17 DE JUNHO DE 1971 873
Todavia, os factos ilícitos que aquelas alíneas contemplam estão directamente relacionados com a actividade da
Imprensa: o director do jornal que não inserir a nota oficiosa ou não publicar a resposta a que era obrigado viola uma norma legal, sendo por isso passível de sanção penal.
São estas sanções, bem como as relativas aos factos, que integram as infracções a que se referem as alíneas a), b) e c) da base XXXI da proposta que devem constar da lei, e para isso não há necessidade de consignar que "são também considerados crimes de imprensa".
Pelo exposto, as sanções nela previstas devam figurar na base que no texto proposto contemplar não só as penas aplicáveis aos crimes de imprensa, mas ainda, nos crimes relacionados com a sua actividade e previstos nesta lei.
147. Quanto à base XXXII, suspensão temporária dos periódicos ou o cancelamento da respectiva inscrição, a sua matéria é delicada e merece por isso alguma reflexão.
Em primeiro lugar, há que distinguir entre a suspensão temporária dos periódicos e a suspensão definitiva, como consequência do cancelamento da respectiva inscrição (base XXXII).
A primeira, para que seja eficaz, tem de ser rápida ou imediata. A guerra ou a paz podem depender de uma campanha da empresa. Se o jornalista sabe manejar a pena, encontrará sempre um público disposto não só a lê-lo, mas a segui-lo. Napoleão, segundo Metternich, dizia que os jornais significavam para ele tanto como um exército de 300 000 homens. Por isso de Santa Helena escrevia:
"Abandonar a imprensa a si mesma significa, certamente, dormir junto de um perigo" (cf. J. A. Castro Farinas, De La Liberdad de Prensa, p. 101).
Assim, dado o perigo que representa, por exemplo, a propaganda de guerra, a prática de actos de terrorismo ou o incitamento ao uso de processos violentos para a, subversão da ordem política e social, a autoridade para o conjurar ou afastar mão pode estar à espera que, denunciado o facto ao tribunal competente, este, dada a gravidade do crime, venha a determinar a suspensão do periódico decorrido um ou dois anos após a sua prática. Não. O exercício da liberdade de imprensa não é ilimitado, pois tem como fronteiras naturais o respeito pelos direitos e liberdades de outrem, a honra dos cidadãos, o interesse da comunidade, a ordem jurídica e moral.
Se estas fronteiras são violadas e por forma a causar grave dano à sociedade e ao Estado, este não pode deixar de se defender, com vista a evitar o perigo ou a reduzir os efeitos do dano.
Ora, um dos meios de que pode lançar mão para lograr esse objectivo consiste precisamente em pôr termo à actividade criminosa através da suspensão do periódico em que a mesma se desenvolve.
Pelo Decreto n.° 2270, de 12 de Março de 1916, as autoridades policiais e administrativas podiam, verificadas determinadas circunstâncias, ordenar mão só a apreensão dos periódicos, mas ainda a suspensão da sua publicação pelo prazo de três a trinta dias (artigo 2.°).
É que a via administrativa, teoricamente discutível pelos abusos a que se presta, é, na ordem prática, a única eficaz.
Por isso, em períodos de crise, os Governos de muitos Países, com lei que a preveja ou sem ela, a têm utilizado.
Medida excepcional, só deve ser determinada em razão da gravidade ou frequência dos crimes cometidos através do respectivo periódico. Mais do que a aplicação de uma sanção é, as mais das vezes, um. aviso de carácter preventivo susceptível de evitar um mal maior.
Ainda que o alarido das paixões, tanto mais alto quanto mais injustas, nem sempre deixe ouvir a voz serena da razão, bastará suspender o jornal por poucos dias para este sobrestar na sua campanha ou diminuir a sua intensidade, mormente quando for convencido de que as consequências, quanto à perturbação da paz pública, excederam de longe o que teria previsto.
Nos crimes por abuso de liberdade de imprensa, quando houvesse acumulação de três ou mais dos ditos crimes, ou quando em período não superior a dezoito meses se tivessem verificado duas condenações, a suspensão temporária da venda pública ou o agravamento da multa prevista no § 2.° do artigo 8.° podiam ser substituídos na sentença condenatória pela suspensão definitiva do periódico (Decreto de 29 de Março de 1890, artigo 8.°, § 3.°).
Também o Decreto n.° 12 008, de 29 de Julho de 1926, lei de imprensa em vigor, preceitua:
O periódico que foi condenado três vezes pelo crime de difamação será suprimido, e o director do periódico que pela terceira vez for condenado pelo mesmo crime será incapacitado, pelo tempo de cinco anos, para dirigir qualquer periódico (§ 2.° do artigo 17.°).
Deste modo, a supressão do periódico prevista no Decreto n.° 12 008, deve ser substituído pelo cancelamento da respectiva inscrição, consignado na base XXXII da proposta, mas só quando a gravidade ou frequência dos crimes cometidos a justifiquem.
148. O problema suscitado na base XXXIII da proposta, quanto h possibilidade de interditar, temporária ou definitivamente do exercício da profissão, os directores e redactores dos periódicos e os editores, não é menos delicado.
Na verdade, contando-se o direito ao trabalho e a liberdade de escolha da profissão ou género de trabalho, entre os direitos, liberdades e garantias individuais dos cidadãos portugueses, embora aquele deva ser exercido nos termos que a lei prescrever (Constituição, artigo 8.°, n.ºs 2.° e 7.°), qualquer restrição só pode ser imposta quando devidamente justificada.
É o que acontece com os funcionários públicos, em que a pena de demissão ou perda de emprego pode ser com declaração de incapacidade para tornar a servir qualquer emprego, ou sem essa declaração.
Todavia, pronunciar-se-á sempre a demissão do empregado público quando este for condenado a qualquer pena maior (Código Penal, artigo 76.°, n.° 11) ou, quando fora do exercício das suas funções, for encobridor de coisa furtada ou roubada, ou cometer o crime doloso de falsidade, ou o de furto, de roubo, de burla, de quebra fraudulenta, de abuso de confiança, de fogo posto, e que a pena decretada, na lei seja a prisão, nos casos em que o Ministério Público acusa independentemente de denúncia ou acusação particular (Código Penal, artigo 65.°, § único).
Ora, as qualidades e requisitos que se exigem dos directores e redactores de jornais e dos editores não devem, de um modo geral, ser inferiores aos que se exigem do comum dos funcionários. Através do exercício da sua profissão, dado o carácter público da imprensa, os jornalistas estão Intimamente ligados à comunidiade de que fazem parte. O seu papel na formação da opinião pública - eco das aspirações, sucessos e desilusões da comunidade - exige deles ideias claras sobre os problemas nacionais ou, pelo menos, sensibilidade para poder distinguir o que neles é 'essencial e permanente do que é puramente acessório.