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862 ACTAS DA CÂMARA CORPORATIVA N.º 73

A violência de linguagem mantinha-se. E com ela "uma longa e nunca interrompida série de absolvições, em todos os casos, por mais escandalosos e criminosos que fossem", como se lê no parecer da Comissão de Legislação Criminal, presidida por Joaquim António de Aguiar, sobre o projecto apresentado à Câmara, em 1840, pelo conde de Taipa.
O projecto aprovado por Canta de Lei de 19 de Outubro de 1840 deu nova organização ao júri, mas, na ordem prática, tudo continuou na mesma: a impunidade manteve-se.
Por isso, o Governo, em 1845, propôs às Cortes que fosse alterada a competência do tribunal para o julgamento.
A respectiva proposta, ainda que tivesse merecido o acordo da Comissão, mão chegou a ser aprovada pelo Parlamento.
Assim se chegou a 1850, em que na sessão de 1 de Fevereiro foi apresentada a proposta que, uma vez aprovada, havia de converter-se na Lei de 3 de Agosto de 1850.
Esta lei modificou profundamente o regime jurídico-penal da imprensa e os crimes de abuso da sua liberdade, longa e minuciosamente enumerados nos §§ 1.° a 14.° do artigo 3.° As penas - prisão de seis meses a três anos e multa de cem mil réis a um canto de réis - são mais severas do que nas leis anteriores.
Não admira, pois, que a apresentação da proposta que havia de converter-se naquela lei suscitasse protestos, contando-se, entre estes, o redigido por Almeida Garrett e assinado pelos mais notáveis escritores e jornalistas da época, entre outros, por Alexandre Herculano, Lopes de Mendonça, A. Fontes Pereira de Melo, Latino Coelho, José Estêvão, Rebelo da Silva, Rodrigues Sampaio, Bulhão Pato, Barbosa du Bocage, João de Andrade Corvo e José Maria de Casal Ribeiro. O referido protesto concluía deste modo:

Os abaixo assinados limitam-se a um protesto simples, mas, quanto neles cabe, enérgico e solene, contra todas as disposições do dito projecto-lei, em que são postergados os direitos e garantias inalienáveis da liberdade de pensamento, ficando assim seguros de que, se essa liberdade tem de perecer, ao menos os seus nomes não passarão desonrados à posteridade com a mancha de cobardia ou de conivência em semelhante atentado. (Cf. Obras de Almeida Garrett, 1966 - Lello & Irmão, Porto, vol. I, p. 1244.)

O período de vigência da Lei de 3 de Agosto de 1850, mais conhecida pela "lei das rolhas", foi curto. Revogada pelo Decreto ditatorial de 22 de Maio de 1851, manteve-se em vigor, com pequenas alterações, a legislação anterior a 1850.
Publicado o Código Penal de 1852, a Lei de 17 de Maio de 1866 consagrou, e pela primeira vez, o sistema de repressão dos crimes de imprensa pelo direito penal comum, ao dispor:

Aos crimes de abuso na manifestação do pensamento são aplicáveis as penas respectivas estabelecidas no Código Penal. (Artigo 5.°)

Uma única excepção:

No caso de agressão injuriosa ao sistema representativo fundado na Carta Constitucional da monarquia e acto adicional da mesma carta, será aplicável a pena de três meses a um ano de prisão e multa correspondente. (Artigo 5.°, § 1.°)

O processo seria o que competisse nos termos da legislação comum (artigo 6.°).
O regime de direito comum quanto à repressão dos crimes de imprensa durou até à publicação do Decreto n.° 1, de 29 de Março de 1890.
Com o fundamento de que se tinham agravado os abusos de manifestação do pensamento pela imprensa, atacando-se os poderes constituídos, injuriando-se, ameaçando-se e difamando-se o Chefe do Estado e a sua família, substituindo-se o conselho avisado pelo apodo afrontoso e a discussão serena pela invectiva atrabiliária, o Decreto de 1890 estabeleceu um direito penal repressivo especial para a imprensa, que, de um modo geral, era mais rigoroso do que o de direito comum, designadamente nos casos de reincidência e de acumulação de crimes (artigo 8.° e seus parágrafos).
Por outro lado, além da suspensão da venda do periódico, o referido decreto previa que, verificadas determinadas circunstâncias, aquela suspensão fosse substituída na sentença condenatória pela supressão definitiva do mesmo (artigo 7.° e § 3.°)
Pela Lei de 7 de Julho de 1898 regressou-se novamente ao sistema repressivo de direito comum, que voltou a regular as sanções criminais por delitos de abuso da Uberdade de imprensa.
As razões constam do relatório do respectivo projecto e são as seguintes:

Não me propus fazer no projecto que tenho a honra de apresentar uma nova e especial classificação dos delitos de imprensa. Bem sei que há quem sustente que deixar a imprensa em tudo sujeita ao direito comum é submetê-la umas vezes a repressão excessiva, outras conceder-lhe inteira impunidade, e, por isso, quem, consequentemente, pugne pela necessidade de uma lei especial. Não me parece que a questão, como tantas outras de jurisprudência, se possa e deva resolver em tese, mas só em presença da legislação positiva do país em que se trata de regular o livre exercício da imprensa.
Naquelas nações em que o Código Penal é, por antigo, anterior à enorme expansão que a imprensa tem adquirido, ou naquelas em que a legislação criminal, por demasiado genérica, não pode facilmente aplicar-se às especiais condições dos abusos na manifestação do pensamento, é justo e indispensável elaborar lei particular que acompanhe este singular delito desde a sua génese, a publicação, até ao seu último termo, o castigo.

A Lei de 11 de Abril de 1907, mantendo o regime penal de direito comum como regra, abriu uma excepção a favor dos réus por crimes de imprensa que não tivessem sofrido condenação alguma por crimes desta natureza, tornando obrigatória a substituição da pena de prisão por multa que, pelo Decreto n.° 1, de 15 de Dezembro de 1892, era meramente facultativa e só admissível quando houvesse circunstâncias atenuantes numerosas e importantes (artigo 22.°).
A tendência no sentido de criar para a imprensa um regime penal repressivo mais benévolo acentua-se no projecto de Trindade Coelho (1907), em que se estabelece a substituição obrigatória da pena de prisão, que seja aplicável pelo Código Penal, pela pena de multa, salvo quanto aos crimes punidos pelos artigos 159.°, 160.°, 169.°, 170.° e 171.° daquele Código, e na proposta de lei de Francisco José de Medeiros, de 11 de Agosto de 1909, em que as sanções a aplicar são as do Código Penal, não podendo, porém, quando pela primeira vez se impusesse a pena de prisão, exceder-se uma terça parte da penalidade aplicável (artigo 17.°).