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27 DE NOVEMBRO DE 1943 17

nacionais. Efectivamente, de altos interêsses nacionais trata a lúcida e clara exposição do Sr. Presidente do Conselho sobre a política externa do Govêrno e os acontecimentos da vida nacional que com ela se relacionam. Mas com razão se pode dizer que os acontecimentos de hoje são simplesmente o último elo de uma cadeia que há muitos anos as fôrças do mal vêm a forjar.
Aqueles que, como eu, fizeram a guerra de 1914-1918 viram nos campos retalhados pela metralha o que é «aquele monstro que se sustenta das fazendas, do sangue, das vidas; aquela tempestade terrestre que leva os campos, as casas, as vilas, os castelos e as cidades, e em um momento sorve os reinos e monarquias inteiras». Cada um de nós trazia consigo, ao ser desmobilizado e ao retomar as ocupações do tempo de paz, a ânsia de dias melhores, o desejo honesto e limpo de que, com o aperfeiçoamento moral da humanidade, desaparecesse a guerra como meio de satisfazer as aspirações mais ou menos legítimas dos povos.
Mas não eram só, Sr. Presidente, os antigos combatentes que tinham em si a falsa certeza de que o sacrifício não fora inútil. Eram também aqueles que, na retaguarda dos exércitos, longe ou perto deles, tinham assistido ao desenrolar da luta e sofrido as consequências dela; eram ainda aqueles que na guerra e pela guerra tinham perdido pais, filhos, irmãos ou amigos queridos. Milhões e milhões de pessoas, em todo o mundo, detestavam a guerra, porque a fizeram, porque a sentiram, porque a sofreram, porque a não compreendiam.
Apesar disso e - paradoxo estranho - apesar de na direcção dos povos estarem por toda a parte, de 1918 a 1939, os que fizeram ou presenciaram a guerra de 1914, dia a dia a crise se foi agravando. Por toda a parte os povos foram acumulando armamento, víveres e combustíveis, na previsão de um conflito que ninguém sabia como, quando e onde ia começar, e que ninguém ainda hoje pode com segurança dizer quando e como acabará. Temos assistido e assistimos ainda agora ao esforço formidável da humanidade para produzir engenhos de destruição, cada vez em maior quantidade e de maior eficiência, com o fim de espalhar o terror e a morte à face da terra. Com horror se reconhece que a humanidade parece dominada pela fúria maldosa de se destruir a si própria.
Mas o mal não era só este. Simultaneamente, no infeliz período de 1918 a 1939, parecia dar-se um abaixamento geral das normas de conduta moral, política e social. As antigas normas elevadas de proceder das pessoas e dos governos tinham desaparecido. Poucas vezes na história da humanidade a moralidade internacional terá descido tanto.
Em Setembro de 1939 deu-se a crise. E, no meio do estrondo dos canhões e das bombas de avião, um povo e um govêrno, pelo menos, se mantiveram e mantêm fiéis ao mandamento divino «não matarás». Um povo e um governo, pelo menos, denunciaram o materialismo como causa fundamental do desassocêgo do mundo, materialismo que se traduz em egoísmo, medo e voracidade. Um povo e um governo, pelo menos, afirmaram a sua confiança nos valores espirituais e morais da humanidade e mantiveram-se ligados a princípios de vida e de moral que são os conceitos simples de verdade, justiça, tolerância, generosidade e respeito pela dignidade do homem.
Êsse povo foi Portugal (Apoiada); êsse Govêrno foi o de Salazar.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - A Assemblea Nacional pratica um acto de simples e elementar justiça reconhecendo e afirmando que o Sr. Presidente do Conselho soube conduzir a, política externa do País com patriotismo, dignidade e inteireza moral.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Descurando interesses alheios, para só cuidar do interesse nacional, S. Ex.ª encontrou o verdadeiro caminho; e seguindo-o, o povo tem podido viver tranquilamente a sua vida e a Nação tem podido cumprir dignamente a sua missão histórica.
Os factos foram relatados e comentados pelo Sr. Presidente do Conselho com claridade e rigor de expressa o tais que, aproveitando a referência feita por S. Ex.ª ontem mesmo nesta, sala à «facilidade do» matemáticos para o direito», eu não hesito em reconhecer que o Sr. Presidente do Conselho, mestre de direito, raciocina e expõe como se matemático fôra.
Pelo Acôrdo de 12 de Outubro o Governo Português concedeu facilidades nos Açôres à Grã-Bretanha, que fica assim em condições de proteger melhor a navegação mercante no Atlântico. O Acôrdo fez-se no funcionamento normal da aliança luso-britânica, aliança que dura há 600 anos, facto único na história contemporânea; mas ficou nele explicitamente salvaguardada a manutenção da soberania portuguesa sobre o território nacional. O Acôrdo é, pois, um acto digno, que resulta, pela força das circunstâncias, de obrigações voluntariamente assumidas e repetidamente afirmadas, pari» mútua vantagem da Grã-Bretanha e de Portugal.
A celebração do Acôrdo com a Grã-Bretanha em nada afectou e possivelmente até melhorou as nossas relações com a Espanha, e o Brasil, povos irmãos, a que nos ligam laços apertados de amizade e solidariedade histórica e cultural que vêm do passado e que temos obrigação de manter no futuro. A política de verdade e de inteireza do Sr. Presidente do Conselho se deve que não se rompa e nem sequer esfrie esta comunhão de sentimentos e ideais com o povo espanhol e o povo brasileiro.
A exposição dos factos sucedidos em Timor, da sua evolução no tempo e da situação actual só pode corresponder uma atitude: absoluta e completa solidariedade da Assemblea para que a situação de Timor, que é preciso resolver, encontre rapidamente a solução que todos desejamos.
Antes de terminar, Sr. Presidente, quero citar aqui a frase de um cientista português, que, embora falecido há poucos anos, já hoje deve considerar-se um clássico da língua e do pensamento. Disse ele um dia que «a obra feita, de si mesma é satisfeita».
Talvez seja assim na grande maioria dos casos: o autor de obra grande e valiosa só na realização da própria, obra encontra satisfação; nem os homens nem os povos suportam facilmente a superioridade de uma grande obra. Mas, felizmente para nós todos, não é assim pelo que respeita ao reconhecimento ele que na condução da política externa do País (e só a essa me refiro agora) o Sr: Presidente do Conselho teve sempre presentes as verdadeiras necessidades e possibilidades da Nação Portuguesa e os grandes princípios da verdade, da justiça e da inteireza.
E não diga S. Ex.ª que «só ao momento político, e, em certa medida, pela calma da consciência pública e pela tranquilidade que cerca o trabalho do Governo, interessa que isso tenha sido percebido e devidamente apreciado pela generalidade do público». Não! Todos nós sabemos que não é assim; e temos a certeza de que a Nação sente, com maior ou menor consciência, mas verdadeiramente sente, quanto há de patriótico, digno e íntegro na política externa do Govêrno.