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5 DE FEVEREIRO DE 1947 470-(39)

a junção do duplicado das guias de depósito com a contestação da acção de despejo baseada em falta de pagamento de renda".
Esta disposição vem alterar e interpretar o regime estabelecido nos artigos 994.º e 996.º do Código de Processo Civil sobre o depósito de rendas. São dois artigos que, juntamente com outros, que se referirão adiante, sobre o depósito do triplo das rendas, estão a adquirir a triste celebridade dos artigos 2.º do Código Comercial e 1236.º do Código Civil. Os debates são já tantos e tão numerosas as questões a que têm dado origem que este facto seria, só por si, razão bastante para se justificar uma remodelação legislativa.
De todas essas dificuldades de interpretação apenas se dirá o suficiente para apreender o sentido do artigo 18.º do projecto.
O artigo 993.º do Código de Processo Civil considerou facultativo o depósito das rendas. Era duvidosa a solução em face do artigo 93.º do decreto n.º 5:411, mas, sendo posteriormente o decreto n.º 22:661, de 13 de Junho de 1933, declarado no artigo 2.º que "nas acções de despejo por falta de pagamento de rendas vencidas posteriormente a 1 de Julho do corrente ano o réu deverá juntar com a impugnação documento comprovativo de ter feito o pagamento ou o depósito no prazo legal, sob pena de aquela não ser admitida e de se haver por confessado o despejo", entendeu-se desde então que o depósito era sempre obrigatório, pelo que não podia o arrendatário remisso defender-se, com fundamento na mora accipiendi, desde que o não tivesse feito.
A situação do arrendatário alterou-se, portanto, com o Código de Processo. Já não precisa hoje de fazer o depósito para invocar falta de culpa no não cumprimento da obrigação. Pode reservar-se para a acção judicial e fazer aí essa prova, o que terá como consequência a improcedência do pedido, não obstante a falta do pagamento de rendas e a falta de depósito.
Mas isto não quer dizer que, num ponto de vista processual, o depósito seja irrelevante. Dele resulta, nos termos do artigo 978.º do Código de Processo, este efeito importante: evita o despejo provisório se vier a ser intentada acção fundada na falta de pagamento de rendas. E isto assim porque, feito o depósito nos oito dias imediatos ao vencimento, cessa a presunção de culpa que sempre incide sobre o devedor remisso. Não é de presumir, na verdade, que, sem motivo justificado, o devedor tivesse deixado de pagar ao senhorio para ir depositar a renda na Caixa Geral de Depósitos. Embora facultativo, não deixa, portanto, o depósito de ter esta importante consequência de ordem processual, além de poder reflectir-se decisivamente na apreciação do fundo da questão.
Veja-se agora o problema da notificação, especialmente visado no artigo 18.º do projecto.
A um depósito facultativo não se compreende que corresponda uma notificação obrigatória. Não precisando o arrendatário, para evitar o despejo definitivo, de depositar a renda, bastando-lhe fazer a prova, na acção, de que se verificou algumas das circunstâncias previstas no artigo 759.º do Código Civil (designadamente, mora accipiendi), parece não fazer sentido que da falta de notificação do depósito, se este tiver sido feito, resultem consequências que atinjam o seu próprio direito. Todavia, o artigo 996.º do Código de Processo dispõe que "o depósito feito em tempo útil impedirá o despejo provisório, independentemente de notificação; mas não impedirá o despejo definitivo se não for notificado". Isto quer dizer, em resumo, que se o arrendatário não fizer o depósito, como este é facultativo, ainda pode evitar o despejo definitivo, provando a mora do credor; mas, se o fizer e o não notificar ao senhorio, sujeita-se necessariamente a sanção de ter de abandonar o prédio, embora tenha tido motivos legais para não pagar a renda. Esta obrigatoriedade da notificação resulta tanto deste artigo 996.º como do artigo 994.º, em que se declara que "efectuado o depósito, deve o arrendatário requerer que o senhorio, sendo certo, seja notificado para o impugnar".
Este pelo menos aparente contra-senso é que tem provocado as primeiras grandes controvérsias sobre a matéria, tanto mais que a lei, estabelecendo tão grave sanção para a falta de notificação do depósito, não diz com clareza até quando ele pode ser requerido. Não interessa agora analisar pormenores, porque eles não são atingidos directamente pelo projecto. O que interessa é a própria obrigatoriedade da notificação, que é expressamente afastada na primeira parte do artigo 18.º
Dadas as considerações produzidas, entende a Câmara Corporativa que deve ser aprovada a nova doutrina. Não deve a questão da notificação ou da falta de notificação do depósito reflectir-se no fundo da acção, como não se reflecte a própria questão do depósito ou da falta de depósito. Estas são questões sempre incidentais que não têm que repercutir-se na decisão final quanto ao despejo. Deve aceitar-se esta doutrina, claro, enquanto se mantiver o sistema do depósito facultativo, sistema, aliás, muito discutível, mas que não está ao presente em causa.
O artigo 18.º acrescenta, porém: "considerando-se equivalente a ela (notificação) a junção do duplicado ou duplicados das guias de depósito com a contestação da acção de despojo baseada em falta de pagamento de renda".
Esta equivalência da junção do documento do deposito à notificação não resulta do Código de Processo. Embora pareça dever deduzir-se tal solução da parte final do artigo 994.º 59, ao permitir-se ao senhorio impugnar o depósito neste caso (não se pode falar rigorosamente em impugnação sem se supor feita uma notificação), é certo que os artigos 978.º e 996.º a contrariam, pois se prevê a suspensão do despejo provisório pela junção com a contestação do documento comprovativo do depósito (artigo 978.º), e, todavia, mesmo nesse caso, se admite que seja decretado o despejo definitivo por falta de notificação (artigo 996.º).
Considera a Câmara Corporativa a solução proposta, sob este último aspecto, preferível. Não é de admitir que, tendo o senhorio conhecimento do depósito através da contestação ou da vista dos documentos, a tempo de o impugnar, possa invocar para qualquer efeito legal a falta de notificação. Seria sobrepor a forma ao fundo da questão.
Mas, se são de aplaudir em si os dois princípios contidos no artigo 18.º do projecto, ambos, um em relação ao outro, parecem contraditórios. Considerando-se, na verdade, a notificação facultativa, afirma-se, por um lado, que a sua falta não produz quaisquer efeitos que possam prejudicar o arrendatário; considerando-se, porém, por outro lado, equivalente a junção de documentos à notificação, afirma-se implicitamente que alguns efeitos sempre dela derivam. Se a junção de documentos, na verdade, equivale à notificação, é porque há efeitos que lhes são comuns. Quais?
Viu-se acima que, embora facultativo o depósito, dele sempre resultam alguns efeitos de ordem processual. Verificar-se-á agora o mesmo?

59 Artigo 994.º: "... Efectuado o depósito, deve o arrendatário requerer que o senhorio, sendo certo, seja notificado para o impugnar, salvo se já tiver sido cifrfido para a acção de despejo e ainda não tiver oferecido a contestação. Neste ultimo caso, junto o documento do depósito com a contestação. o senhorio poderá impugnar o depósito na resposta".