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732 ACTAS DA CÂMARA CORPORATIVA N.º 70

a pena perder tempo, quer a caracterizar cada um deles, quer a fixar a linha divisória entre a Religião, de um lado, e o metapsiquismo em geral, do outro.

Na sequência das considerações expostas, a Câmara sugere, quanto às matérias reguladas na base III do projecto, a seguinte disposição:

BASE X

1. A ninguém será lícito invocar o direito à liberdade religiosa para a prática de actos que sejam incompatíveis com a vida, a integridade física ou a dignidade das pessoas, os bons costumes, os princípios fundamentais da ordem constitucional ou os interesses da soberania portuguesa.
2. Não são consideradas religiosas as actividades relacionadas com os fenómenos melapsíquicos ou parapsiquicos.

BASE IV

50. Regime de separação. - Depois das largas considerações já tecidas em torno da questão da separação, bastará uma breve reflexão sobre os dois preceitos contidos na base IV do projecto, que a Câmara sugere sejam deslocados para a parte final dia disciplina das organizações religiosas em geral, de acordo com o programa sistemático a que obedece o novo articulado proposto.
A afirmação dogmática de que as relações do Estado com as organizações correspondentes às diversas confissões religiosas assentam no regime de separação está certa, não levanta dúvidas neste momento em qualquer dos seus aspectos e tem perfeito cabimento do diploma.
O apêndice introdutório dessa tese, traduzido na proclamação nua e crua de que o Estado não tem religião própria, é que já se afigura desnecessário, uma vez assente que as relações do Estado com as várias confissões religiosas, sem exceptuar a católica, se regem pelo princípio da separação.
Além de supérflua, a disposição pode considerar-se mesmo inconveniente, quer pelo seu pronunciado sabor laicista, que traz imediatamente ao espírito, por natural associação de ideias, embora guardadas as devidas distâncias, a forma um tanto agressiva como o artigo 4.° da Lei da Separação afirmava, que "a República não reconhece, não sustenta, nem subsidia culto algum"174, quer pela manifesta desarmonia existente entre a afirmação descarnada da arreligiosidade do Estado, por um lado, e o seu compromisso doutrinário em matéria de educação, a proclamação da religião católica como religião da Nação Portuguesa ou o reconhecimento da sua posição especial no seio da comunidade nacional, do outro.
É caso de voltar a insistir ma observação de que a liberdade religiosa não tem um puro sentido negativo, expresso na eliminação de qualquer coacção sobre o pensamento ou a acção dos homens em matéria de religião. Ela reveste ainda um sentido marcadamente positivo, inspirado no valor social do fenómeno religioso, que obriga o Estado, embora de modo indirecto, a criar condições propícias ao seu livre exercício 175.
Também a Câmara pensa que não deve manter-se no diploma o princípio da igualdade de tratamento jurídico das diferentes confissões.
Trata-se de um princípio que não é necessário à regra fundamental da liberdade religiosa.
O que a ideia salutar da liberdade religiosa reclama do Estado é que a todos os indivíduos e confissões seja assegurada, dentro dos limites objectivos (razoáveis, a livre expressão do pensamento, bem como o livre exercício da sua actividade em matéria de religião, e que nenhuma discriminação se faça, contrária à regra da igualdade dos cidadãos perante a lei, com fundamento no seu credo religioso.
O facto de, uma vez assegurado esse desiderato, o Estado dar expressão jurídica real à diversíssima repercussão que as várias religiões tenham na vida moral e social da comunidade, em nada colide já com a ideia da liberdade religiosa.
A fórmula para este efeito adoptada mo n.° 2 da base IV do projecto, apelando para "as diferenças impostas pela sua diversa representatividade", não se afigura à Câmara inteiramente satisfatória.
Se pretende abranger a religião católica, haveremos de convir em que é demasiado inexpressiva esta diversa representatividade com que o projecto pretende retratar a sua influência secular na história da Nação, na missão superior da comunidade, na formação moral do povo português.
Se deixa de fora a religião católica, dificilmente se vislumbra o fundamento prático da afirmação.
De qualquer dos modos, trata-se de proposição que, no entender da maioria da Câmara, deve ser eliminada, podendo a base relativa à matéria versada limitar-se a dizer o seguinte:

BASE XXX

As relações do Estado com as organizações correspondentes às diversas confissões religiosas assentam no regime de separação.

Base V

51. O disposto na base V do projecto está prejudicado pela redacção da base que a Câmara sugere para regular a articulação do poder paternal com a educação religiosa dos filhos (cf. base VIII do texto proposto).

Base VI

52. Assistência a actos de culto religioso. - Na base VI declara-se facultativa a assistência a actos de culto religioso, sem excepção dos celebrados em unidades militares ou em estabelecimentos públicos 176.
Princípio correspondente, mas ainda assim bastante diferente em vários aspectos, consagra a lei espanhola de 1967, quando no artigo 5.°, n.° 2, se declara que "nas forças armadas não se imporá a assistência aos actos de culto, salvo nos actos de serviço, aos que fizerem saber a sua qualidade de não católicos ao ingressar naquelas" e que "regime análogo será observado nos estabelecimentos penitenciários".
Conclui-se deste preceito que a assistência aos actos de culto é obrigatória para os católicos, quer nas cerimónias de preceito das forças armadas, quer nas de estabelecimentos penitenciários.

174 Tradução literal, aliás, do artigo 2.° da lei francesa de separação, de 11 de Dezembro de 1905: "La République ne reconnait, ne salarie ni ne subventionne aucun culte..."
175 No mesmo sentido o n.° 3 da Declaração do episcopado da metrópole sobre o problema da liberdade religiosa, datada da 13 de Novembro de 1970.
176 Ver, porém, o disposto no artigo XXI, II, da Concordata.