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Sessão de 4 de Junho de 1924 19

Quero apenas, como é próprio de mim, assumir a responsabilidade da atitude que vou tomar, tendo dum lado o Sr. Ministro da Guerra ou o Govêrno e do outro o risco da vida dêsses rapazes.

Nestas condições, não hesito em dizer: o conflito não é com o Poder Executivo, o conflito é entre pessoas e a disciplina mantém-se da mesma maneira se o Sr. Ministro da Guerra fizer render êsses oficiais, prendendo-os.

Desde que sejam presos e respondam, a disciplina está salva; mas não se coloquem êsses homens ou na contingência de serem fusilados, ou de tomarem uma atitude que equivaleria a essa.

Perante a ameaça da onda de sangue não hesito: voto inteiramente o caminho que conduza à manutenção da disciplina, ao castigo dos que prevaricaram, mas nunca a manutenção de um Govêrno no poder por sim simples capricho.

Estou convencido do que o único caminho para evitar a efusão de sangue, é a saída do Govêrno, e essa saída não impede o castigo dos que prevaricaram.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. António Correia: — Sr. Presidente: o assunto está perfeitamente esclarecido, porque sôbre êle se têm pronunciado quási todos os lados da Câmara.

Mas, nesta Câmara, estabeleceu-se como que uma atmosfera de sangue.

É esta a hora de se definir atitudes e demarcar as nossos posições, e eu, Sr. Presidente, como homem de disciplina, ficaria mal com. a minha consciência, se neste momento não pedisse a palavra para dizer o que sinto.

O Govêrno tem exercido aquela acção que as leis e regulamentos mandam que sejam postos em vigor, mas não há ninguém que não saiba que se pretende emiscuir numa questão de disciplina a questão política que a propósito de tudo e de nada, é levantada neste Parlamento. Sr. Presidente: feita esta declaração terminante e sem ladear a questão, devo dizer que não havia o direito de misturar numa questão de indisciplina assuntos de ordem sentimental que, muitas vezos, longe de beneficiar aqueles a quem dizem respeito, os vai colocar mal.

É a hora de definir atitudes e marcar posições. Tenho sentimento e coração, porque sou pai.

Sr. Presidente: já fui oficial do exército; tive a honra de ser oficial do regimento n.° 11 de artilharia de campanha numa época de amargura para o meu coração e, com profunda mágoa, tive de castigar soldados que se tinham revoltado num momento em que eu distribuirá um cobertor para três.

Diziam êles que tinham frio, que não podiam dormir, verificando eu que realmente estavam numa situação miserável, um cobertor para três e a dormirem no chão do picadeiro do quartel em Castelo Branco.

Disse-lhes que, naquele momento, não era lícito que tivessem tais preocupações com o seu bem-estar material e castiguei-os.

De outra vez verifiquei que alguns soldados se negavam a levantar o rancho que, aliás era mal confeccionado por virtude de várias circunstâncias, entre elas a de não haver dinheiro para o fazer convenientemente, e, Sr. Presidente, tive de castigar êsses soldados que se negavam a levantar o rancho, muitas vezes comida que não se podia dar a animais quanto mais a pessoas que andavam num esfôrço heróico a preparar a sua instrução para marcharem para os campos de batalha.

E, no emtanto, castiguei-os.

Porque é que a Câmara dos Deputados, numa questão de disciplina, não se conforma com as declarações do Sr. Presidente do Ministério?

Porventura o coração do Sr. Presidente do Ministério ou do Sr. Ministro da Guerra, que têm usado duma diplomacia, e dum cuidado extraordinários, é diferente do coração daqueles que lamentam que, em poucas horas, se poderá desenrolar em Portugal uma scena de sangue?

Não, Sr. Presidente!

Não pedi a palavra para mandar para a Mesa qualquer moção; não pedi a palavra nem como pertencendo ao Grupo Parlamentar de Acção Republicana, nem em nome individual para dar ao Govêrno neste momento uma moção concreta e clara que permita que êle continue no caminho que trilha; pedi a palavra porque se impunha à minha consciência dizer aquilo que penso e sinto.