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28 DE ABRIL DE 1971 729

O projecto consigna a tese de que o ensino da Religião e Moral nas escolas públicas só seja ministrado aos menores de 16 anos cujos pais, ou quem suas vezes fizer, expressamente o desejarem.
O artigo XXI da Concordata afirma, por seu turno, que será ministrado o ensino da Religião e Moral Católicas nas escolas públicas elementares, complementares e médias "os alunos cujos pais, ou quem suas vezes fizer, não tiverem feito pedido de isenção 166.
A desarmonia existente entre os dois textos (apesar de limbos eles terem de comum o carácter facultativo da frequência da disciplina) parece incontestável, sobretudo para quem tiver presente que as escolas públicas elementares, complementares ou médias são, de facto, as escolas públicas em cujo programa se inserem aulas de Religião e Moral.
Para que o menor de 16 anos tenha de frequentar (ou possa mesmo frequentar?) aulas desta disciplina, o projecto exige declaração expressa dos pais nesse sentido. Pelo texto da Concordata, só estarão isentos da disciplina, seja qual for a sua idade, os alunos cujos pais tenham feito pedido expresso de isenção.
O Governo invoca, em abono da nova doutrina, duas razões que merecem ser ponderadas.
Há professores de Religião e Moral que, no seu ensino, e afastam ostensivamente se não da pureza da fé ou da autenticidade da doutrina cristã, pelo menos dos termos em que a maior parte dos pais católicos sentem, interpretam e aplicam as suas convicções religiosas.
"Quando em 1940 foi assinada a Concordata - explicou o Sr. Presidente do Conselho, na comunicação de 16 de Novembro de 1970 -, o artigo 21.° estabeleceu que o ensino nas escolas públicas será orientado pelos princípios da doutrina e moral cristãs tradicionais do País. Nenhuma dúvida havia quanto à matéria dessa doutrina, nem quanto aos preceitos dessa moral.
Acontece, porém, que nos últimos anos chegaram com frequência ao Governo reclamações quanto ao modo como, sobretudo em certas dioceses, é orientado o ensino da Religião e da Moral por professores designados pelas autoridades eclesiásticas."
Como não quer arvorar-se em zelador da pureza da fé e dos costumes, quanto ao ensino entregue à Igreja, e deseja compreensivelmente evitar quaisquer atritos na matéria com as autoridades eclesiásticas, o Governo apelou neste ponto para as famílias, por fundadamente as considerar como os juízes naturais da educação cristã dos filhos.
Que a alegação do Governo corresponde a uma realidade, ninguém o poderá duvidar. A Igreja atravessa no presente momento um período de profunda revisão interna, que não pode deixar de se reflectir, com alguns inconvenientes para os jovens, no ensino de uma disciplina como a Religião e a Moral.
Visto serem as famílias quem mais directamente sofre na sua carne os efeitos da instabilidade criada por semelhante conjuntura no espírito dos jovens, compreende-se que elas reajam contra a acção perniciosa de alguns educadores, e só será de louvar tudo quanto o Estado legitimamente possa fazer no sentido de facilitar a salutar reacção dos interessados 167.
Resta saber, porém, se neste caso concreto o faria nos melhores termos.
A Câmara supõe que não.
Limitando o ensino da Religião e Moral nas escolas públicas aos menores de 16 anos cujos pais façam declaração expressa nesse sentido, a nova lei começaria por contrariar, como se viu, a doutrina estabelecida na Concordata.
Além disso, teria ainda o defeito ponderoso de fazer recair sobre a educação dos filhos os efeitos do desleixo, da negligência, da ausência, da ignorância ou de outras causas análogas da falta de declaração dos pais ou encarregados de educação (Dr. António Leite, ob. cit., p. 17), criando na formação daqueles uma lacuna muitas vezes insuprível.
Em relação à necessidade de pedido expresso de isenção, objecta o Governo, porém, com os melindres que pode revestir um requerimento especial nesse sentido, por entender que merece ser respeitada semelhante inibição. Para tal se facultaria os pais o pedido de isenção no próprio acto de inscrição dos alunos.
Há aqui, no entanto, dois aspectos da questão que não podem nem devem ser confundidos.
Uma coisa é saber se, para frequentar as aulas de Religião e Moral, o aluno necessita de declaração expressa dos pais; outra coisa, muito diferente, é saber se, não sendo essencial a declaração positiva dos pais, mas sendo, sem dúvida, facultativo o ensino ida disciplina, o pedido de isenção dela pode ser formulado no acto de inscrição dos alunos.
A Câmara Corporativa, que não hesita em responder negativamente à primeira questão, pelas razões acima expostas, nenhum reparo sério tem, a opor quanto à segunda, que julga não brigar com a solução geral fixada no primeiro parágrafo do artigo XXI da Concordata.

Em face das considerações precedentes, as várias bases destinadas a substituir o texto da base n do projecto poderiam ter a seguinte redacção:

BASE II

É lícito às pessoas, em matéria de crenças e de culto religioso:

a) Ter ou não ter religião, mudar de confissão ou abandonar a que se tinha, agir ou não em conformidade com as prescrições da confissão a que se pertença;
b) Exprimir livremente as suas convicções pessoais;
c) Difundir pela palavra, por escrito ou outros meios de comunicação a doutrina da religião que se professa;
d) Praticar os actos de culto, particular ou público, próprios dos fiéis de qualquer confissão religiosa.

166 Regime semelhante estabeleceu em Espanha o artigo 7. °, n.º 3, da Lei de 28 de Junho de 1967. e, em Itália, o artigo 6.º da Lei de 24 de Junho de 1929, e igual faculdade é reconhecida ainda aos pais, relativamente ao ensino da Religião ministrado aos filhos, nas escolas públicas tanto da Alemanha como da Áustria.
167 A circunstância de ordem geral apontada no texto acresce o facto especial, reconhecido expressamente pelas autoridades eclesiásticas, de que o ensino da Religião e Moral careceu sempre de uma orientação básica que, assegurando a sua eficiência, fosse capaz de evitar os abusos e desvios que, na prática, se têm registado, embora não faltem, razões que até certo ponto podem explicar algumas das deficiências até agora registadas na orientação da disciplina.