1 DE FEVEREIRO DE 1947 443
etc.!..., mas para todas elas é preciso preparar bons profissionais.
Também a pequena aprendizagem feita na família do mestre, que às vezes era o chefe da própria casa, tende a desaparecer, e é pena; era ião carinhosa para os principiantes que aí recebiam os rudimentos profissionais da costura, dos bordados, de marcenaria, de entalhador etc., era tão simpática, socialmente, tão útil e algumas vezes tão nossa, tão tipicamente portuguesa! Hoje é possível que a aprendizagem feita apenas na tradição não baste. É preciso que se aperfeiçoe, simplifique e valorize pela aplicação que lhe puder ser feita dos progressos da ciência e da técnica moderna. No entanto, era tão fácil fazê-la in loco!
Não se diga -como o faz o parecer da Câmara Corporativa- que as indústrias regionais e caseiras de pouco valem. Pergunte-se à Madeira qual o montante do valor da produção dos lindos bordados feitos pelas 20:000 mulheres que aí se dedicam a essa indústria: 100:000 contos de valor de exploração anual nos últimos anos!
Sobre o capítulo de aproveitamento local da mão-de-obra feminina e suas vantagens muito haveria a dizer, e todo esse muito seria pouco numa época em que o trabalho feminino fora de casa e a consequente quebra da unidade familiar que muitas vexes daí resulta são aproveitadas e exploradas para servir ideologias contrárias à páz, aos princípios morais e à ordem social que deveria reinar entre as nações.
As indústrias caseiras e as indústrias regionais, embora as considerem de somenos categoria, têm, como se vê, a sua importância e valor na vida do País, e bem maior do que se julga a priori.
Com as facilidades de comunicações e futura electrificação geral do País é mesmo natural que esse valor cresça consideravelmente.
Em matéria de exportação devemos ter presente que não poderemos concorrer com a produção de outros países no que respeita à quantidade, mas poderemos, se o quisermos, fazer-lhes concorrência pela qualidade dos nossos produtos, e é nas indústrias regionais que podemos preparar mais facilmente produtos de qualidade.
Não creio que as pequenas actividades regionais, tal como em geral estão sendo desenvolvidas, sem orientação técnica definida e sem pessoal técnico devidamente adestrado, nos vão dar, em numerário, grandes «saldos credores» nas «contas entre as nações», mas também estou certa de que, modificadas aquelas condições, algum poderiam dar-nos e que o facto de serem consideradas numa reforma de ensino técnico profissional em nada vai diminuir a «verdadeira indústria, aquele fruto de uma técnica de sólidas raízes científicas que gera os artigos do grande comércio mundial, aquele comércio que dá trabalho aos homens e prosperidade às nações, aquele que tem verdadeiro peso na vida económica», conforme se lê a p. 6 do parecer da Câmara Corporativa que acompanha a proposta em discussão.
Sente-se que o relator deste parecer, ao tratar por forma tão diferente as grandes fontes de produção económica e as pequenas indústrias, ainda está impressionado pelo peso esmagador daqueles números, quase astronómicos, que traduzem, na economia dirigida da América do Norte, o fruto do labor das grandes empresas.
Henri Wallace afirma, porém, com toda a sua autoridade que não é esse o caminho do futuro e que este, longe de se encontrar nos grandes monopólios industriais, há-de encontrar-se nas pequenas indústrias, geridas com maior autonomia.
Colocando-me apenas na posição de membro de uma assembleia política e em resposta às afirmações do relator do parecer, ouso afirmar que, mesmo independentemente da opinião de Henri Wallace e embora o ensino técnico seja «essencialmente utilitário»; «embora lhe caiba o dever de estimular as pequenas actividades regionais», não irá perder-se por elas em «devaneios parnasianos», nem daí lhe advirá «perigo». «Porque nas contas entre as nações, tal como nas contas entre os indivíduos -é ainda o parecer que o diz-, só é estável a posição de quem logra saldo credor», e acrescenta: «não é fácil consegui-lo com os frutos do regionalismo, que, sobre ser económicamente débil, precisa de ser sóbrio, para não se tornar piegas».
Abstraindo do regionalismo piegas - também não gosto de pieguices -, sou de opinião, Sr. Presidente, que mesmo que fossem totalmente para desprezar os rendimentos das pequenas indústrias regionais da nossa terra, o já atrás vimos que nem sempre assim sucede, não só os saldos em moeda nos podem granjear apreço entre as nações.
Quando o «regionalismo» conseguir prender seriamente às suas terras grande número de mulheres que hoje se perdem pelas cidades em trabalhos, nem sempre lucrativos, quando o regionalismo conseguir que nos lares de algumas das nossas aldeias e em muitas casas das nossas vilas e cidades possa haver, pelo trabalho útil, honesto, bem orientado e ordenado das mulheres mais bem-estar e alegria, maior elevação de espírito e saber profissional, maiores virtudes familiares e domésticas, o seu fruto deixará sem dúvida de ser económicamente «débil», para se tornar capital sem preço, que fará inclinar para a nossa querida Pátria o prato daquela balança invisível onde, através da pureza de costumes de um povo, se pesa o seu património moral e espiritual e por isso mesmo a grandeza do seu futuro.
Um outro ponto que me impressiona na proposta é ver que na reforma do ensino técnico profissional não há uma única referência àquela organização nacional de alta missão educativa que o próprio Estado colocou junto da escola para completar a sua acção no que respeita u educação moral, física e social dos alunos.
Refiro-me à Mocidade Portuguesa masculina e feminina.
O Sr. Manuel Múrias: - Muito bem!
A Oradora: - Estão de sobejo demonstrados os inconvenientes pedagógicos da sobreposição de algumas das suas mútuas actividades no campo comum onde as exercem para que uma nova reforma de ensino, pela abstenção em abordar o assunto, sancione o erro cometido e, de acordo com as respectivas organizações, não tente corrigi-lo dentro da sua esfera de acção.
Quando pertencia aos quadros da Mocidade Portuguesa feminina tive oportunidade de me referir publicamente a esta falta resultante de desconexão havida entre o trabalho da Mocidade e o da escola; hoje, porém, que estou fora deles sinto-me mais à vontade para o fazer e particularmente para notificar à Assembleia que, em matéria de ensino técnico especializado paru raparigas, muito se tem devido à Mocidade Portuguesa feminina. É justo reconhecê-lo no decurso deste debate sobre ensino técnico profissional, e ai é curioso notificar que foi a Mocidade Portuguesa feminina que, pela primeira vez, levou às escolas técnicas algumas actividades que não constavam dos seus programas, como, por exemplo, a Educação Física e o Canto Coral.
O Sr. Manuel Múrias: - É pura verdade.
A Oradora: - Também à Mocidade Portuguesa feminina se devem cursos vários de educação familiar e a preparação do respectivo pessoal docente, sendo ainda, ela quem, em data anterior à existência do Instituto Nacional de Educação Física, promoveu os primeiros cur-