134 DIÁRIO DAS SESSÕES - N.º 49
dentro do lapso de tempo estabelecido, haja tido sempre boa conduta, devidamente comprovada. Quando muito poderiam tornar-se mais gravosas as condições para a respectiva concessão.
Em relação aos reincidentes e, de uma maneira geral, aos condenados por mais do que um crime, também nada se opõe a que lhes seja extensiva. Na verdade, apesar de terem delinquído mais de uma vez, a sua adaptação a uma vida socialmente correcta continua a ser possível. Dever-se-ão, porém, estabelecer condições mais apertadas para tal concessão.
No que respeita aos que, tendo sido rehabilitados uma vez, cometerem mais - tarde novo delito, são de invocar mutatis mutandis ias mesmas considerações.
E quanto a habituais ou por tendência, análoga orientação está em harmonia com o direito penal moderno, que, embora sujeitando esses delinquentes a penas mais longas e a um regime de maior severidade, confia sempre na sua possível adaptação social, isentando-os de prorrogação de pena e admitindo-os a liberdade condicional, quando se mostrem inofensivos ou se presumam socialmente adaptáveis.
Nada justificaria, pois, negar-lhes a rehabilitação, porque são exactamente esses delinquentes, pela desconfiança de que são rodeados, que mais carecem de amparo nos seus bons esforços de emenda e adaptação à vida honesta.
Simplesmente deverá sujeitar-se a rehabilitação a um mais rigoroso tratamento.
Em face do exposto, julga-se que o alargamento, por via legislativa, da rehabilitação representa a simples consagração de directrizes que estão de acordo com a evolução do instituto e podem, além disso, produzir eficazes resultados práticos.
8. Há ainda que mencionar determinados casos, que, pela sua especialidade, exigem uni tratamento diferente ou explicações complementares.
O primeiro destes casos é o da rehabilitação de menores delinquentes.
Segundo o artigo 34.º do decreto-lei n.º 27:3Q4, para, nenhum efeito, salvo, em certas hipóteses, para instrução de processos crimes, podem transcrever-se nos certificados do registo criminal quaisquer inscrições penais relativas a menores delinquentes.
Pode preguntar-se se não deverá admitir-se também uma rehabilitação para estes menores, em que condições e com que efeitos.
Mas esta forma de rehabilitação tem o seu lugar próprio nas leis especiais de menores delinquentes, em cuja reforma se trabalha e na qual será apreciada.
Outro caso é o dos absolvidos, não pronunciados ou despronunciados, suspeitos de crimes.
Tendo de constar sempre do certificado do registo criminal, para concurso a cargos públicos, as inscrições de despronúncia ou absolvições (decreto-lei n.º 27:304, artigos 28.º e 31.º), estas podem comprometer a reputação dos interessados, prejudicando-os na sua pretensão.
Mas, quanto a estes, não se põe o problema da rehabilitação, visto que não foram condenados.
A salvaguarda da sua reputação, que pode ser prejudicada pela publicidade do registo criminal ou policial, deverá assentar, se for admissível, na limitação do conteúdo dos respectivos certificados, o que é matéria do organização daquele registo.
9. Quanto à possibilidade de sucessivas rehabilitações, o Código Penal Brasileiro segue também uma orientação rigorosa, não admitindo que, uma vez revogada a rehabilitação por nova condenação em pena privativa de liberdade, possa ser novamente concedida.
A mesma orientação seguira o projecto do Código Penai Italiano, mas foi posta de lado, não transitando para o Código, o qual, sendo a êsse respeito omisso, se considera como autorizando sucessivas rehabilitações. Apreciando esta matéria, escrevem Santelti-di Falco (Commento teorico-prático del nuovo Códice Penale, v. II, pp. 50 e 51): «Essa disposição (do projecto) destinava-se a evitar situações contraditórias, como seria a de um delinquente rehabilitado por duas vezes. Mas tal norma, por demasiado rigorosa, foi suprimida. Não é de excluir nomeadamente a possibilidade de regeneração após uma segunda infracção cometida depois de obtida, pela primeira vez, a rehabilitação. Para prevenir os inconvenientes resultantes da latitude do critério que informa o instituto basta a boa prudência do julgador».
Nenhuma restrição se encontra também nos restantes códigos penais.
Afigura-se que só esta ampla orientação é aconselhável, já porque a defesa social não é mais comprometida com uma nova rehabilitação, já porque seria votar o condenado a um absoluto desinteresse por nova tentativa de emenda. De resto, não é muito coerente conceder a rehabilitação a reincidentes e recusá-la só pelo facto de haverem sido rehabilitados.
10. Acêrca do carácter da rehabilitação três sistemas se encontram nas
legislações:
a) Rehabilitação imediatamente definitiva;
b) Rehabilitação provisória, seguida de rehabilitação definitiva;
c) Rehabilitação sempre revogável.
Seguem o primeiro sistema os códigos penais: polaco, de 19 de Outubro de 1930, e suiço, de 21 de Dezembro de 1937. Era já o sistema adoptado na lei francesa de 14 de Agosto de 1885 (o Código de Instrução Criminal perfilhava o terceiro sistema).
O segundo foi aceite pelo Código Penal Italiano, de 19 de Outubro de 1930. O terceiro pelo recente Código Penal Brasileiro, de 12 de Setembro de 1940, e pela Reforma Penal de Espanha, de 1932.
Emquanto que no primeiro sistema, como o seu título indica, a rehabilitação é desde logo definitiva, no segundo, na modalidade adoptada pelo Código Italiano, só reveste esse carácter como anos depois de concedida, se durante esse prazo o rehabilitado não incorrer em nova condenação, em pena não inferior a três anos de reclusão; é no terceiro é sempre caducável desde que pese sôbre o rehabilitado nova condenação ou em qualquer pena-privativa de liberdade, como se estabelece no Código Penal Brasileiro, ou por crime previsto sob o mesmo título daquele a que a rehabilitação respeitou, segundo dispõe a Reforma Penal Espanhola.
A primeira vista parece mais conforme à defesa social a rehabilitação sempre revogável. Por um lado, a prática de um crime vem denunciar que a adaptação social não foi completa e definitiva e que assim é útil entrar em conta com a condenação anterior e, por outro, parece injusto conservar ao rehabilitado os direitos que lhe foram restituídos. Pode ainda dizer-se que tal forma é a que oferece melhor estímulo contra novos crimes.
Em favor, porém, da rehabilitação provisória seguida de definitiva é possível alegar razões não menos decisivas. Há que atender em primeiro lugar a que o período de tempo exigido para a concessão da rehabilitação junto àquele durante o qual ela se conserva revogável é suficientemente longo para, no caso de novo crime, estar excluída a reincidência. Não estão em si mesmas afastadas, é certo, as regras legais da sucessão de crimes e da habitualidade, mas pode dizer-se que o novo crime aparece como um acto sem ligação com os crimes anteriores, digamos, como uma manifestação