5 DE FEVEREIRO DE 1947 470-(17)
vel, embora este fosse fixado por meio de coeficientes de valorização.
Afastou-se este sistema sòmente a partir da reforma tributária aprovada pelo decreto n.º 16:731, de 13 de Abril de 1929. A reacção contra os antigos princípios resultou de estarem já muito longe da verdade os valores matriciais e terem, consequentemente, diminuído as receitas do Estado em matéria de contribuição predial. Criou-se, em razão disso, um sistema novo para a actualização das matrizes e, porque não se permitiu o aumento das rendas, impôs-se ao arrendatário a obrigação de pagar a parte da contribuição predial correspondente à diferença entre o rendimento colectável e a renda (artigo 21.º).
Lê-se no relatório da reforma tributária: "A solidariedade entre o imposto predial e a legislação do inquilinato, há já longos anos mantida, é responsável pelo baixo rendimento, pelas desigualdades dos valores matriciais, por uma lamentável repercussão na sisa e no imposto sobre as sucessões. Há que cortar por uma vez a ligação e tentar resolver separadamente os dois problemas, que já são difíceis em si e mais se complicam quando se juntam". Bem vistas as coisas, estas palavras suo exactas; a culpa era da legislação do inquilinato, o que não quer dizer que fosse impossível ter resolvido os dois problemas conjuntamente, como sempre se tinha feito até aí.
O relatório do Orçamento Geral do Estado para 1947 parece já revelar uma orientação diferente daquela. Aí se lê: "Nos prédios urbanos o regime do inquilinato e a maior actualidade das rendas não aconselhavam providências semelhantes, o que não quer dizer que os dois problemas -o do regime contratual e o do regime fiscal - não careçam de solução a tomar certamente em conjunto"23.
Este desvio da reforma de 1929 manteve-se até hoje, através dos decretos-leis n.ºs 25:502, de 14 de Junho de 1935 (artigo 44.º), e 20:851, de 14 de Setembro de 1935 (artigo 4.º). Somente se tem admitido uma excepção no caso de traspasse de estabelecimentos comerciais ou industriais, em que o senhorio pode pedir a avaliação nos termos do Código da Contribuição Predial e exigir do novo inquilino a renda fixada pela comissão avaliadora. E a doutrina hoje consagrada expressamente no artigo 4.º da lei n.º 1:981, de 3 de Abril de 1940.
Mas, além de tradicional, o sistema da correspondência entre o rendimento colectável e a renda parece à Câmara Corporativa ser o mais aconselhável.
Os sistemas que além deste têm sido admitidos em leis estrangeiras ou propostos pelos autores são os seguintes:
a) Recurso aos tribunais;
b) Recurso a comissões especialmente constituídas para esse "feito;
c) Fixação de rendas por meio de coeficientes de valorização.
De todos, nenhum se apresenta tão perfeito, tão lógico e até de resultados tão justos como o do rendimento matricial, no fundo, é o sistema indicado na alínea b), com a simples diferença de que, em vez de se constituírem comissões especiais, atribui-se o encargo às comissões permanentes ide avaliação dos prédios urbanos para efeitos fiscais.
O recurso a tribunais, quer especiais, quer comuns, como se permite em certa medida na Inglaterra e no Brasil, não é um meio muito conveniente. Um arbitramento pertence mais a peritos do que a juizes, mesmo quando estes são chamados a decidir, e, ou se estabelecem regras uniformes para todos os tribunais, e a função jurisdicional apaga-se - o juiz passa na realidade a ser também um perito-, ou se permite liberdade de apreciação e de nomeação de árbitros, e teremos uma multiplicidade tal de critérios dentro do País que não poderão deixar de se prever graves injustiças relativas e o mal-estar social que essas injustiças sempre provocam.
Acresce ainda uma outra circunstância que contraria não só este sistema como os outros: o de se admitirem duas verdades contraditórias: admitir-se que para efeitos fiscais um prédio tenha um certo valor locativo e um valor diferente para efeitos da fixação da renda.
Dentro do sistema do recurso aos tribunais especiais estava integrado o projecto Pinto Loureiro. Desde que não houvesse "acordo entre senhorio e inquilino, tinha de proceder-se à fixação arbitrai da renda, observando-se o que se acha disposto no Código de Processo Civil relativamente à constituição e funcionamento dos tribunais arbitrais. O tribunal decidiria ex aequo et bono, segundo o mesmo projecto. Simplesmente, como um dos árbitros seria nomeado pelo senhorio e outro pelo inquilino (não seria de supor o acordo como facto normal), e como o terceiro, nomeado pelo juiz, seria obrigado a conformar-se com um dos laudos (Código de Processo Civil, artigo 1578.º), ver-se-ia instituído um processo de se fixarem rendas arbitrárias, que nem em princípio se podiam considerar as mais justas. Podia, quando muito, falar-se numa justiça aproximada, que não é a que convém.
A nomeação de comissões especiais não tem justificação, desde que já existem comissões permanentes de avaliação, que operam por meio da aplicação de normas objectivas emanadas da Direcção Geral das Contribuições e Impostos23.
Só haverá que unificar todas as instruções e circulares dessa Direcção Geral e, porventura, alterá-las,
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22 No Diário do Governo de 30 de Dezembro de 1946 (suplemento). Também, era diferente a orientação da comissão nomeada em 1926 pelo Ministro das Finanças para dar parecer sobre as bases de uma reforma relativa nos traspasses de prédios ou parte de prédios ocupados por estabelecimentos comerciais ou industriais. O relatório dessa comissão (publicado no Diário do Governo n.º 98, 2.ª série, de 2 de Maio de 1928) foi sintetizado no parecei1 da Câmara Corporativa sobre a proposta de lei n.º 59, em que se converteu o decreto-lei n.º 29:449, nos termos seguintes: "A comissão, depois de mostrar como era modesta a cifra da contribuição predial urbana e como ela estava em desproporção com a contribuição predial rústica, que era então igual a vinte e três vezes a paga em 1914, ao passo que a urbana era igual a sete vezes apenas a paga naquele ano, apreciou a legislação do inquilinato baseada na restrição da liberdade contratual para a realização do princípio fundamental da garantia da, estabilidade da habitação a preços baixos, afirmando que ela não tinha garantido a paz social, e antes tinha mantido em luta aberta duas grandes classes da população, e que era responsável em grande parte não só pela crise da habitação e pela diminuição do valor da propriedade urbana, mas também por um grande prejuízo para o Estado, pois tinha anarquizado a matéria colectável da contribuição predial urbana, que não estava em relação com a importância das rendas e mantinha numa importância mais que modesta a soma daquele imposto, dizendo que era urgente modificar um semelhante estado de coisas e formulando os princípios que a tinham orientado no seu trabalho, entre os quais aparecem os seguintes:
1.º 35 necessário estabelecer em prazo de tempo relativamente curto o principio da liberdade contratual; este princípio deve desde já ser adoptado em todos os casos em que não vai contrariar um interesse individual digno de defesa;
2.º É necessário que no período de transição se vá permitindo a elevação gradual das rendas".
23 Vejam-se designadamente as instruções constantes das circulares de 26 do Setembro de 1930 e de 14 de Abril de 1937, publicadas, respectivamente, no Código da Contribuição Predial e Leis Complementares, de Oliveira Coutinho, 2.ª edição, pp. 444 e seguintes, e no Boletim da Direcção Geral das Contribuições e Impostos de 1937, pp. 364 e seguintes.