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O dever de trabalhar só pode ser entendido sinalagmaticamente, repito, em correspondência com a livre opção de celebração do contrato de trabalho.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Elisa Damião.

A Sr.ª Elisa Damião (PS): - Sr. Presidente, penso que percebi bem a intervenção do Sr. Deputado Marques Guedes. Não estava, certamente, a defender a teoria de Paul Lafargue para que inscrevêssemos na Constituição o direito à preguiça. Mas, se o direito ao trabalho é constitucionalizável, o direito à preguiça também seria.
A verdade é que, embora perceba a norma histórica, que, portanto - como diz o Sr. Deputado José Magalhães -, serve para reforçar o direito ao trabalho e o acesso ao trabalho, não deixa o Sr. Deputado, sob o ponto de vista meramente filosófico, de ter razão, desde que inscreva outros direitos, nomeadamente à contemplação, à não acção, etc., e isso levar-nos-ia longe.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos

A Sr.ª Odete Santos (PSD): - Sr. Presidente, relativamente à interpretação desta norma constitucional, creio poder entender-se que ela é programática e destina-se a realçar que o trabalho forma o próprio homem, forma o desenvolvimento do próprio homem e é só nesse sentido que aí está.
Embora não tenha acompanhado toda a intervenção, porque estive ao telefone, a verdade é que ouvi falar em trabalho forçado e a norma não significa nada disso. Tem a ver, de facto, com o realçar que é através do trabalho que o próprio homem, como ser humano, se desenvolve. E é nesse sentido que está aí.

O Sr. Presidente: - Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, face a esta intervenção da Sr.ª Deputada Odete Santos, sou levado a perguntar o seguinte: se é assim como a Sr.ª Deputada diz, então, este direito está mal colocado aqui, pois devia estar nos direitos pessoais e não nos direitos económicos.
Posso lembrar à Sr.ª Deputada que aquilo que acabou de dizer está em total contradição com a inserção sistemática deste direito, porque isto está no capítulo dos direitos e deveres económicos e, portanto, tem a ver não com uma lógica de desenvolvimento da personalidade ou de afirmação da pessoa ou de completação da pessoa, enfim, como a Sr.ª Deputada quis exprimir na sua intervenção, mas como organização económica do próprio Estado.
Portanto, se é aquilo que a Sr.ª Deputada quis dizer, pois, então, já está lá atrás, no direito ao livre desenvolvimento da personalidade e, se quiser, à realização pessoal e, neste caso, poderia ficar no plano dos direitos pessoais. Se é isto que a Sr.ª Deputada quis dizer, então, do seu ponto de vista, a inserção sistemática está errada e não é, de facto, de um direito económico que se trata mas de um direito pessoal. Esta é a pergunta que lhe faço.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - É natural que sim, é natural que até, face a anteriores revisões da Constituição, já não houvesse nenhum motivo político para manter este direito (direito acompanhado de um dever), neste capítulo, devendo ser mudado para os direitos fundamentais.
Contudo, apesar de não ter estado presente na Constituinte, desenvolvendo algum raciocínio, se calhar, o facto de estes direitos estarem afastados durante algum tempo, mercê do texto constitucional, do regime dos direitos fundamentais, poderá ter tido alguma influência na colocação do preceito. E hoje bem poderia passar para os direitos fundamentais, na medida em que se lhe aplica também o regime daqueles direitos.
Esta é uma interpretação que faço e penso que, de facto, é a interpretação filosófica correcta do preceito.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada Odete Santos, porventura, estamos com um problema. É que se estamos a encarar o dever de trabalhar como um dever de natureza moral, ligado à natureza ontológica do ser humano, estamos a lidar com um conceito metaconstitucional que, porventura, não tem alcance jurídico.
Se queremos colocar este conceito em pé de igualdade com o conceito de direito ao trabalho, temos que determinar o alcance jurídico que este conceito tem em sede constitucional. E, então, se algum alcance jurídico teria, era o de habilitar o legislador a definir formas de dever de trabalhar por razões de interesse social.
Suponho que essa interpretação da Constituição até hoje não foi feita. Diria, até, felizmente não foi feita.
Se assim é, então, talvez isso mostre que esta norma pode ser superabundante relativamente à consciência jurídica actual. E eu inclino-me a pensar que é, Sr. Deputada Odete Santos.
Tem a palavra o Sr. Deputado Calvão da Silva.

O Sr. Calvão da Silva (PSD): - Sr. Presidente, é natural que esta norma se pudesse riscar da Constituição, com o que nada se perdia. Nem se perde nem se ganha! O que lá está é a letra, mas, do seu conteúdo prático, ninguém tira nada de novo, quer o texto se mantenha quer se tire. Continuará a ser depois como tem sido antes.
E, a ter algum sentido jurídico, é o de que quem quer um direito ao trabalho sabe que, se tiver concretizado esse direito, tem o dever de trabalhar. Não se trata do direito a um emprego sem trabalho. Tem de trabalhar mesmo! Só tem este sentido útil.
Por isso até o PS andou bem, chamando Ministério do Emprego e não Ministério do Trabalho!

O Sr. Presidente: - É caso para dizer, Sr. Deputado Calvão da Silva, que argumentou bem a favor da necessidade de eliminação da proposta, embora a título da sua defesa.

O Sr. Calvão da Silva (PSD): - Não se trata de eliminação. Para mim é indiferente estar ou não estar lá porque o seu alcance é de letra morta. Tem este sentido, todavia, útil: quem quer trabalhar tem esse direito mas também tem o