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24 DE JANEIRO DE 1947 359

As razões não são difíceis de explicar. Um rapaz tira o seu exame de instrução primária e dá entrada nas escolas industriais, onde trabalha 5 anos e onde esse trabalho tem mais o carácter de ordem teórica do que de ordem prática. Por isso, ao terminar o seu curso, ele, que está possuidor de uma certa cultura geral, que lhe dá laivos de pseudo-intelectualismo, que vive num meio mais de escolar que de operário e que não se habituou a considerar-se tal, esse homem, dizemos, não se sujeita aos trabalhos grosseiros que as oficinas lhe impõem, nem a viver num meio em que predominam os analfabetos, as pessoas sem educação igual à sua e que lhe mostram uma grande reserva, quando não hostilidade. Depois, há ainda a notar que esses alunos, quando saem ou ainda frequentam as escolas, são muito mal pagos visto serem considerados aprendizes.
V. Ex.ª sabem quanto é que a Companhia dos Telefones de Lisboa, apesar de ser uma das grandes empresas da capital, paga a um aprendiz, mesmo que esteja matriculado em qualquer ano destas escolas?
No primeiro ano, em que é considerado aprendiz sem prática, paga-lhe 10$ diários e no segundo ano, quando passa para aprendiz com prática, paga-lhe 15$ diários.
Só no fim destes dois anos poderá ser mecânico, com 600$ mensais.
Aumentem V. Ex.ªs a estes salários os 50 por cento de melhoria e vejam se mesmo assim se não justifica a relutância que um aluno de curso equivalente ao 5.º ano do liceu tem em o utilizar para se empregar.
O director da Escola Fonseca Benevides, referindo-se a este aspecto da questão, escreveu:
«O curso da Escola não á etapa para lugares de relevo nas oficinas, mas sim habilitação para salas de desenho ou cursos de marinha, exército o aviação. A razão do desprezo dos diplomados das profissões para que foram preparados deve estar na diferença entre a cultura geral do curso e elevação do meio em que foram formados e o ambiente das oficinas, baixo demais para as pretensões que criaram». Também o parecer da Câmara Corporativa foca este mesmo aspecto ao aludir ao drama dos diplomados pelas escolas técnicas.
De tudo quanto ficou exposto no referente ao ensino elementar e complementar industrial parece poder concluir-se, independentemente da opinião que se tenha sobre as causas, que estamos em presença de dois factos incontroversos, que são: primeiro, pouco aproveitamento dos alunos que frequentam as escolas industriais; segundo, desinteresse dos diplomados pelo curso que escolheram.
Por isso, em presença desta situação, não podemos deixar de concordar que muito bem fez o Sr. Ministro em tentar modificar o actual estado de coisas no referente a este aspecto do ensino técnico.
Vejamos agora o que se passa quanto ao ensino técnico médio industrial.
O objectivo deste ensino, que é ministrado, como V. Ex.ª sabem, nos dois Institutos Industriais de Lisboa e Porto, é criar auxiliares de engenharia. A frequência destes dois Institutos era em 1943-1944, segundo as estatísticas, de 1:416 alunos e os que terminaram o curso foram 154.
Neste caso passa-se uma coisa parecida com o que atrás mencionamos. Os engenheiros queixam-se de que os ditos diplomados se recusam a desempenhar o papel de auxiliares, previsto por lei, e que eles, engenheiros, com cursos superiores, se vêem obrigados muitas vezes a desempenhar serviços que não estão bem dentro da sua categoria e que bom poderiam ser feitos por indivíduos que tivessem habilitações mais elementares, com benefício para a economia do serviço. Ora, porque é que tais diplomados, cuja função deveria ser a de auxiliares dos engenheiros, não se sujeitam a desempenhar essas funções e se recusam a colaborar com eles?
Dizem os diplomados dos institutos industriais que não há razão alguma para se verem colocados nesta situação de auxiliares, porquanto o curso do seu instituto dura aproximadamente o mesmo número de anos que o do Técnico, que o número de cadeiras é quase o mesmo e que a qualidade do ensino ministrado nelas é também muito análoga. Acrescentam ainda que a tradição inerente a estes cursos mostra que no tempo em que havia poucos engenheiros eram eles quem desempenhavam a maior parte das funções que hoje cabem aos diplomados do Instituto Superior Técnico.
Por isso pedem que se anulem as restrições postas à sua actividade, que os inibem de trabalhar em cimento armado, de projectar trabalhos de abastecimento de águas para povoações com mais de 999 habitantes, etc. E acabam por dizer que ou lhes dão as antigas regalias ou então é preferível extinguir o curso e substituí-lo por outros mais rudimentares.
A luta entre as duas classes, e cujo eco chegou ato nós através da representação do sindicato dos ditos diplomados, convém ser resolvida, e por isso, e principalmente para obviar à dita carência de auxiliares do engenheiros, há que modificar o actual estado de coisas. Se as escolas industriais preparam poucos alunos que sejam verdadeiros operários, como vimos, os institutos industriais também preparam poucos alunos que sejam verdadeiros auxiliares de engenheiros. Num o noutro caso nota-se excesso justificado de intelectualismo. O depoimento da Companhia União Fabril no inquérito não deixa de ser curioso de registar. Ei-lo: «Há uma notável deficiência na preparação prática dos diplomados do instituto industrial. Dir-se-ia que o curso não é conduzido no sentido de os preparar para dirigir directamente operários. Se eles continuarem a manter a tendência de serem engenheiros auxiliares, pouca utilidade terão na vida industrial. É indispensável que eles saibam pegar numa ferramenta e não receiem sujar as mãos».
Uma razão, pois, mais a juntar à mencionada, quando se tratou do ensino elementar, para justificar a actuação governamental apresentando esta proposta.
Eu gostaria de focar também detalhadamente as deficiências dos outros ramos de ensino tratados na proposta, mas isso levar-me-ia muito longe e a hora vai já bastante adiantada.
Não farei, portanto, grandes referências ao que só passa no ensino comercial, limitando-me u dizer que a situação é idêntica à do industrial, como se depreendo do próprio preâmbulo da proposta, que esclarece que apenas 3 por cento dos indivíduos que frequentam as escolas comerciais conseguem levar o seu curso até ao fim.
Quanto ao que se passa no ensino elementar agrícola, destinado a fornecer feitores e capatazes de lavoura, o qual é ministrado nas duas escolas da Paia e de Santo Tirso, onde havia, em 1943-1944, 225 alunos e em que os diplomados foram 36, limito-me a perguntar aos homens desta Câmara que têm ligação com a agricultura: conhecem muitos casos de particulares utilizarem tais diplomados para aqueles fins? Estou convencido de que não; e não me alongo nas razões de tal, precisamente pela falta de tempo, limitando-me a dizer que o único escoamento de tais diplomados são os serviços do Estado.

uanto ao ensino médio agrícola, creio que também os regentes agrícolas não têm saída para a lavoura; mas o caso destes diplomados merece mais algumas palavras.
O curso de regentes agrícolas, dado nas três escolas de Coimbra, Santarém e Évora, em que o número do alunos era em 1943-1944 de 517 e o de diplomados de 72, é de sete anos.
Apenas no 6.º e 7.º se estudam cadeiras propriamente tecnológicas. Nos primeiros cinco anos desse curso ministram-se todas as cadeiras dos também primeiros cinco anos