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SESSÃO N.° 43 DE 18 DE AGOSTO DE 1908 7

que é do Estado, e que este, por determinado e exclusi-o fim, lhe concedia, não é proprio da missão immaculada de chefes da Nação.

Mas a Casa Real não pode prescindir d'essas rendas?

Melhor valeria então expor-se a verdade, entregar esses palacios ao Estado e aumentar se claramente, á luz do sol, a lista civil!

Quer se porem, conservar á C era faculdade do arrendamento?

Pois bem. Os arrendamentos quando feitos ao Estado sejam antes approvados pelas Côrtes.

Evitam-se as suspeitas, acaba-se com o favoritismo que possa haver das regiões officiaes em favor da Coroa. E porque isso só redunda em proveito e lustre moral do Rei, sem até lhe tocar em interesses materiaes, e porque isso convem aos interesses do país e aos direitos do Parlamento, proponho que ao artigo 6.° se acrescente o seguinte:

«§ unico. Dependem de previa approvação das Côrtes os contratos entre o Governo e a Fazenda da Casa Real para arrendamento e utilização, em serviços publicos, de quaesquer bens da Coroa que possam ser arrendados nos termos da lei de 1855. Fica tambem entendido que para os fins de que trata o artigo 5.° da mesma lei de 16 de julho do 1855 é indispensavel a previa decisão das Côrtes».

Assim, acaba-se com uma fonte de abusos.

Não se pode, senão por intermedio do Parlamento, arrendar ao Estado palacios reaes, com suas quintas, dependencias e jardins.

Nem pode fazer-se nelles as obras, construcções, aformoseamentos, melhoramentos e acquisições sem previa autorização das Côrtes.

A Coroa não perde - e, se perdesse, mais vale, muito mais, a sua honra! - e a nação vê, sabe claramente, como se gasta o dinheiro nos Paços Reaes e não tem a menor duvida sobre a legalidade e escrupulo com que o Estada paga rendas á Coroa.

O contrario d'isto é proseguir num passado de trevas e de suspeições.

Na grande Inglaterra, a simples entrega do palacio e jardins de Claremont House á Rainha de Inglaterra foi motivo de grande debate no Parlamento Inglês, tão fervorosamente monarchico e tão sentimentalmente affeiçoado á Rainha Victoria.

Nesse grande país, é tal a meticulosidade na applicação dos dinheiros do povo, na conveniencia e opportunidade do pagamento das obras dos Paços e de outras despesas que, como disse na nossa Camara dos Deputados um dos seus mais illustres oradores, no orçamento das despesas dos Paços, apresentado ao Parlamento, até vem designada a verba consagrada, como gratificação de Natal, ao jardineiro do Palacio do Buckingham.

Por isso, por estes e outros significativos factos, o prestigio da Monarchia, que ali se identifica com o amor e respeito ás liberdades publicas, com um religioso cuidado pelo dinheiro do povo é tão profundo, tão intenso, e cada vez cresce e se afervora mais.

Mas - dirá alguem - como se pode demorar a dotação da lista civil, se o Rei precisa da sua dotação para viver? Não teem responsabilidades as opposições, no longo debate travado á volta d'este assunto? Não. Se o Governo tivesse reunido as Côrtes, immediatamente á morte do Senhor D. Carlos, poder-se-hia logo tratar da fixação da lista civil. E isso é o que seria perfeitamente constitucional. Mas poderá objectar-se: se a lista civil deve ser apresentada parcelarmente, com um estudo demorado das differentes verbas, e em face das informações da administração da Casa Real ou do resultado de um inquerito parlamentar, como poderia fixar-se, logo, a lista civil? O Parlamento votaria, interinamente, temporariamente, até uma resolução definitiva, as sommas que julgasse necessarias para a sustentação e decoro do Rei. Não podiam - não discuto a hypothese - reunir-se logo as Côrtes? Urgia dissolvê-las? Acceitemos a hypothese. O Parlamento era convocado somente, como o foi, para começos de maio? Havia tempo, e mais que tempo, desde fevereiro até aquella epoca de se organizarem todas as informações, todos os orçamentos, sobre a administração da Casa Real. Mas supponhamos que não havia. Então - e assim foi proposto pelo Sr. Dr. Egas Moniz em nome da dissidencia - então o Parlamento votaria provisoriamente as sommas que parecessem indispensaveis para a sustentação e decoro da Familia Real. E, depois, se fixaria a lista civil, colhidos honradamente todos os elementos de informação. Se esses elementos honestos e serios de informação mostrassem que a somma a arbitrar legitimamente devia exceder um conto de réis por dia, eu não hesitaria em votar essa somma maior.

