrido uma espécie de "efeito superplebiscitário" do regime constitucional do qual resultaria a legitimação de uma proposta tão derroidora como aquela que o PSD apresenta em relação ao artigo 290.° Se pudesse brotar do sufrágio a legitimação daquilo, isso seria verdadeiramente dar ao acto de 19 de Julho um carácter referendário que nem o Sr. Primeiro-Ministro, que a todos nos contempla do alto da pirâmide faraónica, ousou até hoje situar! V. Exa. fá-lo em primeira mão, mas, ou entendi mal, ou fá-lo para além de qualquer fundamento jurídico. Poderá invocar, como o Sr. Deputado Pedro Roseta, que está aqui na qualidade de deputado eleito, aliás como todos nós, e que tem um mandato político, mas deveria invocar antes três ou quatro razões jurídicas, de porte médio que sejam, para fundamentar uma tão gr anda enormidade!

Segundo aspecto: qual é o limite, Sra. Deputada Assunção Esteves? Se o limite é o fixado pela vontade do partido majoritário, de preferência mediante um acordo interpartidário que lhe dê dois terços que lhe faltem, tudo iluminado pela vontade do chefe, então a Constituição material dissolve-se numa espécie de decisionismo concreto resultante das contingências, mutações e correlações de forças e então a própria ideia de Constituição é suprimida. E, nesse caso, confesse o PSD, e confesse a Sra. Deputada, que para vós a ideia de Constituição é uma coisa perimida - a Constituição é a "vontade nossa de cada dia do chefe que haja", tal qual ele interprete a grandíssima "matriz, da liberdade e igualdade" que pode ser sempre interpretada como o PSD, por exemplo, a interpreta no seu projecto de revisão constitucional: cilindramento dos direitos dos trabalhadores, redução das liberdades, regime de excepção em relação aos direitos, liberdades e garantias, hossana à propriedade privada (direito estelar, polar e primeiro de todos os direitos, matriz de toda a panóplia dos direitos fundamentais da Constituição), liquidação da reforma agrária, nacionalizações zero, etc..! Eis em que se dissolve a "matriz da liberdade e da igualdade", tal qual é filtrada e crivada pelo espírito iluminado e provavelmente kantiano e provavelmente recheado de "imperativos categóricos" (sobretudo o da destruição de aspectos vitais da democracia tal qual foi construída em Portugal), que é imaginada pelo PSD.