470-(8) DIÁRIO DAS SESSÕES - N.º 83
a sua opinião de que devem, em qualquer caso ser abolidos os prazos de caducidade dos §§ 6.º e 8.º referidos.
8. Consentimento dos comproprietários. - Prescreve o artigo 5.º do decreto n.º 5:411 que o comproprietário do prédio indiviso não pode dá-lo de arrendamento sem consentimento dos outros proprietários. E a doutrina que já se encontrava formulada no artigo 1598.º do Código Civil. Embora, pois, cada consorte tenha, em princípio, o uso e a administração da coisa (Código Civil, artigo 3179.º e n.º 1.º do artigo 1270.º), é-lhe coarctado o direito de arrendar o prédio indiviso.
Mais do que na vigência do Código, há motivos hoje para manter essa incapacidade ou inabilidade. Trata-se de um acto que, embora no rigor dos princípios caiba no conceito de acto de administração, traz consigo consequências graves, quer pela renovação do contrato, que pode verificar-se contra a vontade, do senhorio, quer pela impossibilidade que gera para todos os consortes de exercerem o direito de uso que a lei igualmente lhes confere durante o prazo do arrendamento.
É, assim, uma solução que se impõe, mas que pode acarretar consequências graves, estando os nossos tribunais cheios de casos de injustiças flagrantes. Não se referem apenas as possíveis fraudes ou expedientes dos senhorios, destinados a evitar a aplicação dos princípios legais que disciplinam o contrato, quando haja um condomínio, fazendo intervir intencionalmente no arrendamento apenas um ou alguns dos consortes; referem-se também aqueles casos em que os comproprietários que não autorizaram o contrato estão durante muito tempo a perceber as suas quotas nas rendas, para depois aparecerem a pedir a anulação do acto com o fundamento na falta de autorização.
É por isso feliz a doutrina do artigo 2.º do projecto, que corresponde, de resto, a uma tendência já marcada da jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, considerando autorizado o contrato desde que os não intervenientes manifestem por qualquer modo o seu acordo ao arrendamento.
É de fazer, porém, uma modificação no texto. A referência especial ao recebimento de uma quota-parte das rendas é perigosa, porque em alguns casos esse recebimento não tem o significado que sempre lhe ficaria a ser atribuído. E que pode acontecer que o comproprietário receba rendimentos em globo, entregues pelo consorte administrador, sem conhecer especificadamente a sua origem e sem saber, portanto, que foi celebrado um contrato de arrendamento de certo prédio. E por isso mais conveniente não fazer referência em especial a esse facto, tanto mais que ele está indiscutivelmente contido na generalidade da condição exigida em último lugar - manifestar o consorte por qualquer modo a sua adesão ao arrendamento.
Mas qual a amplitude deste preceito?
Não há dúvida que se aplica aos arrendamentos verbais. Mas, quanto aos constantes de documento particular, podem já começar as hesitações desde que se proclama no projecto que não é permitida nenhuma alteração no contrato escrito que não seja feita por documento de igual força. É de notar que, em face da lei vigente, a grande dificuldade que a doutrina tem encontrado para admitir precisamente a solução proposta é a de a lei exigir um documento escrito, incompatível com manifestações tácitas de consentimento, e pode julgar-se que este artigo 2.º do projecto contém apenas uma aplicação ou prolongamento da doutrina do artigo 1.º (admissibilidade de arrendamentos verbais), devendo, portanto, deixar de se aplicar se o arrendamento tiver sido reduzido a escrito.
Não é esta, evidentemente, a boa doutrina. Sendo o contrato nulo por falta de intervenção de todos os consortes, não há que aplicar o § 4.º do artigo 1.º do projecto; há que considerar o arrendamento como se não existisse escrito nenhum, e portanto susceptível de um arrendamento tácito. Mas isto é o que parece dever ser, o que não quer dizer que a lei o não deva declarar expressamente.
É mais grave a questão quando o arrendamento conste de escritura pública. Se os contraentes celebraram por esta forma o acto voluntariamente, isto é, nos casos em que a escritura não é obrigatória, impõe-se doutrina idêntica. Os motivos são ainda os mesmos. Mas quando a escritura é obrigatória?
Numa solução rigorosamente jurídica o assentimento de um consorte, posterior ao contrato, dado tacitamente, ou mesmo expressamente, deve considerar-se irrelevante se não constar de documento de igual força. É que, destinando-se a escritura a assegurar e a autenticar o consentimento, deve ser exigida em relação a todos os consortes, e não apenas em relação a um ou alguns 14.
Este rigor deve, porém, ceder num caso: no dos arrendamentos sujeitos a registo. Assim como, pelo princípio da redução dos negócios jurídicos, quando não existe escritura, se entende que o contrato é válido, ficando apenas sujeito ao prazo de seis meses, também deve dar-se a mesma relevância ao assentimento do consorte. O contrato será válido, mas não pode considerar-se senão como eficaz, em princípio, dentro do mesmo prazo de seis meses.
Em harmonia com esta sugestão se redige o artigo 5.º do texto adiante apresentado.
CAPITULO II
Caducidade do arrendamento
9. Arrendamentos feitos pelo usufrutuário. - A publicação da lei n.º 1:662 veio suscitar, quanto aos arrendamentos feitos pelos usufrutuários durante a pendência do usufruto, uma questão. O artigo 5.º desse diploma não permite que sejam intentadas acções de despejo de prédios urbanos, seja qual for o seu destino ou aplicação, salvo as excepções previstas nesse mesmo artigo. Ora, em nenhum dos seus parágrafos se prevê como fundamento da acção o termo do usufruto. Ter-se-ia pretendido revogar o artigo 9.º do decreto n.º 5:411 e o artigo 2197.º do Código Civil? 15. A doutrina mostra-se hesitante, mas os tribunais têm decidido no sentido negativo, distinguindo entre as acções de despejo propriamente ditas e as acções tendentes a obter a caducidade do arrendamento. Só às primeiras se refere a lei n.º 1:662, pelo que se mantêm os princípios de caducidade previstos em leis anteriores. É esta a solução adoptada no artigo 3.º do projecto. Terminado o usufruto, portanto, o arrendamento caduca e o proprietário pode reivindicar o prédio.
É esta, num ponto de vista jurídico e lógico, a melhor doutrina. A figura do usufruto é ainda, no nosso direito, não obstante se afastar já muito da sua tradição romanista de mera pensão alimentar, a de um jus in re aliena. O usufrutuário não goza senão temporariamente do uso e da fruição da coisa. Pode, nestas condições, arrendar o prédio, percebendo os respectivos
14 No projecto Pinto Loureiro expressamente se diz, em relação aos comproprietários, que a manifestação do consentimento há-de revestir a forma exigida para a celebração do contrato (artigo 8.º, § único).
13 Artigo 9.º do decreto n.º 5:413: "Os administradores dos bens dotais e os usufrutuários ou fideicomissários não podem dar de arrendamento, por tempo que exceda a sua administração, usufruto ou fideicomisso".