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30 DE SETEMBRO DE 1992 65

pouco mais precipitada, eliminar o desenvolvimento e a articulação de todas estas possibilidades. Aliás, suponho que isto vai ao encontro da intervenção de V. Exa. e está na linha da tradição constitucional portuguesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Começaria por posicionar-me relativamente a um aspecto que (em algo a ver com este que está agora em discussão e que, segundo creio, já foi, de alguma maneira, abordado pelo Sr. Deputado José Magalhães, e que tem a ver com a entrada em vigor do Tratado de Maastricht.

Com efeito, mesmo considerando as previsões mais optimistas sobre a entrada em vigor do Tratado de Maastricht, ou de algo semelhante, penso que não será nos anos mais próximos que esta disposição, tal como se pretende configurar, terá eficácia. Isto é, nos anos mais próximos, o Banco de Portugal terá de manter, no plano interno, o seu estatuto de banco central com todos os efeitos. E a eliminação, mesmo que só na letra da Constituição, do exclusivo da emissão de moeda não poderá, obviamente, deixar de ter efeitos imediatos no plano interno, pois desconslitucionaliza-se o exclusivo da emissão da moeda pelo Banco de Portugal.

Compreendo que os signatários desta proposta, o PSD, em concreto, ao proporem o abandono deste exclusivo e ao retirarem a referência à emissão da moeda pelo Banco de Portugal, têm como intenção obviar á insconstitucionalidade do Tratado tal como foi assinado e como se pretende que seja ratificado. Agora, creio que esta supressão poderá não se lúnitar nas suas consequências aos aspectos decorrentes do Tratado e, obviamente, que teria como efeito, pelo menos, no plano constitucional, reduzir ou minimizar o papel do Banco de Portugal, como banco central, no direito interno.

Há pouco, retive a ideia, que me pareceu estar subjacente á intervenção do Sr. Deputado José Magalhães, de que a formulação proposta pelo Partido Socialista teria em mente salvaguardar precisamente esse estatuto do Banco de Portugal até à entrada cm vigor do Tratado. Não sei se estou a entender bem, mas, de qualquer maneira, creio que seria útil ter presente a forma de salvaguardar, no plano interno, o estatuto do Banco de Portugal como banco central, independentemente das circunstâncias que decorram da adaptação do texto constitucional à ratificação do Tratado.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Oliveira Martins.

O Sr. Guilherme Oliveira Martins (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Tomando este tema abordado agora pelo Sr. Deputado António Filipe, e se, de algum modo, interessa saber as razões subjectivas pelas quais foi introduzida essa referência no nosso projecto de revisão constitucional, cabe-me esclarecer que, de facto, ele tem em vista assegurar o regime para o período que vai entre a aprovação da revisão constitucional e o ano de 1997 ou de 1999. Mas não apenas! Não se trata de uma fórmula para cobrir um período transitório. Tem a ver, antes de mais, com a própria técnica usada no Tratado.

Como sabem, a técnica usada foi a de prever já a solução final - e é isso que o artigo 105.°-A consagra - e prever, numa norma transitória, aquilo que vai ser o regime até 1997 ou 1999, altura da entrada em funcionamento do Sistema Europeu de Bancos Centrais.

Ora, esta técnica obriga, em bom rigor, a que olhemos a lei fundamental, tendo em consideração justamente aquilo que vamos, desde já, aprovar e que é a solução definitiva, que vai corresponder ao sistema a consagrar em 1997 ou 1999, consoante os casos.

Nesse sentido, entendemos que o texto do artigo 105.° da Constituição deve ser, extraordinariamente, cauteloso e rigoroso. E evidente que percebemos a argumentação aduzida, designadamente, pelo Sr. Presidente para justificar a retirada ou a desconstitucionalização da referência à emissão monetária. No entanto, permito-me invocar o argumento de alguns iminentes juristas que, ao discutir-se a questão de haver ou não necessidade de proceder à revisão constitucional, chegaram a dizer que, em bom rigor, o artigo 105.° podia continuar em vigor, uma vez que se trata do exclusivo interno da emissão monetária, que pertence ao Banco de Portugal. Mas, repito, só se houvesse exclusivo interno da emissão monetária.

Não concordo e nunca concordei com esse argumento, mas invoco-o, aqui, justamente para salientar que a questão da emissão monetária tem de ser vista com especial cautela e tendo em consideração o que o Sr. Deputado Nogueira de Brito acabou de dizer a propósito da formulação do artigo 105.°-A, o qual consagra que "O BCE tem o direito exclusivo de autorizar a emissão de notas". Ora, tem o exclusivo da autorização. Neste sentido, quem é que vai deter o direito de emissão? Os bancos centrais dos países, ao participarem neste Sistema Europeu de Bancos Centrais. Eles vão participar também, no âmbito europeu, desse direito.

Portanto, penso que esta formulação não é apenas para cobrir o período que vai até 1997, mas também para salvaguardar uma posição do próprio banco central no contexto do Sistema Europeu de Bancos Centrais. É evidente que - e aqui temos de ver sempre um lado e o outro das coisas, temos sempre de fazer o papel de advogados do diabo relativamente às diversas questões -, quando se fala em constitucionalização e em não constitucionalização, a verdade é que até 1976 a Constituição não consagrava esta matéria, que era não só matéria de lei ordinária, mas também de contrato, porque o Banco de Portugal tem o privilégio exclusivo de emissão monetária, no actual regime, por virtude do contrato de 1891. Ou seja, o contrato pelo qual o Banco de Portugal passou a ser o único a emitir moeda. Como sabemos, até aí havia dois bancos: o Banco do Porto e o Banco de Portugal para a Regiões de Lisboa e Sul.

O Sr. Presidente: - No espaço continental, não é?

O Sr. Guilherme Oliveira Martins (PS): - Exactamente! Além disso, havia o Banco Nacional Ultramarino para as colónias. Mas, refiro-me ao espaço continental, porque o contrato de 1891 se reporta a esse espaço.

Nesse sentido, e em conclusão, deixaria apenas duas notas a terminar a minha intervenção: a necessidade de cautelas especiais na formulação do artigo 105.° da Constituição. Deve prever-se não apenas este estatuto do Banco de Portugal até 1997 ou 1999, mas também salvaguardar a posição do Banco no contexto do sistema europeu de bancos centrais, pois ele vai ter, na prática, o privilégio da emissão, não em termos únicos, não em termos isolados, mas no contexto de um sistema.