252 DIÁRIO DAS SESSÕES - N.º 129
para tanto as notícias em poder do Governo até este momento.
Depois da exposição dirigida ao País por intermédio da Assemblea Nacional em 19 de Dezembro, o Governo apresentou aos Governos Inglês e Holandês o seu protesto contra a violação do território de Timor por forças ali desembarcadas com o fim confessado de ajudar-nos na defesa contra iminente ataque japonês, visto a deficiência da guarnição local. Não podíamos pôr em dúvida nem este último facto nem a importância que a nossa parte da ilha teria para a defesa do território holandês c especialmente da Austrália. Mas não estávamos convencidos nem da probabilidade do ataque nem da sua iminência.
Por estes motivos e demonstrado como estava pelo simples decurso de tempo não ser exacto o motivo alegado da iminência da agressão, o Governo Português manifestou a sua confiança na retirada das forças estranhas. Previu-se por outro lado o suficiente reforço das tropas portuguesas, como meio mais simples de restabelecer, com a nossa perfeita neutralidade, a segurança para uns e outros contendores acerca da posse da parte portuguesa da ilha. Nessa conformidade se deram instruções imediatas para Moçambique, e devo consignar, para honra dos seus serviços, que o corpo expedicionário se encontrou num espaço mínimo de tempo pronto a partir.
Embora esta se nos afigurasse a solução mais simples, correcta e lógica, dados os antecedentes do caso, não podíamos aventurar as nossas forças tom longe de quaisquer bases e de outros recursos nossos sem averiguar qual a sequência do acto que, sem, olhar a encargos ou sacrifícios, nos resolvíamos a praticar. E seguiram-se então conversações com o Governo Inglês.
Eu fiz aqui a história do incidente e coube-me a ingratíssima tarefa de apresentar a profunda mágoa do Governo e interpretar o sentimento da Nação pela violência praticada, de que possivelmente o Governo Britânico não era inteiramente culpado, mas de que tinha de tomar a inteira responsabilidade. É razoável que seja também eu a fazer deste mesmo lugar justiça à lealdade com, que o Governo Inglês confessara termos cabal razão para protestar, à sinceridade com que sentiu o agravo feito e à amizade com que se empenhou em fazer aceitar a fórmula capaz de restabelecer na ilha uma situação impecável. (VOZES: - Muito bem, muito bem!). (Palmas). Pela sequência dos acontecimentos e até pelas ideas feitas acerca da defesa imperial, pela necessidade também de harmonizar interesses diferentes, todos podemos ajuizar de como, sem a mais decidida boa vontade da parte da Inglaterra, a que se associaram os Governos Holandês e da Austrália, teria sido impossível chegar a resultados úteis. Infelizmente por várias circunstâncias e sem a menor culpa nossa fomos obrigados a perder mais de um mês o corpo expedicionário estava pronto a partir em 30 de Dezembro; só em 22 de Janeiro recebemos a garantia da retirada das tropas holandesas e. australianas; só em 26 puderam, sair de Lourenço Marques com destino a Timor as forças que se haviam mandado preparar, agora em maior número que o anteriormente previsto.
A viagem tem sido mais morosa, do que permitia a nossa inquietação e eu aguardava ansiosamente o dia da chegada das forças portuguesas para celebrar a reposição integral da nossa soberania em terras de Timor e o definitivo encerramento de um incidente penoso mas que, apesar de tudo, nós não desejávamos deixasse traço de esfriamento, azedume ou desconfiança nas nossas relações de amizade com o Império Britânico.
Essa exposição porém, já não pode ser feita nos termos previstos por inesperado desvio dos acontecimentos.
Em 19 de Fevereiro o Ministro do Japão acreditado em Lisboa fazia, pelas dezoito horas, acerca de Timor, uma comunicação verbal, depois repetida por escrito e entregue pelas dez e meia da noite ao Ministro dos Negócios Estrangeiros. Leio-a à Câmara:
«Em seguimento das suas operações no Timor holandês, as forças imperiais viram-se obrigadas, em virtude da sua defesa própria, a expulsar o exército anglo-holandês que te encontra na parte portuguesa de Timor. O Governo Imperial aprecia os esforços desenvolvidos pelo Governo Português desde a ilegítima ocupação do Timor português pelo exército anglo-holandês em Dezembro último. Todavia; como as operações das forças japonesas se estenderam para o sul, estas não se encontram em situação de poder esperar a espontânea retirada do exército anglo-holandês, e o Governo Imperial não duvida de que o Governo Português se compenetrará de tal estada de cousas.
O Governo Imperial garante a integridade territorial do Timor português, e emquanto Portugal garantir, por seu lado, a manutenção da sua atitude neutral, o Governo Imperial está disposto a retirar as suas forças logo que os seus fins de legítima defesa estejam, atingidos.
O Governo Imperial espera que a sua verdadeira intenção seja correctamente compreendida e que o Governo Português possa determinar a sua atitude, tendo em consideração o que precede».
Mesmo descontado o avanço da hora de Timor sobre a de Lisboa, esta comunicação, repetida em Tóquio ao nosso Ministro, deve ler precedido o ataque já noticiado pelos jornais e agências como tendo tido começo na madrugada de ontem. E começou o novo calvário da terra portuguesa de Timor; o Governo não sabe, porém, ainda por conhecimento oficial e seguro os acontecimentos que ali se terão desenrolado.
Os termos correctos da comunicação recebida pelo Governo da parte do Governo Imperial não deminue a extrema gravidade dos factos. Não temos dê discutir os motivos da operação simultânea contra as duas partes da ilha, que tecnicamente e em pura abstracção dos direitos alheios pode parecer bem fundada. Nós temo-nos mantido fiéis a esta tese -- que não há direitos de estratégia contra a soberania dos Estados (VOZES: -Muito bem!). (Palmas); e ainda a este outro princípio - que a violação de um direito por uns não legitima a violação do mesmo ou de diverso direito por outros. (VOZES: - Muito bem, muito bem!). (Palmas). Seja qual for o interesse nipónico ou das forças nipónicas de ataque à parte holandesa de Timor em se premunirem contra o ataque de flanco; fosse qual fosse a importância das forças estacionadas no Timor português - aliás pequenas e cortadas das suas bases na outra parte da ilha -, a posição jurídica e moral permaneceria a mesma ( VOZES: - Muito bem, muito bem!). (Palmas): o acto das forças imperiais nipónicas constitue flagrante violação dos direitos soberanos de Portugal e o Governo encontra-se bem no seu direito - e aqui estritíssimo dever- de apresentar em Tóquio, como já fez, o mais enérgico protesto contra esta violência; violência inútil para a sequência das operações de guerra e inteiramente dispensável, pois a próxima chegada das forças portuguesas a Timor teria como consequência a retirada ou anulação das f Orças consideradas inimigas. ( VOZES: - Muito bem, muito bem !). (Palmas).
O Governo Japonês mostrara o seu aguado pela solução a que chegáramos, e estava informado, como aliás outros Governos, de tudo quanto respeitava ao reforço da guarnição de Timor e ao itinerário seguido; e devia saber que dentro de poucos dias estaria perfeitamente