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8 ANNAES DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

char o Parlamento pelo facto das sessões serem muito agitadas?

O Parlamento conservou-se aberto e o Sr. José Luciano só deixou o poder passados tres annos, por causa do ultimatum inglês.

Durante aquelle periodo, as desordens, os barulhos, as questões irritantes, as provocações, os insulteis pessoaes eram de todos os dias, e a Camara não se fechou. Eram interrompidas as sessões muitas vezes, mas o Parlamento continuou com os seus trabalhos.

Folgo muito com as declarações feitas pelo Sr. Ferreira do Amaral, de desejar viver com o Parlamento. É esse o melhor caminho que S. Exa. tem a seguir.

Naquelle periodo de 1886 a 1890, um dos mais bulhentos, um dos maiores arruaceiros era o Sr. João Franco. Partiam-se carteiras por tudo. Nem sequer se procurava um pretexto para fazer barulho.

Pois o Sr. João Franco, que foi o principal heroe das scenas passadas na Camara dos Senhores Deputados durante os annos a que acabo de me referir, não quis que no Parlamento se tratasse da questão academica, que impressionava todo o país.

Foi a sua desgraça.

Se o Sr. João Franco tivesse dado, ao menos, uma sessão para se discutirem aquelles factos, estava salvo. Bastava que a meio da sessão um Deputado requeresse para se prorogar a sessão até se esgotar o incidente.

Os nervos do chefe do Governo prevaleceram sobre um acto de prudencia e reflexão, que teria salvo tudo.

Fechou a Camara abruptamente e d'ahi a pouco dissolvia-a. Para quê, se a Camara estava fechada e não incommodava ninguem?

Depois seguiu se o que todos sabem.

Os actos de loucura succediam-se quasi ininterruptamente, pondo o país em sobresalto continuo. Parecia que uma atmosphera de chumbo pesava sobre a nação portuguesa.

Os mais prudentes, os mais reflectidos estavam alarmados sem saberem para onde os podia impellir o Governo com os seus actos despoticos.

Todos previam graves e tragicos acontecimentos. Toda a gente via que o cataclismo era inevitavel, pois factos analogos, em todos os tempos, produziram resultados semelhantes. Os povos nunca supportaram que os esmagassem sem reagir. Essa reacção tem levado mais ou menos tempo, conforme as epocas e as circunstancias, mas nunca falhou.

Vamos ao tempo da Inquisição, em que se levavam os homens e até mulheres ás fogueiras para serem queimados vivos, em que se emparedava gente, em que se faziam soffrer as maiores torturas aos que por uma simples denuncia não pareciam affectos á seita.

Qual foi o resultado?

Foi os povos reagirem e revoltarem-se, logo que puderam, e acabarem com quem tantos morticinios infligiu aos seus semelhantes.

Por fim acabou.

Levou tempo, mas não houve outro remedio senão exterminar aquellas feras humanas que tanto terror inspiravam á humanidade.

O que faz um individuo que não se pode manifestar e que não pode expor a sua opinião?

O que ha de fazer um individuo que se vê perseguido, que se vê atropelado nos seus direitos e nas suas regalias?

Reclama dentro da lei, protesta por todos os meios, reage como pode até ver se consegue justiça.

E se não consegue, que ha de fazer?

Trata de, por todos os meios ao seu alcance, readquirir os seus direitos. Isto é humano.

Até os proprios irracionaes, quando se vêem maltratados, se revoltam e reagem como podem.

O que aconteceu depois de 1807, quando a familia real embarcou para o Brasil e o país ficou dirigido por uma regencia inspirada pelo general Beresford, que esteve governando Portugal e que por todas as formas tratava de opprimir e de victimar o povo?

Foi obrigado a sair de Portugal depois da revolução de 1820.

Os seus processos despoticos, o seu genio autoritario, as suas constantes perseguições foram taes e tantas que enforcou na esplanada de S. Julião da Barra o eminente general Gomes Freire de Andrade, e os seus companheiros no Campo de Santa Anna, hoje denominado Campo dos Martyres da Patria.

Beresford. ainda não contente com os poderes que tinha, foi ao Brasil arrancar ainda mais poderes a D. João VI. Quando, regressou estava a revolução triunfante, que o não deixou desembarcar, vendo-se o país livre do seu despotismo.

Vem depois D. Miguel, que jurando a Constituição se proclamou pouco depois Rei absoluto.

Não contente com isto, começou a enforcar, a prender, a encerrar nas mais infectas masmorras os mais prestantes cidadãos d'este país, a confiscar os bens dos que não concordavam com os seus actos despoticos, emfim a praticar toda a especie de tyrannia.

O que lhe aconteceu?

Foi obrigado a sair de Portugal para não mais voltar, porque isto anda para deante e não para trás.

Se D. Miguel fosse um Rei liberal, se não fosse um despota, era decerto a sua descendencia que hoje ainda governaria Portugal. Se nesse tempo não tivesse havido Joões Francos não teria aquelle Rei terminado no exilio os seus dias.

Mais tarde apparcce-nos o Governo de Costa Cabral, que tambem quis governar á João Franco.

Qual foi o resultado?

Foi a revolução de 1846, a chamada revolução da Maria da Fonte.

Mas não foi só em Portugal que estes factos se deram e produziram os resultados que tenho apontado.

Em Espanha succedeu o mesmo, a Isabel II.

Em virtude dos processos analogos praticados pelos Ministro d'aquellas Rainha, Narvaes e Gonçalves Bravo, foi desterrada e tambem acabou no exilio os seus dias.

Vamos á França e á Inglaterra.

Porque é que Carlos I foi ao cadafalso?

Porque attentou contra as regalias parlamentares.

Porque é que Luiz XVI foi ao cadafalso?

Porque não tinha iniciativa alguma, e ora recuava, ora avançava.

Porque é que Luiz XVIII, Carlos X e Luiz Filippe foram destronados?

Por cousas analogas.

Pois a historia não é a mestra da vida?

Como era possivel haver uma excepção para um caso semelhante que se passava entre nós?

Não podia ser.

A historia, que é a mestra da vida, não serviu de ensinamento ao Sr. João Franco.

As mesmas causas produzem os mesmos effeitos em toda a parte.

O povo português é bom, amoravel, dedicado e trabalhador, mas é preciso que lhe respeitem os seus direitos e regalias.

A autoridade que for com elle afavel, attenciosa respeitadora e não queira expoliá-lo, que governe com a lei, que lhe dê todas as garantias de liberdade, que os seus maiores conquistaram á custa do seu sangue, não encontra difficuldades e é querida, estimada, respeitada e obedecida.

Não ha povo mais docil, mais submisso do que o povo português, quando lhe respeitam os seus direitos e a autoridade, em vez de ser despotica, é fraternal.

O grande erro do Sr. João Franco foi suppor o povo apathico, narcotizado, incapaz de reagir aos actos despoticos por elle praticados.

Suppôs que podia impunemente cal-