256 DIÁRIO DAS SESSÕES - N.º 129
para a sua eterna continuidade. E justo que a comunidade tenha em conta esse serviço e ajude, de qualquer modo, a conduzir essa cruz dignificante, mas pesada.
Por duas formas se pode efectivar essa prática de .solidariedade social bem entendida.
Uma é a forma directa, a do salário familiar, a que ontem já aqui se referiu, e muito bem, o Sr. Deputado Ângelo César. E quando digo salário, quero também dizer ordenado ou vencimento; se as dificuldades são grandes para os operários ou proletários, são por vezes maiores ou mais dolorosas, embora mais discretas, na pequena burguesia. Ora essa forma directa está expressamente consignada no artigo 14.º da Constituição; e eu creio que, apesar dos seus nove anos de vigência e dos dezasseis anos decorridos desde a implantação dos seus princípios, eu creio que muito pouco se tem feito no sentido da remuneração do trabalho proporcionalmente ao número de filhos de cada um.
Outra forma é a forma indirecta, que a Constituição também consigna, quando diz, textualmente, que o em ordem à defesa da família pertence ao Estado e autarquias locais regular os impostos de harmonia com os encargos legítimos da família. (Apoiados}. Quero crer, com toda a sinceridade, que as circunstâncias, as difíceis circunstâncias de crise económica geral verificadas, mau grado nosso, durante estes anos da triunfadora política financeira do Estado Novo, não permitiram, de facto, a efectivação deste humano e justo princípio constitucional. Deus queira que ele possa efectivar-se em curto prazo, com caracter geral.
Mas há um aspecto dessa materialização de solidariedade para com as famílias numerosas que reveste, quanto a mim, uma característica especial, mais discriminada, mais objectiva, e, por isso, de atender por forma especial também. Refiro-me ao que cada um tem a pagar directamente por cada filho que trouxe a este mundo; aquilo que mais directamente o castiga, afinal, por uma culpa que não tem, por uma culpa que não é culpa, por uma culpa que é merecimento. Refiro-me, naturalmente, Sr. Presidente, às propinas das escolas.
E o certo é que o mesmo artigo da Constituição diz mais, textualmente, que ao Estado e às autarquias locais também pertence «facilitar aos pais o cumprimento do dever e instruir e educar os filhos». Neste particular, Sr. Presidente, é que eu ouso afirmar que já se podia ter feito um pouco mais do que o que se fez.
Apoiados.
Da resposta ao requerimento em que pedi informações ao Ministério da Educação Nacional eu concluo que é quási nada o que está «m vigor até agora em matéria de facilitar, de forma geral, por gratuitidade ou reduções de propinas, a matrícula dos irmãos de muitos irmãos. Um pai tem de pagar, nos estabelecimentos oficiais de ensino, pela inscrição dos seus filhos, a mesma considerável quantia por cada um, quer se trate de um só, como de cinco, como de dez. Talvez lhe façam, no armazém em que comprar de uma só vez seis pares de botas ou oito chapéus, algum abatimento pela quantidade; mas o Estado é que não lhe faz ainda nenhum abatimento nas propinas de dez filhos, o Estado que deve agradecer-lhe a dádiva de tantos novos cidadãos, o Estado que se obrigou a facilitar-lhe o dever de instruir esses filhos.
Na instrução primária não é concedida actualmente qualquer facilidade material de carácter geral. No ensino secundário, nem geral nem restrita; e praticamente o mesmo no ensino técnico médio ou elementar. Apenas no ensino superior foi dado agora, no recente decreto do Sr. Dr. Mário de Figueiredo, o primeiro passo no Bom sentido; mas passo tímido, passo demasiadamente modesto, de reduzidíssimo alcance. Honra lhe seja, apesar disso.
Não sei, Sr. Presidente, o que se passa no estrangeiro neste campo de facilidades oficiais aos filhos das famílias numerosas; deixo essa investigação aos que quiserem e puderem aprofundar o seu estudo. Basta-me a mim o sentimento do que vai cá pela nossa casa, pela nossa casa portuguesa, em que os filhos que nascem são sempre motivo de alegria ou de festa, seja o primeiro, ou o sexto, ou o décimo, sempre bemvindos porque Deus quis que eles viessem; mas casa em que tanta vez falta, por mais esforço e por mais canseira, a possibilidade de bem os manter, de bem os educar, de bem os conduzir a todos até à realidade do sonho que sobre eles se acalentou.
O meu ponto de vista é concretamente este: uma redução gradual dos encargos de matrícula a partir do terceiro filho do mesmo pai, atingindo a gratuitidade a partir do sexto. Não afirmo, mas quere-me parecer que a quebra de receita global resultante da efectivação desta norma não seria excessivamente elevada na relatividade em que a devemos apreciar. E talvez a capacidade financeira da Nação pudesse comportar essa quebra.
Mas não arrisco mais afirmações nesse sentido e quero aceitar a hipótese de ser necessário criar uma contrapartida. Pois bem, Sr. Presidente: eu atrevo-me a sugerir que se vá buscar a compensação tributária aos celibatários e aos casais sem filhos, por exemplo aos celibatários com mais de trinta anos de idade, aos casais sem filhos com mais de cinco anos de matrimónio.
Apoiados.
Não vejo que possa levantar-se grande dificuldade ou grande obstáculo à criação desse tributo. Não creio que se possa criticar contundentemente o princípio que ele constitue ou representa. Sinto que ninguém impugnará a sua justiça: a de fazer contribuir os que têm menos encargos na vida e menos jus ao reconhecimento da Nação neste aspecto, fazer contribuir esses para o alívio dos maiores e pesados encargos dos outros que a favor da Nação se desdobraram.
É isto, Sr. Presidente, que eu pretendi sugerir ao Governo nesta última sessão da legislatura ; é este o apelo, o último apelo que eu lhe endereço.
O Sr. Presidente do Conselho, naquela magistral alocução que há dias proferiu, na véspera da reeleição presidencial, para que os portugueses de todo o Império o ouvissem, disse em certa altura:
«... E se em toda a colmeia trabalhadora ... há ainda obreiros sem aquelas garantias que ousamos proclamar como direitos - o do trabalho e o da família -, todos têm a segurança de que os compromissos da Revolução se cumprem e de que, se não se adoptam soluções precipitadas, é para não comprometer soluções definitivas ...».
Temos, de facto, essa segurança. Mas é de desejar que. agora, passados mais de quinze anos de Revolução, este compromisso «esteja em vésperas de ser realmente cumprido. Já não poderá, considerar-se precipitada a solução a adoptar. Ela pode já ser, por certo, uma solução definitiva a favor daquele proclamado direito de família, atribuído, justamente, a todos os obreiros da colmeia. Mais uma solução definitiva, entre as muitas que já ilustraram, para orgulho nosso e glória de quem manda, a obra da Revolução. E não será esta das que menos brilho lhe darão.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Sr. Santos Sintra: - Sr. Presidente: uma das altas figuras militares que, já nos nossos tempos, muito contribuiu com os seus relevantes e extraordinários serviços