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234 DIÁRIO DAS SESSÕES - N.º 61

importância das obrigações que impendem sôbre a assistência, chegando a alvitrar-se o recurso à tributação das fortunas para os encargos da solidariedade nacional.
A tal respeito é-me gratíssimo citar a fórmula a que aludiu o ilustre Deputado Sr. Dr. Carlos Borges e que se vai generalizando e desenvolvendo de ano para ano, a qual promete transformar-se em abundante fonte de recursos para a alma das Misericórdias.
Refiro-me aos cortejos das oferendas, que anualmente se verificam em muitos concelhos, sobretudo na região minhota, e nos quais, festivamente, quási todos os habitantes porfiam em transportar em carros engalanados os géneros produzidos nas suas lavouras, juntamente com outras ofertas de vulto.
E posso garantir a V. Ex.ª que esses cortejos são bem mais interessantes e muito mais prometedores do que a bicha de algumas dúzias de possuidores de fortunas à boca das tesourarias públicas.
Apoiados.
Ai de nós se não confiássemos no despertar dos sentimentos de solidariedade e tivéssemos de enveredar pelo perigoso caminho da tributação para valer a males que só a assistência privada poderá atenuar!
E que, Sr. Presidente, a assistência não se faz somente com dinheiro, que é o que se leva à tesouraria. Exige, sim (nem só de pão vive o homem), uma larga parte que é exclusiva dos domínios do espírito. A assistência desacompanhada de amparo moral e de certas manifestações de carácter afectivo não corresponde ao que a maioria dos infortunados ansiosamente espera.
Recordo que as criancinhas internadas nos institutos da Junta Geral do Distrito do Porto, depois transferidos para a Junta de Província do Douro Litoral, organismos a que tive a honra de presidir, preferiam muitas vezes as carícias das senhoras que nos davam a honra da sua valiosa colaboração naquela vasta obra de assistência às guloseimas com que elas as brindavam.
A obra de assistência é tam vasta e transcendente que ficaria incompleta se confiada principalmente ao Estado e levada a efeito apenas com recursos materiais do erário, servida por burocratas, sem o concurso de santas vocações para a prática do bem!
Apoiados.
Neste campo, como em muitos outros, o Estado apenas deve entrar como orientador e supremo coordenador, mas usando sempre da maior prudência e delicadeza.
Acertadamente se diz no douto parecer: «a inspecção deve ser mais orientadora que fiscal e importa não embaraçar os particulares com peias e formalismos burocráticos».
Sr. Presidente: mal nos iria se não confiássemos nas iniciativas e actuação privadas. O médico procura sempre despertar a actividade das células, as funções dos diferentes órgãos e o metabolismo que a todos une equilibradamente; e quando o não consegue e tem de substituir-se àquelas actividades fisiológicas, logo o prognóstico se carrega.
Tal-qualmente, se o Estado não confiasse nas possibilidades dos cidadãos e procurasse substituir-se-lhes, seria o socialismo a ameaçar a vida nacional, com todas as suas graves consequências.
Apoiados.
Sr. Presidente: justamente num livro cheio de interesse e de alto valor do Sr. Dr. Marcelo Caetano, que relatou o magnifico parecer que nos orienta no estudo da proposta em discussão - Problemas da Revolução. Corporativa -, cita-se uma afirmação eloquente de Salazar quando lhe foram solicitadas providências do Estado para determinado problema de vulto:
«Não tenha ilusões: o Estado pode muito pouco quando se trata de produzir riqueza ou de fomentar actividades ao pé das incalculáveis possibilidades da economia privada. Veja os agricultores: o que essa massa de gente consegue fazer, arrostando com mil dificuldades e contrariedades. Vem uma invernia rigorosa, inundações, trovoadas e perdem-se centenas de milhares de contos, que o Estado não poderia perder nem é capaz de indemnizar: pois a agricultura sofre o prejuízo, recompõe-se e prossegue».
Esta eloquente afirmação na boca do ilustre Presidente do Conselho é merecida homenagem à comprovada perseverança do povo português na sua rude tarefa.
Mas, por vezes, precisa de ser ajudado, acontecendo que, em vez de ajuda, tropeça com as dificuldades de uma burocracia abundante e exageradamente exigente.
Também nesta missão de valer aos desventurados a iniciativa privada precisa de orientação e coordenação, acompanhadas do indispensável auxílio do Estado.
Os meus votos, Sr. Presidente, são para que, ao criarem-se novos quadros de funcionalismo no vastíssimo sector da assistência, se evite a substituição por novos funcionários de tantos que até agora trabalhavam gratuitamente pelo bem comum e se registem as palavras acertadíssimas do douto parecer da Câmara Corporativa:
«A verdade é que a iniciativa privada é engenhosa na invenção e aplicação de novas fórmulas, tem maior liberdade de movimentos, conquista mais facilmente o coração e a bolsa dos filantropos e a generosidade do público, revela extraordinárias vocações e dedicações».
É bem certo: na prática da assistência, se é aceitável a orientação do Estado para que os esforços de todos tenham a indispensável unidade, de que há-de resultar maior eficiência, importa não esquecer que as autênticas vocações constituem a mola real do grande problema em discussão.
A garantia de que, ao realizarem-se as bases do Estatuto da Assistência Social, aqueles preceitos hão-de ser religiosamente considerados reside na elevação de sentimentos do Govêrno, e, neste caso, tenho a grande satisfação de me referir à alta formação moral dos ilustres Ministro do Interior e Sub-Sccretário de Estado da Assistência Social, bem como de outros altos funcionários que neste assunto têm colaborado, não só com grande inteligência, mas com indiscutível vocação.
Outros temas da maior actualidade, desenvolvidos tanto na proposta de lei como no parecer da Câmara Corporativa, estão a tentar-me para que os glose, como bem merecem, mas, como espero ter de subir algumas vezes a esta tribuna para justificar as alterações que tenho a honra de propor, reservarei para então as considerações que julgar oportunas.
Termino, Sr. Presidente, por me congratular com a Nação pelo esforço inteligente, devotado e valioso consagrado pelo Governo, do qual destaco os dois ilustres estadistas já citados, ao problema que a todos preocupa - assistência social.
Disse.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Proença Duarte: - Sr. Presidente e Srs. Deputados : a proposta de lei que estamos discutindo propõe-se resolver duas ordens de problemas: o problema da saúde pública e o problema da assistência social; talvez mais propriamente: o problema da assistência médica e o problema da assistência social.
Estes dois problemas interessam a toda a população portuguesa, às populações dos grandes aglomerados urbanos como às populações rurais, aos pobres e aos ricos. Dirigem-se portanto à população portuguesa as