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15 DE JULHO DE 1971 915

o interesse de todos em que as actividades encontrassem os necessários servidores. Ora, a imensa maioria da população tinha de exercer actividades que não exigiam estudos, e que, aliás, ais pessoas não aceitariam exercer se tivessem estudado. Daí o carácter necessariamente aristocrático do ensino: desde que o acesso aos estudos maiores se não podia basear do mérito, tinha de se fundar no privilégio. Na sociedade extemporânea o número de postos de trabalho qualificado aumentou até ao ponto de hoje ser possível atribuir a cada homem tarefa proporcionada à sua aptidão.

Mais adiante disse o conferencista, autor do projecto em análise:

E é também aí que se encontra, a meu ver, a explicação da eclosão do ideal de democratização do ensino. De facto, a possibilidade de ocupar na sociedade um lugar correspondente. ao mérito depende apenas de uma condição: a de que a pessoa com aptidão natural receba a preparação escolar exigida pela função. Não é, pois, fantasia dos ideólogos que a aspiração democrática assume hoje a forma particular de uma exigência dirigida aos estados no sentido de formar os sistemas escolares de modo tal que cada um possa ir tão longe quanto o seu valor lho consentir 17.

Na linha de pensamento do conferencista as aspirações do ensino para todos justificam-se plenamente por se considerar que destarte aumentam as oportunidades de emprego qualificado para a grande maioria. Compreende-se bem que se tenha visto um importante passo no sentido da democratização do ensino precisamente na generalização da educação profissional, e até que se entenda que aquele ideal se não contenta com possibilidades abstractas de cultivar o espírito, antes exige caminhos concretos de integração na vida.
Considera-se, porém, que existe forte correlação entre as actividades produtivas de uma sociedade e o nível cultural a que aspira o seu escol. 0 aumento do nível de complexidade das tecnologias e das acções produtivas de um grupo social é sempre acompanhado por uma subida do nível cultural do mesmo grupo. Tudo se passou como se existissem relações recíprocas de causa e efeito entre o fomento tecnológico e o fomento cultural. O progresso do nível cultural em qualquer classe social só é possível quando se verifica um aumento de complexidade das formas de vivência, traduzido num aumento qualitativo e quantitativo das acções produtivas do conjunto da sociedade.
Há, sem dúvida, estreita ligação entre as duas ordens de actividade: a intelectual e a tecnológica. Assim ó necessário não incorrer no erro de uma planificação educativa com alheamento das possibilidades oferecidas pelo mercado do emprego, pois ele pode alterar, para bem ou para mal, a procura dos bens culturais. De outro modo facilmente se incorre no risco de ministrar cultura desaproveitada pelas actividades produtivas do conjunto da população.
Ministrá-la em excesso é criar um subemprego e o sentimento de frustração das pessoas condenadas a exercer tarefas que ficam, abaixo daquelas para que foram preparadas. Ministrá-la por defeito corresponde a fazer ocupar os lugares por pessoas que não têm o nível de cultura pressuposto pelo respectivo exercício.
A democratização do ensino olhada à luz dos considerandos do projecto é a obtenção não apenas de igualdade de oportunidades ou igualdade de pontos de partida para o acesso aos vários escalões culturais, mas também conseguir o escalonamento dos pontos de chegada, por tal modo que para todos exista real possibilidade de inserção na vida ao nível correspondente ao mérito possuído.
De facto, se o objectivo último a alcançar é o da máxima valorização e aproveitamento das capacidades humanas, individuais, não será suficiente que se eliminem os desníveis que no plano económico se possam levantar a uma abstracta possibilidade de todos atingirem as últimas metas das carreiras escolares.
Tal desiderato não é possível a todos, pois nem todos têm capacidade para tanto. O que é preciso é planear as carreiras de modo a garantir o maior número possível de êxitos e um mínimo de abandonos, organizando etapas terminais sucessivas, capazes de proporcionarem a uns o prosseguimento, a outros uma esperançosa entrada na vida activa.
Compreende-se assim que a instituição de estudos terminais de diferentes graus de ensino constitui importante factor de democratização da cultura e da sociedade na acepção mais construtiva que este conceito pode assumir.
Reconhece-se que a falta ou insuficiência de patamares ao nível médio é idos mais graves defeitos que presentemente obstam ao funcionamento do sistema, visto que é ao chamado nível médio que se situa grande número de oportunidades de emprego qualificado nas sociedades de produção tecnológica.
Parece, no entanto, que o ensino tecnológico não se poderá limitar a escolas de nível médio. Adiante se dirá porquê.

22. A este conceito vago die democratização do ensino junta-se um outro, apresentado por um antigo Ministro da Educação francês.
Oliver Guichard 18 começa por se insurgir contra a tendência de se considerar o ensino como um sistema válido por si próprio.
Ideias idênticas às do Ministro Guichard foram, há anos já, apresentadas entre nós. À escola se deve não apenas a nação dos quadros técnicos e administrativos, mas principalmente a ascensão die todos a diversos níveis culturais da saciedade.
Até ao princípio deste século a escola aspirava a assegurar um nível primário a todos e a ajudar alguns (com certos méritos) a subirem acima do nível cultural de sua família. A escola era, assim, um dos poucos factores capazes de movimentar, aqui e ali, os estratos sociais.
Ora, e além de outros factos, o aumento das tarefas técnicas, motivado pelas necessidades da produção em série, levou às possibilidades da promoção colectiva ao nível dos ensinos secundários.
A democratização pelo ensino corresponde ao alargamento da promoção colectiva. Até há pouco o ensino secundário clássico só se preocupava com promoções individuais.
A educação correspondia, de facto, ao sentido etimológico: conduzir alguém pela mão. Hoje identifica-se com a transmissão a muitos ou a todos, de saberes, de métodos e de valores que cimentam a unidade nacional e dinamizam a sociedade e tal transmissão já não pode ser feita apenas na escola, a qual, mergulhada numa sociedade de

17 José Hermano Saraiva, Conferência de 19 de Junho de 1970, edição ciclostilada.
18 "L'Enseignement, pivot de la société mobile", in Preuves, 4.º trimestre, 1970.