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Diário da Câmara dos Deputados
Em França e, de resto, em França muitos Deputados foram para a guerra e lá morreram heroicamente, deu-se um caso idêntico e o Parlamento resolveu que o Deputado não podia, ser afastado das suas funções.
Por consequência, eu vim ao Parlamento e pus nitidamente a questão: se o Ministro da Guerra tinha o direito de afastar um Deputado, embora fosse para a guerra na Europa ou em África. Era então maioria, com o ainda hoje, o Partido Democrático, e Presidente do Ministério, se bem me recordo, o Sr. Afonso Costa.
Uma voz: — Era o Sr. António José de Almeida.
O Orador: — A questão foi largamente debatida; e eu recordo-me bem de que um dos Deputados da maioria que mais calorosamente advogou o nenhum direito que o Ministro da Guerra tinha de afastar o Deputado foi o Sr. Álvaro Pope que hoje não faz parte da Câmara.
A questão foi largamente debatida com paixão, debatida também sob o ponto de vista dos princípios, porque se tratava duma imunidade parlamentar, e acabou o debate por votos. E o voto do Parlamento foi que o Ministro da Guerra não podia afastar um Deputado militar do exercício das suas funções.
Mandei então para a Mesa uma carta dizendo que, afirmado o meu direito de não cessarem os minhas funções parlamentares quando o Ministro da Guerra entendesse, eu tomava a responsabilidade de chegado o dia 2 de Abril e, portanto, cessando as funções legislativas ordinárias, que a sessão legislativa fôsse ou não prorrogada, eu estava pronto a prescindir das minhas imunidades parlamentares para ir para a França ou para a África, ou para onde quer que o Ministro da Guerra julgasse que eu devia prestar serviços. Esta carta foi lida na Câmara, e está com certeza nos seus arquivos ou nos arquivos do Ministério da Guerra, e tira a quem quer que seja o direito de dizer que eu me servi das minhas imunidades parlamentares para não ir para a guerra. Estou convencido de que só o desconhecimento dêste documento é que podia levar alguém a fazer uma afirmação indirecta à minha pessoa.
Passou-se isto em 1916, logo após a nossa declaração da beligerância, o eu repito, porque nunca tinha tratado, sequer ao de leve, a honra dos outros, não quero deixar aos outros o direito de tratarem da minha; e o caso de ir ou não para a guerra é uma questão de honra para mim.
Sr. Presidente: se eu me tivesse recusado a ir para a guerra, reputar-me-ia um covarde e eu não o sou, porque mantenho íntegras todas as afirmações que então fiz.
Um sábado, eu recebi uma ordem para embarcar na quinta-feira seguinte; e eu pregunto se não era ligítima a desobediência se eu tivesse desobedecido. Quatro dias me eram dados para fazer os meus preparativos e as minhas toilettes, e até para rever os meus conhecimentos de medicina, porque 15 anos atrás tinha deixado de exercer clínica e nunca pensei em fazer clínica tropical.
Mas depois da minha carta fiquei devidamente preparado para embarcar aguardando a nova ordem; e pregunto se é culpado um oficial por não querer ir para a guerra e porventura êle não é castigado.
Essa nova ordem de embarque não a recebi. Entretanto dava-se o movimento de 5 de Dezembro, e eu recebi novamente ordem para ir para a França.
Fui ao Quarquel General do Corpo Expedicionário Português receber a minha guia, e o ilustre oficial, que era então chefe do estado maior, convidou-me para ir com êle comer o último jantar antes da minha partida para a França; mas, tendo na mão a guia para marchar no dia imediato, à meia noite dêsse dia recebi ordem para não embarcar.
Eu pregunto: se isto ainda é culpa minha!
Sr. Presidente: não é êste o momento de discutir a política da nossa intervenção na guerra, que eu fiz como entendi, como me ditou o meu sentimento patriótico, como me ditou o meu desejo de bem servir a Nação. E talvez por contumácia, a que não sou muito atreito, quero dizer a V. Ex.ª que referendo tudo o que disse e que respondo por tudo o que subscrevi com o meu nome, não tendo que arrepender-me, porque ainda não reconheci ter laborado em êrro nas múltiplas afirmações que fiz.