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22 DE JANEIRO DE 1947 325

O Sr. José Cabral: - E não deve a Assembleia fazer nada que de qualquer modo possa influir, directa ou indirectamente, sobre a decisão que o tribunal entenda dever tomar.

O Orador: - Isso está na ordem de todas as minhas considerações.

Posto isto, concluo o meu pensamento: não há caso que toque o Ministro ou o Subsecretário de Estado.

Prestemos-lhes a nossa homenagem.

Apoiados.

Pode haver, pelo que ouvi no fim das considerações hoje feitas pelo Sr. Deputado Botelho Moniz, algum aspecto moral que não toca nem o Ministro nem o Subsecretário de Estado, que não são os portadores das portarias para o Diário do Governo; se houver, discuta-se e arrume-se.

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Presidente: - Vai passar-se à

Ordem do dia

O Sr. Presidente: - Continua em discussão o aviso prévio do Sr. Deputado Rocha Paris acerca da crise dos municípios.

O Sr. Teotónio Pires: - Sr. Presidente: mais uma vez, e desta tribuna, eu desejo apresentar a V. Ex.ª respeitosos cumprimentos, com os protestos da minha maior admiração pelas altas qualidades morais e intelectuais que concorrem na pessoa de V. Ex.ª dando-lhe um lugar inconfundível na vida política da Nação.

Sr. Presidente: em boa hora trouxe o Sr. Dr. Rocha Paris a esta Câmara o seu aviso prévio sobre a situação dos municípios.

Com notável espírito crítico e agudo sentido da oportunidade, para ele requereu a generalização do debate o Sr. Dr. Antunes Guimarães.

Temos tido, assim, o prazer de ouvir, conhecer e apreciar a opinião autorizada de muitos colegas que à vida municipal têm dado o melhor do seu esforço e o melhor do seu saber de experiências feito.

Os oradores que me precederam, esclarecidos uns pela prática que viveram na gestão dos negócios municipais, documentados outros pelos estudos que fizeram da vida dos concelhos do País - todos são unânimes em reconhecer e concluir que a situação é grave e reclama urgente remédio, para se não deixar estiolar e perder no amálgama das coisas incaracterísticas uma instituição multi-secular que mergulha as suas raízes no humo profundo da nossa tradição, como tão eloquentemente o salientou o Sr. Dr. Mário Madeira.

Para que se não assista à rendição incondicional da maioria dos municípios, exangues à míngua de recursos, impotentes para preencher a sua missão histórico-social, necessário se torna procurar providências de excepção, soluções heróicas que ponham cobro ao justo clamor das gentes e que sustem a vaga de desgosto e de desânimo que ameaça invadir e dominar os homens que tão abnegadamente, e quase sempre tão ingloriamente, queimam por esses concelhos de Portugal as suas energias na administração municipal.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador:- Da vida municipal do continente não tenho completo conhecimento de visu. Porém, para ajuizar e com segurança concluir da sua situação, da sua actual posição nos depoimentos que ouvi, me louvo.

Dos concelhos açorianos outro tanto não direi. Conheço-os razoavelmente nos seus aspectos fisiográficos e económicos, nas suas aspirações, dificuldades e desalentos.

Ainda há poucos meses, percorrendo na companhia do governador as ilhas do distrito de Angra do Heroísmo, me foi fácil confirmar o estado de necessidade, de penúria mesmo, de um dos seus concelhos, tão pobre, como outro não haverá em Portugal, tirante o de Corvo.

Tão pobre esse concelho e com tantas e tão largas possibilidades latentes para se desentranhar em fecundo progresso, se lhe puderem ser e forem satisfeitas elementares necessidades que pelos seus recursos próprios o não poderá jamais conseguir.

Para cúmulo da má sorte, foi precisamente este concelho o mais duramente castigado pelo grande ciclone que em Outubro último assolou o arquipélago dos Açores.

Tenho em meu poder um apelo impressionante do presidente da respectiva câmara clamando amparo e justiça para aquela gente a quem o mar tudo levou, desde o cais, muralha de protecção, guindaste, até às próprias casas e quintais.

Nunca por ali passara tão inclemente a fúria dos elementos, a não ser em 1757, quando um terramoto totalmente arrasou a vila.

Refiro-me ao concelho da Calheta, da «verdejante e laboriosa ilha de S. Jorge, porventura aquela em que mais dura é a luta com a terra e que mais abandonada de tudo e de todos se sente», na frase incisivamente objectiva e justa do ilustre titular da pasta da Guerra, aquando da sua viagem pelos Açores, no último verão. Se da Calheta passarmos a Velas, o outro concelho ainda em S. Jorge, e depois a Santa Cruz, na ilha Graciosa, por toda a parte sentiremos o mesmo pulsar de generosos anseios de «mais e melhor», quando é certo que eles ainda nem o essencial possuem!

Caminhos, redes de abastecimento de águas potáveis, redes de esgotos e edifícios escolares faltam em quase todos os concelhos rurais de 3.a ordem! E estes, com seus recursos próprios, não podem, nem nunca poderão, satisfazer tão importantes e fundamentais necessidades colectivas.

Há um nível de vida abaixo do qual os povos não podem e não querem descer, nem se deve tolerar que desçam, sob pena de se cair na estagnação, na apatia, na depredação dos valores humanos irrecuperáveis.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Com a sua indiscutível autoridade de economista e sociólogo, o nosso ilustre colega engenheiro Araújo Correia demonstrou com números e irrefregáveis conclusões que uma boa parte dos municípios do País nunca poderá cumprir, através dos seus recursos próprios, as obrigações que legalmente lhes impendem.

São estes os factos, é este o panorama da nossa vida municipal.

Estamos, pois, em face duma situação inelutável, irremediável ou catastrófica? Não o julgo assim, e comigo todos os que não perderam o sentido das realidades e o senso das proporções.

Não subimos a esta tribuna para denunciar os males e depois recolhermo-nos comodamente a um alheamento indefensável. Não! Estamos aqui para pedir, reclamar e enunciar soluções, para apontar deficiências orgânicas ou erros funcionais, mas com generosidade e recta intenção, alto espirito de bem servir o interesse nacional e clara visão das dificuldades da hora presente.

Estamos aqui, em suma para colaborar.

Vozes: - Muito bem!