O contrario não seria honesto. É isto o que devia fazer-se. Assim como um dos primeiros passos do Governo devia ser o ordenar-se o proseguimento rapido, immediato, do inventario judicial dos bens da Coroa immoveis e moveis, «avaliando-se os moveis susceptiveis de deterioração e fazendo-se dos objectos preciosos uma exacta descripção». Manda-o o artigo 8.° da lei de 16 de julho de 1855. É uma vergonha, um triste symptoma de decadencia, que ainda se não tenha feito. A lei deve cumprir-se sempre. Mas quando a lei roça pelos degraus do Thesouro, por amor do Rei, para a sua gloria e realce, a lei deve ser de uma rijeza de marmore, implacavel como o gladio symbolico que os estatuarios attribuem á deusa formosa e severa da Justiça.

Expus a traços rapidos, mas firmes e decisivos, a minha opinião sobre a lista civil. Disse ao país, e creio que a minha voz chegará ao Paço, a maneira porque eu entendo que se devia proceder. O que eu e os meus amigos politicos fariam fica assim definido. Desde que entrei na Camara dos Pares, jamais revi um discurso, e nem sequer attentei no que me é attribuido nos Summarios das sessões. Nem ao menos revi, quer nos Annaes quer nesse Summario, os discursos pronunciados por mim na sessão, tão dolorosa para o meu espirito, em que tive de defrontar-me com o meu antigo chefe. D'esta vez, já o declarei ao chefe da redacção esta casa, desejo rever o meu discurso. Quero publicá-lo por inteiro, na minha prosa chã e rude. Quero que as minhas opiniões fiquem exaradas, como monarchico que sou, para que, quando cheguem os dias funestos, inevitaveis, se não se mudar o curso das cousas e os homens publicos não desgrudarem os seus olhos cerrados pelas paixões, eu possa dizer que nem me associei nos erros, nem lhes assumi a responsabilidade, nem deixei de dizer ao país e ao Rei aquillo que me mandava a minha honra.

O que se prepara com esse projecto, não é proprio, não, do que estadistas de animo, perspicaz, de resolução austera, com amor desinteressado da monarchia, deviam querer para um Rei subido ao poder no começo da mocidade e que se devia aproximar, por um absoluto esquecimento do passado, do cerebro e do coração da sua patria. Repito-o mais uma vez. Devia ter-se dado uma amnistia, ampla e completa, a civis e militares por todos os crimes politicos até 31 de janeiro inclusive. Devia ter-se logo revogado todos os decretos ditatoriaes, excepto aquelles, pouquissimos que eram, de que urgia o exame parlamentar. (Apoiados). Deviam restaurar-se logo, por uma immediata apresentação ao Parlamento das respectivas propostas de lei nas bases concretas e democraticas apresentadas pela dissidencia, as liberdades fundamentaes do direito de associação, de reunião de imprensa. Devia, na questão dos adeantamentos, que é uma enfermidade a roer, a destecer, as fibras intimas da politica portuguesa, adoptar-se o systema de toda a luz, toda a publicidade, toda a justiça, que não é incompativel com a moderação e a equidade e com o estudo das circunstancias em que taes