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Portanto, consentiria manter esse equívoco desde que se desse algum sinal verbal de que, apesar de tudo, não se trata da mesma relação, já que uma é uma relação material - a relação entre a lei de enquadramento orçamental e a lei do Orçamento é uma relação de dependência material. Isto é, a lei do Orçamento tem de respeitar, na sua formação e no seu conteúdo material, a lei do enquadramento orçamental. A relação das leis orgânicas com as outras leis, na realidade, não é nenhuma. O que a expressão "lei orgânica" quer dizer é que certas matérias têm de revestir certa forma, têm de ser aprovadas de certa maneira, estão sujeitas a certos regimes de aprovação e de fiscalização preventiva, mais nada.
Mas, se não vos convenço neste ponto, proponho que, apesar de tudo, se faça pelo menos uma distinção quanto ao facto de esse carácter reforçado das leis orgânicas não ser da mesma estirpe das leis propriamente reforçadas, como, por exemplo, a relação entre as leis da República e leis regionais.
Em suma, a minha proposta concreta, que fica feita, é no sentido de consideramos três questões diferentes: uma, a proposta do PCP sobre a relação entre leis e decretos-leis (segunda parte do n.º 2 da proposta do PCP); outra, a separação normativa entre as duas relações que enunciei; e, por último, a definição de leis de valor reforçado.
Se estiverem de acordo com esta arrumação da matéria e tomada de posição, passaríamos à discussão de cada uma delas, começando pela proposta do PCP para a preclusão do poder legislativo do Governo face à existência de leis da Assembleia da República. Na verdade, o que o PCP propõe é que, sempre que haja lei da Assembleia da República, fica precludido o poder concorrencial do Governo, o qual, a partir dessa altura, só pode revogar leis da Assembleia, mesmo fora da competência reservada, se autorizado pela Assembleia. Este é o conteúdo da proposta do PCP.
Srs. Deputados, convido-os a tomarem posição sobre esta matéria, apesar de ela já ter sido mais ou menos explicitada.
Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá.

O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, o argumento do Sr. Deputado Cláudio Monteiro, segundo o qual a tradicional separação de poderes foi substituída por uma nova separação de poderes entre o Governo e a oposição, que é, de resto, uma posição que já tive oportunidade de publicamente perfilhar - como é sabido, a doutrina italiana (De Vergottini e outros) tem exactamente essa opinião -, só levaria a valorizar a proposta do PCP, porque, na prática, com muita frequência, designadamente em situações de maioria absoluta parlamentar, o líder do Governo é o líder efectivo da maioria parlamentar. Sabemos que, em geral, a prática é mais ou menos esta, dependendo, naturalmente, dos sistemas políticos.
Contudo, este facto não retira importância, pelo contrário, à actividade parlamentar, porque é no seio do próprio Parlamento que se pode operar, em grande medida, a separação de poderes entre Governo e oposição. Se um Governo serve para diminuir a actividade parlamentar, então, haverá mais diplomas legais aprovados no seio do conselho de ministros sem o princípio do contraditório entre Governo e oposição e sem o papel da oposição.
Logo, o argumento do Sr. Deputado Cláudio Monteiro só levaria a reforçar a importância da proposta do PCP, designadamente como instrumento de valorização da separação de poderes entre o Governo e a oposição, na medida exacta em que daria maior importância ao papel da oposição no seio do próprio Parlamento, como deve ter fora do Parlamento.
Portanto, eu diria que o argumento aumenta a relevância da nossa proposta em vez de a diminuir.
Quanto ao instituto da ratificação, tenho alguma dificuldade em compreender que, em relação a decretos-leis alterados pela Assembleia da República, o Governo possa, no dia seguinte, fazer um decreto-lei repondo aquilo que a Assembleia da República alterou. É um exemplo que levaria exactamente ao contrário daquilo que o Sr. Deputado Luís Marques Guedes quis referir.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Se a Assembleia pode fazê-lo, por que é que o Governo não faz?

O Sr. Luís Sá (PCP): - Exactamente porque partimos do princípio de que deve ser afirmada a supremacia legislativa da Assembleia da República. E, como é sabido, o Governo não pode ratificar leis da Assembleia da República, é a Assembleia da República que pode ratificar decretos-leis do Governo. E isto tem de ter um sentido e um efeito prático, e o efeito prático só se pode justificar nesse plano com a supremacia legislativa parlamentar.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Permite-me que o interrompa, Sr. Deputado?

O Sr. Luís Sá (PCP): - Faça favor.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Mas, então, isso só seria aceitável se fosse criada constitucionalmente uma esfera significativa de reserva de competência do Governo, o que não acontece.

O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Deputado, como é sabido, a nossa posição, nessa matéria, caracteriza-se, até para efeitos pragmáticos, por bastante prudência. O Sr. Deputado não nos tem visto apresentar projectos de lei sobre tudo, correspondendo à ideia de que o País deve ser governado a partir do Parlamento, o que não significa, de forma alguma, que possamos contemporizar com uma prática de subalternização do Parlamento ou com a criação de uma reserva de administração perfeitamente desmedida, como eventualmente haveria tentações num outro plano. Se, no fim de contas, o Sr. Deputado tanto quer, como moeda de troca para aceitar a supremacia parlamentar, a criação de uma desmedida reserva de administração, não apenas de regulamentos independentes, que aqui estão, mas igualmente de toda uma série de outras medidas, então, diremos que lamentamos muito mas teremos, com certeza, grandes dificuldades em conceber essa matéria.
Agora, o que nos parece, insisto, é que é um bom princípio do Estado democrático e da valorização do papel da oposição, do contraditório Governo/oposição e, em geral, do acompanhamento da actividade legislativa por parte da opinião