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Sessão de 12 de Dezembro de 1919 19

diu ao Director dos Negócios Consulares seis sacas de açúcar, ao preço de $46, para repartir pelos seus colegas. Num grupo de amigos que, numa dissimulada casualidade, encontrou no café Chave de Ouro - coió de monárquicos e sidonistas - conseguiu vender quatro dessas sacas à razão de $90 por quilograma, recebendo 270$, e só depois foi para o Ministério repartir as duas sacas restantes ao preço de $46.

Sr. Presidente: nós vemos, com surpresa, nos 2.° e 3.° Juízo de Transgressões, absolver indivíduos que deviam ser castigados, como foi, por exemplo, a casa Henrique Gomes, negociante da Rua da Prata, que, tendo um fornecimento de 50 a 60 quilogramas de manteiga, diários, para o Hospital de S. José, apresentando factura de 59,5 quilogramas de açúcar, impingia ao Hospital apenas 30 quilogramas de manteiga, que era de manhã levada para o Banco, pretextando-se que era fabricada de noite.

Disto lavrou-se documento. Logo, porêm, apareceram pessoas a conversar sôbre o caso, comentando para quem queria ouvir. Todos nós que nascemos em Portugal, sabemos o que significam essas conversas... O processo começou logo a ser preparado por forma que o réu tivesse de receber a absolvição no Tribunal das Transgressões.

Como alêm de falsificação ainda havia alguma cousa que podia ser considerado envenenamento, pensou-se em remeter o processo para o Tribunal Criminal.

O funcionalismo a quem incumbia remeter o processo para o Tribunal crime, foi solicitado para que o não remetesse para ali, visto que o interessado e os seus protectores desejavam que fôsse para o Tribunal das Transgressões, onde melhor disporiam das precisas influências.

Mas como felizmente não é tudo perverso em Portugal, ainda há funcionários dignos e honrados.

É do número dêsses, aquele a que aludi e tanto assim que, cioso do cumprimento dos seus deveres, mandou o processo para o crime.

Isso, porêm, de nada serviu, visto que passados uns quinze dias, o processo transitava do Tribunal Criminal para o das Transgressões Fiscais, e o réu foi ali julgado e absolvido.

Ainda estranhei que tal sucedesse embora soubesse que, quando se deu a apreensão - e isto é um caso curioso - fora enviada a notícia para todos os jornais. Andou alguêm de automóvel durante a noite percorrendo todas as redacções, onde ia, evidentemente, conversar... mais nada.

Era uma visita inocente a todas as redacções. Bastante frio suportei para assistir a êste caso. Finalmente de manhã só foi dada a notícia pelos jornais o Mundo, a Batalha e o Combate.

Eu fui ao Tribunal das Transgressões e pedi ao Sr. juiz a fineza de me mostrar o processo daquele homem que fora absolvido. S. Exa. prontamente mo facultou e não só aquele como ainda outros que pedi.

Como sou leigo na geringonça jurídica não posso dizer, se um ou outro artigo das respectivas leis foi cumprido; mas sei que o julgamento se fizera em conformidade com as peças do processo e concluí que em virtude dessas peças é que se deu a absolvição dêste réu, como, de rosto, se dão as absolvições a todos os que caem sob a alçada daquele tribunal.

Êste facto não é conseqùência da prevaricação dos juizes. É que os processos vão já instruídos para êsse fim, mercê do triste sistema do suborno. Todos se vendem, em geral, nesta sociedade desmoralizada!

Todos, não! Ainda há, felizmente, quem não se venda. Mas contam-se!

Quando se preparam os processos corre, como diz o povo, muita massa e as peças organizam-se por forma tal que o juiz, lógicamente, não pode deixar de absolver. Dados os nossos costumes - vá lá - dada a bondade dos nossos costumes eu pregunto se o Sr. Jerónimo Martins, por exemplo, que tem uma transgressão a que pertence a multa de 50.000$, a pagará.

Chamo a atenção do Sr. Ministro da Justiça para êste facto que não sei se S. Exa. conhece. No 2.° Tribunal das Transgressões existem 19:000 processos acumulados. Foi o ilustre Deputado Sr. Pais Rovisco e o respectivo juiz que tiveram a amabilidade de me mostrar montanhas e montanhas de processos e o mais interessante é que 7:000 dêsses processos já estão prescritos porque há dois anos não têm tido andamento!