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122 DIÁRIO DAS SESSÕES - N.º 48

prática demonstração do carinho merecido pelas obras de iniciativa privada- o seu espírito e orientação próprias (penhor da continuidade da colaboração gratuita de tantos dos nossos melhores valores mentais no ensino), o Estado auxilie generosamente essas escolas, de onde sairá o melhor pessoal - pelo meio onde é recrutado, pela formação moral e preparação científica e técnica- para a efectivação da almejada reforma dos métodos da assistência.

Pessoal de enfermagem e visitadoras

63. Não há médico interessado no problema da assistência social em Portugal que não considere absolutamente fundamental a renovação dos métodos da formação do pessoal de enfermagem.
Estamos neste ponto embaraçados por hábitos inveterados, que hão-de custar a eliminar da nossa mentalidade e da vida hospitalar.
A diferença entre a enfermagem nos hospitais portugueses e nos hospitais de mais adiantados países estrangeiros é enorme. Resulta esse facto de que na Inglaterra ou na Alemanha a enfermeira destina-se à carreira por vocação e a ela se consagra com todas as veras, renunciando ao seu lar; ingressa numa corporação de rígida disciplina; adquire preparação técnica de primeira ordem; é uma auxiliar e colaboradora, apreciada, considerada e respeitada, dos médicos; encontra no hospital um ambiente moralmente irrepreensível, que lhe cumpre manter impoluto, embora com liberdade de vida, sob sua responsabilidade, fora do estabelecimento.
Análogas condições, adaptadas às suas circunstâncias, se encontram quanto ao pessoal masculino.
Recrutado todo este pessoal num. meio social já cultivado ou, ao menos, educado, é excelente cooperador na missão orientadora e formativa dos serviços de assistência social.
E não se pense que este pessoal, por ser laico, encara a sua missão como simples modo de ganhar a vida mediante o exercício mecanizado de uma técnica seca. Não. A severidade do recrutamento, a disciplina e o ambiente moral da corporação onde ingressam acendem-lhes um espírito de devoção carinhosa, de que todos os doentes guardam terna recordação. A memória dessa doce e enérgica figura de mulher (porque a doçura não é incompatível com uma perseverante, esclarecida e calma energia) que foi Florence Nightingale guia, e ilumina em muitos países a missão de enfermagem elevada à altura de uma gloriosa renúncia em benefício da humanidade sofredora.
Na impossibilidade de forçar vocações religiosas, há que fomentar a melhor orientação, dentro desta generosa concepção, das vocações de enfermagem.
Nos últimos tempos tem-se procurado melhorar e disciplinar a preparação e o exercício da enfermagem, e a isso visou o decreto n.º 31:612, de 31 de Dezembro de 1942. Persiste-se, porém, em fazer a educação de enfermeiros e enfermeiras por médicos, o que não é aconselhável, pois se trata de profissões inteiramente diferenciadas, cada uma das quais tem sua técnica, seu espírito e sua missão.
Há já, porém, alguma cousa de rasgadamente novo dentro da orientação preconizada: é a Escola Técnica de Enfermeiras, criada pelo decreto n.º 30:447, de 17 de Maio de 1940, no Instituto Português de Oncologia, com a valiosa colaboração técnica e assistência financeira da Fundação Rockefeller.
Tem de encarar-se também a preparação de pessoal especializado. No Hospital Júlio de Matos está a fazer-se um curso de formação de enfermeiros e enfermeiras psiquiatras, segundo as modernas concepções, com o auxílio do pessoal suíço em boa hora contratado com autorização do Governo.
As enfermeiras puericultura s e parteiras têm de ser formadas com extremos de cuidado, sem esquecer uma sólida preparação moral que as habilite a ser conselheiras nos melindrosos transes em que tantas vezes são procuradas.
Emfim, as enfermeiras visitadoras (visitadoras sanitárias, visitadoras escolares) hão-de ser formadas em institutos próprios, onde se tornem aptas para colaborar com a família e educá-la para, sem quebra de unidade e autonomia, vencer os obstáculos que a doença, o desânimo e a negligência criam ao desenvolvimento de uma vida sã e feliz.
A constituição de corporações de enfermagem deve ser estimulada e favorecida. Convém de facto que, dada a grande desigualdade de nível entre o pessoal existente e o que tem de formar-se para o futuro, se separem os grupos, homogéneos tanto quanto possível, deixando-se mesmo estabelecer entre eles fecunda emulação.
Toda a obra reformadora neste capítulo terá, porém, de ser condicionada pela vinda de pessoal estrangeiro que prepare, num meio isolado, os novos profissionais.

Os médicos sanitários

64. Vem finalmente o problema da preparação especial dos médicos que se proponham seguir a carreira sanitária. A este respeito Portugal foi dos países precursores e mais avançados ... na legislação. Mas, como sempre, deixou-se ficar largo espaço entre o que se imaginou na lei e o que se pôs em prática.
Na verdade, em 1901, Ricardo Jorge concebeu e incluiu na lei a criação do Instituto Central de Higiene, cujo primeiro objectivo seria o de a ministrar a instrução especial técnica e conferir o tirocínio profissional prático necessário como habilitação de admissão aos lugares de médicos e engenheiros do corpo de saúde pública (regulamento geral dos serviços de saúde pública, artigo 115.º).
O curso de medicina sanitária, compreendendo o ensino da administração, legislação e polícia sanitárias, demografia, epidemiologia, bacteriologia aplicada à higiene, profilaxia anti-infecciosa, meteorologia, hidrologia, telurologia aplicadas à higiene, microscopia, química e engenharia sanitárias, era destinado a médicos. Podia ser professado em Coimbra e no Porto, mas todos os exames se realizavam em Lisboa.
Instalou-se o Instituto, que ainda hoje existe, numa casa arrendada, e entrou a funcionar o curso, depois considerado condição de preferência nos concursos para médicos municipais. Mas permitiu-se que o frequentassem quintanistas de medicina, os exames são feitos nas três cidades universitárias e, segundo testemunho autorizado, o ensino a é lamentavelmente benévolo, de onde resulta, apesar da comprovada competência dos que o têm regido, ser proverbialmente inútil»1.
Quanto ao Instituto Central de Higiene, que hoje tem o nome do seu fundador, basta também ouvir o queixume do ilustre director geral de saúde, Sr. Dr. José Alberto de Faria: «Ao percorrer-se aqueles laboratórios ficar-se-á possivelmente na idea de que também nas suas funções entrará a de apresentar a higiene em ar faceto e caricatural» 2.
Não é preciso acrescentar mais para demonstrar quanto é indispensável olhar a sério para este problema- onde não há grande cousa a progredir no do-
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1 Dr. Fernando Correia, Portugal Sanitário, p. 802.
Administração sanitária, p. 293.