17 DE FEVEREIRO DE 1989 2311
O círculo nunca é inocente, porque o percurso percorrido para lá chegar pode ser mais importante do que nos quedarmos apenas pelo ponto de origem, numa visão meramente enfática.
Quanto à problemática da inserção sistemática, tenho uma grande dificuldade em reconhecer quem é que tem razão, porque se torna evidente para mim que a consagração de uma norma deste tipo e com esta preocupação decorre directamente do artigo 1.° da Constituição, que consagra a dignidade da pessoa humana.
Ó critério valorativo em termos de consagração constitucional de uma proibição deste género é um critério de realização da personalidade humana, que tanto se afirma no plano laboral como no plano do ensino. A realização do ser humano é tão respeitável nas idades mais jovens através do sistema de ensino como através da vida familiar, como ainda através do mundo laboral. Ninguém tem a verdade absoluta e isto é uma opção difícil, que sobretudo deve ter em linha de conta que não se deve atribuir à inserção sistemática a desvalorização do que quer que seja. Portanto, nesse aspecto é que nós deixámos em aberto a inserção sistemática. E que nós reconhecemos que é uma matéria com algum melindre e que gostaríamos que, qualquer que fosse a solução adoptada, ela fosse comummente partilhada para que não se pudesse inferir a contrario que a não colocação num lado significava a menor valia dessa inserção. Portanto, era esta a prevenção que gostaria de fazer.
Quanto à intervenção do Sr. Deputado Nogueira de Brito sobre o âmbito de aplicação e o problema das condições económicas, sociais e culturais tendentes à realização dos direitos, isso é um pano de fundo de todos os direitos económicos, sociais e culturais. O Sr. Deputado Nogueira de Brito perdoar-me-á que lhe tenha que dizer que não descobriu a pólvora e que nós não estamos aqui há um ano à espera que chegasse hoje aqui, numa sexta-feira 13, a lembrar-nos de que a efectivação dos direitos económicos, sociais e culturais depende da criação das condições económicas, sociais e culturais tendentes à sua efectiva realização. Obviamente que é um pano de fundo da consagração de todos os direitos económicos, sociais e culturais que a própria Constituição reconhece como tal. O que talvez o Sr. Deputado Nogueira de Brito não tenha ponderado devidamente é se o desiderato que o Sr. Deputado pretende ler no n.° 4 do PCP é a obrigação constitucional de o Estado criar um sistema específico de remoção de condições económicas, sociais e culturais que estão na origem da contratação do trabalho de menores, isto é, se o Sr. Deputado Nogueira de Brito está disposto a subscrever connosco a interpretação de que, se o Estado não criar este sistema específico, com este fim específico - por exemplo, um regime de apoio financeiro às famílias que tenham, por razões de subsistência, necessidade de inserir no mundo laboral jovens de idade escolar -, se o Sr. Deputado Nogueira de Brito está disposto a subscrever esta interpretação e está disposto a dizer que a consagração do n. ° 4 do PCP, a não ser seguida pelo Governo através de um mecanismo específico de apoio, daria origem a uma inconstitucionalidade por omissão na realização de um direito económico, social e cultural.
Eu aprecio muito as mentalidades generosas e progressistas. Eu próprio me inscrevo nessa filiação, mas numa perspectiva realista, e não numa perspectiva pro-clamatória ou apenas panfletória. Se é esta a conclusão que o Sr. Deputado Nogueira de Brito extrai, nós até podemos estar de acordo e chegarmos a essa conclusão, mas, então, vamos tirar todas as consequências.
Um último apontamento tem a ver com a eficácia nos termos da lei, se é ou não um direito de natureza análoga. Não vou discutir quais são os critérios de integração do conceito do artigo 17.° do direito de natureza análoga. A verdade é que, quando se diz que é proibido nos termos da lei, está-se exactamente a impor a intermediação legislativa para resolver problemas tão candentes como seja o que é que se deve entender por idade escolar e quais são as ressalvas consentíveis para um mecanismo deste género. Foi exactamente aquilo que o Sr. Deputado José Magalhães disse. Não há um critério uniforme normativizador da aplicação de uma proibição deste género. É necessário que o legislador ordinário intervenha para estabelecer as destrinças justificáveis nestes casos. Portanto, é óbvio que, mesmo que se diga que é um direito de natureza análoga, que é directamente aplicável...
Portanto, é óbvio que mesmo que se diga que é um direito de natureza análoga, que é directamente aplicável, que é aponível perante terceiros, o facto de estar aqui o inciso "[...] nos termos da lei" é que dá sentido à proibição. Porque a ideia de que proibindo mais se resolve o problema às vezes é uma ideia enganadora e falaciosa. É necessário garantir espaço de intervenção do legislador ordinário para permitir que a conformação desta proibição seja eficaz e não seja apenas um voto pio.
O Sr. Presidente: - Há pouco o Sr. Deputado Miguel Macedo e Silva apelou directamente à presidência a propósito da questão da formulação.
Os Srs. Deputados ajuizarão, mas a ideia que posso retirar deste debate é a seguinte: em primeiro lugar, existe consenso acerca da consagração constitucional da desvalia do trabalho de menores, salvo, evidentemente, havendo umas razões justificativas que são excepcionais.
Em segundo lugar, também foi claro que essa desvalia pode ser inserida sob diversas perspectivas: a da família, a da educação dos menores e a do trabalho.
Em terceiro lugar, foi suficientemente salientado que não é possível resolver este problema, em termos constitucionais, de uma vez por todas e para sempre, não atendendo à especificidade dos condicionalismos. Daí as referências, de uma maneira ou de outra, à legislação ordinária, à intermediação do legislador. Tenho as maiores dúvidas, mas evidentemente que se VV. Exas. insistirem, eu aceitarei, de que o legislador constitucional possa ir muito além, porque não lhe cabe especificar todos os casos, quer resultantes do sector do ensino, quer resultantes da família, quer resultantes do trabalho, quer da educação em geral, que levam a introduzir excepções e acomodação à maneira como o valor se refracta nas diversas circunstâncias da vida.
Assim, a ideia que eu tenho é que as formulações apresentadas, designadamente as duas que estão mais directamente em jogo, isto é, a apresentada pelo Partido Socialista e a anteriormente apresentada pela ID, além da formulação do PCP, espelham as diversas tonalidades que foram aqui já objecto de explicitação. Por isso estamos em condições de votar.
O Sr. Pedro Roseta (PSD): - (Por não ter falado ao microfone, não foi possível registar as palavras iniciais do orador.)... não quero falar pela boca dos