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14 DE FEVEREIRO DE 1942 225

ridade de critérios legislativos, segundo o argumento que aqui se utilizou. Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Angelo César acaba de interpretar as palavras do Sr. Deputado Cancela de Abreu nos seguintes termos:

- A idea do Sr. Deputado Cancela de Abreu, segundo aquele Sr. Deputado, seria, em vez de se fazer votação na especialidade em relação a cada uma das bases, a Assemblea abster-se de fazer essa votação; e, em vez disso, votaria uma moção de confiança ao Governo no sentido de o Governo legislar por decreto sobre a matéria.

Não posso dar seguimento a este alvitre em face do Regimento nem em face da Constituição.

Desde que a proposta foi aprovada na generalidade, e foi, porque nenhuma questão prévia foi apresentada, tem de haver fatalmente uma votação sobre a matéria na especialidade. A Assemblea não pode abster-se de fazer essa votação.

Vozes: - Muito bem! Apoiado! Apoiado!

O Sr. Presidente: - De resto, o Sr. Deputado Cancela de Abreu, com quem acabei de trocar impressões, tem este ponto de vista. A idea dele não é aquela que lhe acaba de ser atribuída pelo Sr. Deputado Angelo César, mas sim a de que o ponto de vista que em certa altura manifestou só podia ter tido efectivação durante a generalidade. Eu é que - parece-me- interpreto justamente a atitude do Sr. Deputado Cancela de Abreu, que é aquela em que me posso colocar.

O Sr. Cancela de Abreu: - Exactamente, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem de haver uma votação sobre a matéria, e a Assemblea ou aprova as bases que são submetidas à sua apreciação na especialidade ou as rejeita. É nesse sentido que elas têm de ser consideradas.

O Sr. Águedo de Oliveira: - Sr. Presidente: devo declarar a V. Ex.ª que não me sinto sozinho na defesa da matéria desta proposta e da contraproposta tal como ela foi apresentada. Sinto mesmo que tenho por mini a solidariedade incondicional da Assemblea, a qual tomou a iniciativa de tributar os lucradores de guerra. Sinto mesmo que tenho a solidariedade desta, Assemblea devido ao facto de que em várias sessões de estudo se chegou a resoluções e princípios de que se tomou cuidadosa nota na elaboração da contraproposta.

Claro que não posso, por forma nenhuma, sob o ponto de vista político, aduzir aqui considerações que suponham que o Deputado é menos qualificado ou competente para a confecção da lei, isto é, que precisa de estar apetrechado tecnicamente para emanar uma lei. Precisa, sim, de competência política.

Por outro lado, acompanhei, durante muito tempo, várias discussões parlamentares em matéria de tributação fiscal, e lembro-me, como se fosse hoje, das discussões sobre as propostas de Caillaux e de Lloyd George, acerca das quais se pronunciaram Deputados de todos os matizes, quer no Parlamento francês, quer no inglês, mas nenhum pôs este receio de não serem técnicos, nem as propostas deixaram de ser acompanhadas com um rigor que só o demorado estudo pode facultar.

Por outro lado, também não posso acordar neste ilogismo, que não sei se vi declarado, de a Assemblea enveredar no sentido de um desvio, ou de recuo, com relação a uma iniciativa que foi tomada por esta mesma Assemblea na obediência de uma imposição categórica da consciência nacional.

Nós estamos aqui no exercício de poderes soberanos, que são poderes incondicionados.

E é preciso não esquecer que esta Assemblea está exercendo uma função de soberania.

E claro que o Sr. engenheiro Cancela de Abreu desejaria que o texto da lei fosse melhorado, tornado mais claro, mais acessível, que o contribuinte encontrasse nele maior compreensibilidade, de forma a que não lhe oferecesse dúvidas. Mas a verdade é que as leis fiscais são de certo modo de carácter técnico e ninguém pode fazer idea da regra do direito fiscal sem conhecimentos práticos, sem saber a forma como trabalham as repartições de finanças.

O Sr. Cancela de Abreu: -Pois o meu ponto de vista é filho, justamente, dessa mesma opinião.

O Orador: - Tenho ouvido, mesmo aqui, o Sr. Melo Machado falar em nome dos lavradores e dos seus direitos no ponto de vista particular da maneira como os funcionários cumprem a lei e interpretam os seus intuitos. Portanto, repito, as leis fiscais, de sua natureza técnicas, requerem conhecimentos especiais sobre a forma como trabalham as repartições de finanças. Sem o essencial deles nenhum passo poderá ser dado, nenhuma disposição, por límpida que seja, se projectará claramente.

O que há-de guiar as repartições de finanças para a tributação dos lucros de guerra são em especial a tradição e a prática da contribuição industrial.

O intuito político desta lei é bastante claro e nítido. Todos nós desejamos que sejam tributados sem atenuações os lucros de guerra e temos a confiança de que os órgãos dependentes do Ministério das Finanças hão-de executar esta lei, obedecendo ao pensamento claramente manifestado na Assemblea Nacional.

Posso dizer mais: as leis estrangeiras sobre lucros de guerra não são nem mais claras nem mais nítidas do que a proposta aqui apresentada, nem mesmo aquelas falhadas propostas de lucros de guerra apresentadas aquando da guerra passada o eram.

A verdade fiscal não é absoluta e a técnica legislativa nem sempre será primor.

Claro que parece, em certo modo, que o Sr. Deputado Cancela de Abreu e outros Srs. Deputados que aqui passaram nesta tribuna quereriam aquilo que é realmente, no nosso século e no direito fiscal dos estados modernos, o ideal da tributação. Esse ideal da tributação é, não a tributação presumida ou normal dos rendimentos, mas a tributação real, realista - chamemos-lhe assim.

V. Ex.ªs sabem onde isto levaria e sabem como poderia ser alcançado. Levaria à introdução no nosso sistema da devassa e da inquirição sistemática, contra as quais todos nós reagimos nesta discussão em nome da brandura dos costumes portugueses.

Critica-se em nome de um sistema, contra o qual sã reage da primeira linha à última.

E levaria muito longe, porque uma reforma fiscal é sempre um salto sobre o abismo. Tal salto não pode ser dado em tempo de crise.

Não posso, portanto, estar de acordo em nada daquilo que seja renunciar à competência da Câmara e deminuir a sua competência legislativa por considerações de ordem técnica.

Sem dispormos de omnisciência, a competência propriamente legislativa não será negada, deminuída ou obliterada.