1040 ACTAS DA CÂMARA CORPORATIVA N.º 81
dade de considerar, em princípio, inadequado às condições da economia moderna, o sistema da condenação a priori de toda e qualquer forma de concentração económica, destinado a impedir preventivamente as coligações e monopólios prejudiciais à concorrência (sistema do dano potencial ou sistema preventivo).
Como então se frisou, o aumento da dimensão das empresas, mediante a concentração ou por outros processos semelhantes, representa condição indispensável à obtenção das chamadas "economias de escala" e vantagens análogas, com vista a reduzir custos e preços e a conseguir o mais racional aproveitamento dos recursos disponíveis.
O mercado passa a revestir, assim, em muitos sectores, uma estrutura oligopolística, e a concorrência tende a exercer-se entre empresas de dimensão adequada às exigências técnicas e económicas de cada ramo da produção.
Nesta concepção, a tutela, da concorrência deixa de atender à estrutura do mercado, para considerar fundamentalmente o comportamento dos sujeitos económicos, e reprimir as condutas lesivas da sã e efectiva competição, em detrimento dos consumidores e dos interesses gerais.
Numa palavra - não é o poder económico, em si mesmo, mas o modo como ele se exerce que passa a ser objecto da atenção do legislador.
35. As características actuais da economia portuguesa concorrem, no parecer da Câmara, para perfilhar o sistema de tutela da concorrência proposto no projecto.
A estrutura de vários sectores da produção nacional revela efectivamente, hoje ainda, a necessidade de intensificar, por meios eficazes, a política de reorganização e concentração industrial que constituiu objectivo dominante da Lei n.° 2005.
Na verdade, os métodos utilizados por este diploma não surtiram os efeitos que se ambicionavam, pois nenhuma reorganização industrial se realizou após a sua publicação.
A partir de 1959 publicaram-se diversos diplomas regulamentares tendentes a promover a concentração fabril em alguns ramos industriais 56. Mas os resultados obtidos por esta via também não se revelaram satisfatórios 57.
Segundo estudo recente, as empresas com efectivos até 300 trabalhadores representaram, em Portugal continental, no ano de 1964, nada menos de 99,4 por cento das explorações industriais e davam emprego a 72 por cento da mão-de-obra ocupada na indústria, originando 63 por cento do produto líquido do sector 58.
Este panorama é, por si só, suficientemente elucidativo das deficiências estruturais da nossa economia industrial e da urgência em promover e apoiar em escala crescente o adequado dimensionamento de grande número de sectores.
Isto não significa que, em diversas actividades, não deva, concomitantemente, executar-se uma política de auxílio e estímulo às pequenas e médias empresas, sempre que fundados motivos de ordem económica e social o justifiquem, a fim de assegurar o conveniente equilíbrio entre os vários sectores 59. Mas a obtenção de dimensões técnica e econòmicamente viáveis na maior parte dos ramos industriais revela-se como objectivo prioritário do desenvolvimento e progresso do País.
O projecto de proposta de lei sobre o fomento industrial, a que já se aludiu, constitui, sob este aspecto, documento do maior alcance.
No mesmo sentido, incluiu o Governo, nas últimas leis de meios, disposições importantes para o fomento da concentração, mediante incentivos fiscais adequados 60.
36. Não é, porém, apenas em razão das condições próprias do mercado interno que a apontada política de dimensionamento e racionalização das estruturas empresariais se revela imperiosa entre nós, no momento actual. Acima de tudo, ela torna-se inadiável por efeito da competição internacional, nomeadamente no quadro da integração económica da Europa.
Como justamente se acentua no preâmbulo do projecto (n.° 3), "com um mercado interno ainda reduzido, estando nós largamente dependentes do comércio internacional e, para mais, envolvidos num movimento de liberalização das trocas à escala mundial e europeia - a primeira das atenções do Governo não poderia deixar de se dirigir para a concorrência internacional".
E acrescenta-se: "Não podendo, pois, definir-se uma política, de defesa da concorrência sem os olhos postos nas condições em que se desenvolve o comércio internacional, natural se torna que tal política nunca pudesse prejudicar a dimensão óptima das empresas nos vários sectores da economia."
Esta Câmara exprime o seu aplauso às orientações assim definidas pelo Governo e formula votos no sentido de que elas sejam rápida e fielmente executadas.
37. No tocante ao sistema de protecção da concorrência, deverá ele, òbviamente, reflectir as apontadas directrizes em matéria de dimensionamento e racionalização das estruturas económicas.
Nesse sentido, considera a Câmara adequada às condições presentes da economia portuguesa a preferência atribuída pelo projecto ao sistema fundado no comportamento concorrencial das empresas - sistema do "dano efectivo" ou da repressão dos abusos - como método da regulamentação 61.
Pode, no entanto, suscitar-se a questão de saber se, em casos excepcionais, quando, por exemplo, em determinado sector da economia, a concentração tenha conduzido, a longo prazo, a uma estrutura excessivamente monopolística, o sistema dirigido apenas à repressão de práticas
56 Refrigerantes (Portaria n.° 17 264, de 11 de Junho de 1959), panificação (Diário do Governo, n.° 42 477, de 29 de Agosto de 1959), acumuladores eléctricos de chumbo (Decreto n.° 43 726, de 8 de Junho de 1961), moagem de trigo (Decretos n.ºs 43 023, de 21 de Junho de 1960, e 43 834, de 29 de Julho de 1961), massas alimentícias (Decreto-Lei n.° 45 589, de 3 de Março de 1964), tipografia (Decreto n.° 46 138, de 31 de Dezembro de 1964), serração de madeiras (Decreto n.° 46 318, de 29 de Abril de 1965), cerâmica de barro vermelho (Decreto n.° 46 581, de 6 de Outubro de 1965), litografia e rotogravura (Decreto n.° 46 591, de 13 de Outubro de 1965).
57 Veja-se Drs. Fernando Cruz, Pedroso Rodrigues e Ferreira do Amaral, "Política de concentração e agrupamentos", in Colóquio de Política Industrial, organizado pela Associação Industrial Portuguesa, relatório n.° 8, Lisboa, Fevereiro de 1970, p. 4.
58 Engenheiro António da Silva Teixeira, "As pequenas e médias empresas", in Colóquio de Política Industrial, cit., relatório n.° 6, pp. 20-21 e 45. As Estatísticas Industriais, publicadas pelo I. N. E. (a última das quais respeita ao ano de 1969), não fornecem dados por onde possam actualizar-se os apuramentos feitos neste estudo.
59 Ver a tal propósito o citado estudo do engenheiro António da Silva Teixeira.
60 Cf. Lei n.° 2145, de 24 de Dezembro de 1969, artigos 13.º, n.° 2, e 21.°, alínea d); Lei n.° 10/70, de 28 de Dezembro - artigos 13.°, n.° 2, alíneas a) e c), e 20.°, n.° 1.
61 Acerca das razões de preferência por este sistema no caso português, veja-se o citado estudo do Dr. Alberto Xavier, "Subsídios para uma lei de defesa da concorrência", capítulo V, pp. 121 e segs.