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Tem a palavra o Sr. Deputado Barbosa de Melo.

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): * Sr. Presidente, eu gostava de dizer que tenho alguma responsabilidade na consagração na Constituição de 1976 do princípio da autonomia do Ministério Público e não me arrependo. Acho que foi um grande passo que a organização do poder judicial deu no nosso país. Foi um tempo útil todo o tempo decorrido até agora. Há, todavia, algumas correcções a fazer e julgo que o artigo 221.º, tal como vem proposto e resulta do acordo firmado entre os dois partidos, consegue estabelecer esse equilíbrio.
Em primeiro lugar, mantêm-se as funções do Ministério Público de representação do Estado, defesa dos interesses que a lei determinar e depois corrige-se aí qualquer exagero que na prática diária se instalou no nosso país dizendo-se que compete ao Ministério Público - com a observância do princípio de que tem um estatuto próprio e goza de autonomia nos termos da lei - participar, isto é, ser parte activa naturalmente na execução da política criminal definida pelos órgãos de soberania.
Acho que este novo inciso introduzido no artigo 221.º clarifica e melhora a prática que aí está a ser observada diuturnamente da verdadeira autonomia que deve ter o Ministério Público. Sobretudo, não é nas acções mas é nas ideias que em torno delas se formam e circulam na opinião pública, estamos por vezes diante de idola forae, de ídolos do foro do que anda aí na voz pública, no sentido de que na agora (era a versão grega da palavra fórum), de que quem realiza a política criminal é o Ministério Público e estamos assim numa situação em que no fundo ninguém responde politicamente por nada e isto é um gravame na estrutura do Estado de direito. A política, a orientação geral nomeadamente daquilo a que se chama a política criminal, tem de ter por trás quem assuma responsabilidade política sob pena de cairmos em auto-gestão, em órgãos autocráticos que fazem a Justiça.
E lembro a velha lição dos federalitis paper de que o pior do despotismos é aquele que assume a forma judicial, nas suas várias vertentes.
Considero que aquilo que aqui se faz neste n.º 1 do artigo 221.º, melhora a compreensão correcta do sistema que está aí subjacente à Constituição e que tem sido objecto, repito, na opinião fácil que sobre ele se fez, objecto de alguma perversão. Julgo que ao dar este passo a Comissão Eventual para a Revisão Constitucional reintroduz uma correcta orientação da posição do Ministério Público na economia do poder judicial, sendo certo que lhe mantém, insisto, o estatuto próprio e o princípio da autonomia que é fundamental, aliado, aliás, ao princípio da legalidade no exercício da acção penal.
Era isto que eu queria dizer e congratular-me com este passo dado, aqui, na proposta comum.

O Sr. Presidente: * Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá para pedir esclarecimentos.

O Sr. Luís Sá (PCP): * Sr. Deputado Barbosa de Melo, eu gostaria de fazer-lhe um pedido de esclarecimento. Sem prejuízo do mérito histórico do Sr. Deputado na consagração do princípio da autonomia do Ministério Público na Constituição, há um debate que se tem verificado e não apenas em Portugal, também lá fora, mas em Portugal verificou-se, e que diz respeito em particular ao problema do papel do Ministério Público e das Polícias Judiciárias nas situações de corrupção ou criminalidade em órgãos da administração pública, eventualmente no seio do próprio governo.
Recordo designadamente que no tempo do governo anterior, este problema foi particularmente debatido e que normalmente o problema da definição de prioridades no campo da acção penal não tinha que ver propriamente com definir num determinado momento que tinha prioridade o combate à criminalidade altamente organizada, para usar um termo que foi referido ontem, o combate ao grande tráfico de droga ou a certo tipo de criminalidade, mas que era sobretudo isto que estava em causa. Isto é, um determinado governo num determinado contexto poder utilizar competências em relação ao Ministério Público no sentido de, por exemplo, deixar para segundo plano a investigação de eventuais casos de corrupção, tratados ou não nos jornais, tratados ou não tratados no Parlamento, que não conviessem ao governo, por razões eleitorais ou quaisquer outras.
O caso italiano foi particularmente sensível neste plano - houve, aliás, uma ampla literatura como é sabido em relação a esta matéria. E é neste sentido exacto que, quando se coloca esta questão, normalmente há objecções, em particular dos magistrados do Ministério Público que temem um poder de orientação do governo, o que, em termos gerais, acho que não está em causa, não creio que esta definição de prioridades de acção penal tenha no fim de contas este tipo de utilização.
Como eu conheço, como o Sr. Deputado conhece, este tipo de inquietações do Ministério Público, incluindo do Sindicato de Magistrados do Ministério Público, por exemplo, e como conhecemos igualmente os debates já travados, designadamente a propósito do problema da corrupção, eu perguntava ao Sr. Deputado se não teme que o enfraquecimento neste contexto do princípio da autonomia do Ministério Público possa vir a ter leituras perversas do tipo das que eu referi.

O Sr. Presidente: * Obrigado, Sr. Deputado Luís Sá. Como é uma pergunta ao Sr. Deputado Barbosa de Melo, peço-lhe o favor de responder.

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): * Muito obrigado, Sr. Deputado Luís Sá, pela pergunta que me fez e que me permite clarificar a minha ideia sobre esse ponto.
Julgo que todas as modificações podem ter perversões, nunca se faz nada, enfim quem tiver algum senso saberá que nunca faz nada para a eternidade… Amanhã pode verificar-se que aquilo que se faz hoje precisa de emendas. Neste momento julgo que os receios que o Sr. Deputado Luís Sá adianta não me são verosímeis, e eu digo porquê. Não é correcto, nem aqui nem em Itália e nenhum sítio, responsabilizar um governo em funções pela insegurança, pela falta de uma política criminal adequada, se ele governo não tem instrumentos para orientar a política criminal que está a ser seguida. Dizer a um órgão autónomo do governo: tu fazes a política criminal que entenderes se fazes assessoriamento das perseguições que há a fazer em nome da legalidade mas estás isento de qualquer orientação do governo e depois ir pedir responsabilidades ao governo porque há insegurança, porque não se combate a criminalidade nas áreas sensíveis para a comunidade, isto não faz sentido!! Quem orienta a política criminal tem de responder politicamente, isto é, tem de ser chamado ao Parlamento e dizer: o senhor está a fazer mal, tem eventualmente de ver aprovada uma moção de censura que o faça