27 DE NOVEMBRO DE 1943 13
revoltos que vivemos, tal garantia efectiva, inequívoca, recebida das duas maiores potências marítimas, associadas na guerra e comprometidas na paz (Vozes: - Muito bem, muito bem!).
Creio ter dito o essencial sôbre a concessão de facilidades nos Açôres, como julgo ser inútil acrescentar que o Govêrno não teve ao decidir-se senão uma preocupação - servir o interesse nacional (VOZES: - Muito bem, muito bem!). Êste a figurou-se-lhe solidário com a fidelidade da Nação ao espírito dos seus compromissos externos, não tomados ocasionalmente contra êste ou contra aquele, mas através dos séculos e a favor só da sua integridade e soberania imperial. (VOZES: - Muito bem, muito bem!). Parece que êste ponto não pode ser discutido. A peitar disso o Govêrno tem a consciência de ter prestado um serviço, não de ter feito um negócio; operou por patriotismo e de modo algum, por cálculo (VOZES: - Muito bem, muito bem!).
A inteligência do acontecimento em todo o País, nas ilhas, nas províncias ultramarinas, entre as numerosas colónias portuguesas do estrangeiro, foi tam completa e inequívoca que não pode deixar de significar ter-se interpretado correctamente o seu mais profundo sentir. Por outro lado, em todos os meios internacionais a reacção foi extraordinariamente favorável ou pelo menos compreensiva. Designadamente nos meios anglo-americanos o acto teve o condão de lançar inteira luz sobre a seriedade e coerência da nossa política externa, de a tornar mais bem entendida mesmo em sectores onde tem sido vítima do desconhecimento quando não sujeita a sérias deturpações. Apreciou-se-lhe a coragem moral, a transcendência patriótica. Só em restritos meios que parece terem, velhas contas a ajustar connosco se associou a atitude do Govêrno Português a cálculo interesseiro de política partidária. Verdade seja que também cá dentro, no meio do coro de aplauso verdadeiramente nacional, alguns deram mostras de se sentir lesados. Acredite-se que o Governo o não tinha em mente e considera isso acidente do jogo, sem importância de maior.
Completarei as informações que venho dando à Câmara com alguns dados relativos à nossa colónia de Timor, cuja situação tem sido objecto dos maiores cuidados e diligências, mas não pode dizer-se esteja satisfatoriamente resolvida.
Câmara sabe que o acôrdo feito com o Governo Britânico e o Govêrno de S. M. na Austrália para a retirada das forças australianas, quando ali chegassem as forças portuguesas, não pôde executar-se porque, estando estas a poucos dias do porto de destino, o Timor português foi invadido por fôrças japonesas que da presença daquelas no território tiraram argumento para nova violação da nossa neutralidade. As fôrças portuguesas foram desviadas para a índia, aguardando mitra oportunidade, e a luta entre as forças japonesas e as australianas e holandesas continuou durante algum tempo, até que as tropas nipónicas puderam- estender a toda a ilha a sua ocupação.
A Câmara foi igualmente informada do protesto apresentado pelo Govêrno e do seu propósito de recomeçar com o Governo Imperial as diligências necessárias à satisfatória resolução do novo incidente. Supôs-se que, não podendo o Governo Japonês invocar quaisquer obrigações de aliança para defesa das nossas possessões, nem a necessidade da ocupação para ulteriores operações de guerra, pois tinha em seu poder a parte holandesa da ilha, nem a necessidade de defender-se contra o perigo de retorno das força» australianas, pela própria evolução das operações militares, seria possível, acabada ali a luta, restabelecer a situação anterior de respeito pela neutralidade do território, embora devessem tomar-se medidas para garantir de facto a sua inviolabilidade futura por parte de qualquer dos beligerantes.
Durante alguns meses, com luta no território, a situação tornou-se difícil. Sofreram-se bombardeamentos aéreos, a evacuação da capital, as requisições militares, todos os incómodos e gravames que a guerra traz inevitavelmente consigo. Mas a soberania era reconhecida; a administração portuguesa exercia-se em todo o território, embora com, lacunas inevitáveis: as populações mantinham a disciplina; o Governo, em contacto com o governo da colónia, podia ainda dirigir superiormente, aconselhar, tomar providências. Não se pode dizer o mesmo no período subsequente.
Invocando ulteriores necessidades de defesa, as forças japonesas encerraram a estacão de rádio no fim de Maio; o último telegrama recebido directamente do governador tem a data. de 29 de Maio do ano findo. Sem notícias nem comunicações de qualquer ordem, a colónia ficou isolada em relação à metrópole; só a Austrália conseguiu manter algum contacto.
Segue-se um período ainda mais escuro. Chegam-nos informações de refugiados portugueses na Austrália, mas não queremos fazer sôbre elas a completa reconstituïção de acontecimentos que muito interessam à soberania portuguesa e às nossas relações, com o Império Nipónico. Pode porém afirmar-se que houve sublevações de indígenas, em perfeita tranquilidade sob o nosso domínio; cometeram-se assassinatos de dezenas de pessoas, sacerdotes, médicos, funcionários, simples particulares. Mais de quinhentas pessoas, devido aos meios que generosa e humanitàriamente o governo australiano pôde fornecer à população em estado de tam grande necessidade, refugiaram-se na Austrália, nada tendo conseguido salvar senão a vida. Houve roubos, destruïções, devastação. As fôrças japonesas escolheram duas zonas onde se concentraram os elementos europeus que conseguiram, escapar aos ataques e não abandonaram a ilha. O governador está, porém, na, capital. Durante muito tempo o abastecimento da ilha não se fez, o comércio paralisou, as culturas arruïnaram-se, faltaram as cousas mais essenciais à vida da população. Ignora-se se é como se exerce a administração, em que consiste ou a que está reduzida a soberania portuguesa, apesar tias reiteradas declarações do Governo de Tóquio sobre o respeito que lhe merece.
Em tais circunstâncias pareceu ao Govêrno que o ponto essencial de partida para tomar conhecimento exacto da situação e tentar conseguir-lhe, remédio era o restabelecimento das comunicações directas com, o govêrno da colónia. Tóquio não aceitou reabrir a estação de rádio nem. permitiu as comunicações em cifra com, o governador. Nós não aceitámos os bons ofícios das autoridades japonesas como intermediários forçados de telegramas ostensivos com o govêrno da colónia (VOZES: - Muito bem, muito bem!).
Separando a necessidade de informação objectiva e imparcial de todas as outras questões, que seriam depois tomadas uma, a uma para resolução conveniente, propusemos a Tóquio enviarmos a Timor um oficial de Macau que fizesse um inquérito aos acontecimentos, inclusive a qualquer responsabilidade do governador em actos em que as forças ocupantes pretendiam ver quebras do espírito de neutralidade. Esta proposta fui declarada inaceitável e ficou até ao presente sem seguimento.
Nas últimas semanas o Governo tem recebido, por intermédio da Legação Japonesa em Lisboa, alguns telegramas do governador. Por dever de lealdade se lhes faz referência, mas, coerente com a atitude antes definida, o Govêrno não pode considerá-los base suficiente para qualquer actuarão da sua parte (VOZES: - Muito