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16 Diário da Câmara dos Deputados

Não há documentos que os levassem à certeza do que houve o flagrante delito.

O Sr. Ministro da Justiça, dissertando sôbre o que era flagrante delito, falou em indícios.

A verdade, porém, é que estas duas expressões se contradizem.

Se se trata de indícios para a formação do acto a que se chama flagrante delito, ou se trata realmente de flagrante delito.

Vamos, pois que vale a pena, precisar bom esta idea.

Se a prisão do Sr. Cunha Leal foi feita em flagrante delito, nos termos do artigo 17.° da Constituição, não havia que pedir licença à Câmara para manter essa prisão.

Apoiados.

Vê-se, todavia, que o próprio comandante da divisão, embora pessoalmente inclinado a acreditar que essa prisão foi feita em flagrante delito, não tem a certeza da sua convicção; e, tanto assim, que pede ao Parlamento que se pronuncio sôbre o caso.

Ora a idea do flagrante delito envolve sempre a certeza; e é essa certeza que pároco não existir.

De resto, para que estamos nós a espraiarmo-nos em complicadas definições, se a definição de flagrante delito consta já da nossa legislação?

Em matéria penal, a definição de flagrante delito vem no artigo 1020.° da Novíssima Reforma Judiciária.

Segundo êsse artigo, o caso de flagrante delito comporta, pela nossa legislação, três hipóteses.

A primeira, aquela em que se está cometendo o delito ou crime.

A segunda, aquela em que acaba de se cometer êsse delito ou êsse crime, sem intervalo algum.

E a terceira, aquela em que o delinquente, acabando de praticar o delito ou crime foge do lugar em que o praticou e é logo, contínua e sucessivamente, perseguido pela autoridade ou homem do povo.

Ora o Sr. Cunha Leal, quer pelo que consta dos autos policiais, quer pelo que os jornais referem, parece que foi proso em sua casa.

Sendo assim, qual é a hipótese aplicável para provar o flagrante delito?

A primeira hipótese parece não ter aplicação, visto que S. Exa. não foi preso no acto de cometer o delito.

Se a rebelião estalou às 5 horas, seria preciso, para se verificar a segunda hipótese, que o delinquente tivesse estado no local da rebelião, sem intervalo algum.

A terceira hipótese não é, igualmente, aplicável, porque para isso teria sido necessário que S. Exa., tendo estado na Rotunda, do lá tivesse fugido, perseguido pela autoridade ou por homens do povo, o que até agora se não demonstrou, nem sequer se indicou.

Ora, se as três hipóteses da nossa legislação não podem ser aplicáveis à prisão do Sr. Cunha Leal, Apodemos nós, por similitude, estabelecer qualquer nova hipótese, à sombra da legislação estrangeira?

Vamos ver.

A legislação francesa, por exemplo, estabelece mais uma hipótese do que a nossa: - a hipótese em que ao delinquente sejam apreendidos documentos, armas ou quaisquer outros elementos que possam levar à, convicção de que êle, na realidade, é criminoso ou cúmplice.

Como se vê a legislação francesa, neste ponto, é mais ampla.

A nossa legislação é, portanto, mais restrita o sondo mais restrita não pode ter interpretações vagas.

Há um princípio de direito que diz que uma disposição de excepção só pode ter uma interpretação restrita, absolutamente restrita ao termo da lei.

Sr. Presidente: nós não podemos, nem devemos encarar êste problema exclusivamente pelo seu lado político, partidário.

Se o fizéssemos, iríamos dar aos contrários uma grande satisfação.

Mas eu desejaria que essa satisfação se não transformasse numa realidade, sendo antes uma satisfação momentânea, passageira, efémera, porque o Govêrno, tendo saído do movimento revolucionário nas condições de prestígio em que saiu, tendo tido a felicidade de dominar um movimento da gravidade daquele que rebentou, em condições de legalidade a mais estreita, restrita e perfeita, tendo saído vitorioso de um movimento dessa natureza e nas condições extremamente dignas de louvor em que saiu, não devia deixar na sua acção qualquer vestígio