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132 DIÁRIO DAS SESSÕES - N.º 49

Qualquer dos dois tipos de tribunais especiais adoptados nas leis estrangeiras, ou o do juiz de vigilância ou o das comissões judiciárias, parece aceitável.
Contra êste último sistema pode dizer-se que é de mais difícil execução, por implicar a colaboração de várias entidades, com prejuízo do funcionamento prático do tribunal. Pode acrescentar-se que a colaboração de elementos estranhos de carácter técnico se alcança com a consulta aos Institutos de Criminologia ou a outros serviços de análoga natureza e que, assim, a decisão do juiz não sê firmará somente numa impressão pessoal, mas em todo o processo informativo dos serviços técnicos prisionais.
Em todo o caso julgou-se preferível adoptar na presente proposta um sistema mixto, com a instituição de juizes singulares de execução das penas, de cujas deeisões, porém, haveria recurso, nas hipóteses mais graves, para tribunais colectivos, cuja composição se fixaria em regulamento. Estes poderão contribuir para corrigir qualquer possível deficiência da decisão da 1.ª instância naquelas matérias em que as necessidades de defesa social ou os interesses dos particulares podem justificar uma mais larga ponderação.
De toda a maneira estes juizes deverão ter a possibilidade de obter um directo conhecimento do preso, sendo desejável que controlem por êsse meio os elementos de informação constantes dos respectivos processos.

II

Da rehabilitação

4. Tal como a respeito do cumprimento da pena e da medida de segurança, também a propósito da rehabilitação, restituição ao condenado da sua capacidade de direitos, bom nome e dignidade afectados pela pena é feito pôr o problema da jurisdicionalização.
Quere dizer: à semelhança do que acontece eom o cumprimento da pena e da medida de segurança, è igualmente legítimo preguntar se a concessão da rehabilitação deve ser da competência de órgãos administrativos ou de órgãos judiciais.
Perfilha-se aqui a segunda solução.
Assentando a rehabilitação na emenda do condenado, ela suscita a um tempo dois interesses igualmente importantes, que carecem de ser convenientemente tutelados: o interêsse individual e o da defesa social.
Ora o processo administrativo, dada a maior descricionaridade de que gozam os órgãos da administração, presta-se mais a apreciações inconsideradas.
E esta orientação torna-se tanto mais plausível quanto é certo que uma tendência bem vincada se nota, já na doutrina, já nas legislações, no sentido de alargar o benefício da rehabilitação a condenados a quem ela outrora não podia de modo algum estender-se, condicionando, todavia, semelhante alargamento à verificação de determinados requisitos, que assim lhe imprimem um cunho de maior legalidade.
Desde que a rehabilitação deixou de ser um puro e arbitrário favor do poder soberano, que se confundia com as demais medidas de indulgência, para passar a constituir antes um verdadeiro direito de que todos podem tornar-se titulares, desde, que para isso reunam as condições fixadas na lei, parece dever, lógica e naturalmente, concluir-se que deverão os tribunais intervir na apreciação e decisão das várias questões dela emergentes.
Mas ainda um outro argumento é lícito alegar em favor desta orientação. Deduz-se êle da própria essência do instituto e pode apresentar-se assim: se a rehabilitação se traduz sempre na eliminação, total ou parcial, dos efeitos produzidos pela condenação penal e se esta só por tribunais pode ser proferida, é razoável que se não siga caminho diferente para a concessão daquela.
E, na verdade, ou fôsse pela lógica e justeza das considerações que ficam expendidas, ou fosse também por outras quaisquer razões, o certo é que a rehabilitação, que de simples manifestação de clemência do poder real passara a ser depois, e sucessivamente, instituição municipal e instituição administrativa, cedo entrou a ser consagrada na legislação como autêntica instituição judiciária.
Assim sucedeu v. g. em França, onde a rehabilitação, instituição a um tempo judiciária, administrativa e governamental, consagrada no Código de Instrução Criminal, foi totalmente jurisdicionalizada pela lei de 14 de Agosto de 1880. E direcção análoga se acha firmada também no direito de outros países: é o que se verifica designadamente na Itália (Código Penal, artigos 179.º e 180.º, e Código de Processo Penal, artigos 097.º e seguintes) e na Suíça (Código Penal, artigos 76.º e 81.º). No mesmo sentido pode citar-se o Código Penal Polaco, artigo 90.º
É também esta a orientação que aqui se preconiza.
No decreto-lei n.º 27:304, de 8 de Dezembro de 1936, que remodelou os serviços do registo criminal, toma já vulto entre nós a concepção da rehabilitação como medida de protecção a delinquentes emendados, e não como acto de mero favor.
A presente proposta tem em vista dar mais um passo nesta matéria, garantindo jurisdicionalmente o direito à rehabilitação.

5. A rehabilitação que se deixou referida, quer seja concedida por autoridades administrativas, quer seja concedida por autoridades judiciais, assenta fundamentalmente na boa conduta do condenado depois do cumprimento ou da extinção da pena. Quere dizer: só é concedida após se teor averiguado em processo - para tal fim propositadamente instaurado e instruído - que o condenado teve de facto boa conduta.
Ao lado dela, porém, uma outra rehabilitação revelam as leis de alguns países: a chamada rehabilitação legal ou de direito.
Trata-se, como a própria expressão inculca, de rehabilitação que se opera pelo decurso de certo lapso de tempo, desde que durante ele o condenado não tenha sofrido nova condenação.
São, como se vê, modalidades distintas, pois, emquanto na primeira se tornam necessários para a concessão o pedido do condenado, a prova - a fazer por meio de inquérito - de que se verificam todas as condições postuladas na lei (v. g. a boa conduta do mesmo condenado) e por fim a apreciação e decisão da entidade competente para a conceder, na segunda exige-se apenas que, dentro de certo prazo, não tenha sido proferida nova condenação penal.
Esta modalidade - a de rehabilitação legal ou de direito - foi introduzida no direito francês, a primeira vez, pela lei de 26 de Março de 1891, mas só para a hipótese de se tratar de pena cuja execução ficara

1 A palavra «rehabilitação» pode ser empregada, pelo menos, em três acepções, para designar a reintegração do condenado, julgado inocente em consequência de revisão extraordinária da decisão condenatória, no seu estado de direito anterior à condenação; para referir a situação do condenado, cuja pena, condicionalmente suspensa, ficou extinta devido à sua boa conduta durante o prazo de suspensão; finalmente, para abranger a eliminação de todos ou de parte dos efeitos de uma condenação criminal em consequência de boa conduta posterior do condenado. Quando aqui se fala de rehabilitação, emprega-se sempre a palavra na sua ultima acepção, que é também aquela em que costuma ser usada no âmbito do direito criminal.