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544 DIÁRIO DAS SESSÕES - N.º 88

Ao ingressarem no quadro respectivo, antes do estado judiciário vigente, os conservadores sabiam que estavam sujeitos às substituições, que, aliás, deviam ser remuneradas quando excedessem três meses, como em tempos acontecia.
Mas o que não podiam supor é que haviam de ser feitos membros natos dos colectivos.
Os casos aqui revelados pelo Sr. Dr. Ernesto Subtil - que só poderia ter conhecimento dos mesmos por inconfidência - mostram alguns inconvenientes de, a título normal, organizar os tribunais com juizes togados e com juizes improvisados.
No Porto - a comarca que melhor conheço, pois aí advogo - a reforma dos colectivos cíveis operada por aquele estatuto nem sequer podo explicar-se por razões de economia.
Havia dois tribunais colectivos, constituídos com os juizes das seis varas. O chamamento dos conservadores permitiu formar três colectivos. No entanto, não se tem observado o aceleramento dos julgamentos, que, quando adiados - e os adiamentos atingem números que assombram, pois sendo, em regra, de dois, por vezes há três, quatro, cinco, seis, sete e mais! -, são marcados para daí a um, dois, três ou quatro meses.
Para tais adiamentos contribui muito a falta dos conservadores. Ou por estarem impedidos noutros julgamentos, que continuam além do período do seu serviço em corto tribunal, ou por outro motivo, é frequente os dois magistrados aguardarem a chegada do conservador.
Fazem-se, por vezes, tentativas baldadas para o encontrar. Mandam-se recados. Funciona o telefone. Se algum litigante solícito e empenhado em que o julgamento se efectue vai buscá-lo de automóvel ainda o tribunal se constitui. Se não há a felicidade de trazer o conservador, telefona-se para a Relação, a fim de ser designado outro.
Novas horas de espera. O indicado, se aparece, não raro pede vista do processo, para se habilitar a decidi-lo. E, se não usar de tal faculdade, com todas essas peripécias um julgamento marcado para as 12 horas começa às 16 ou 17, fazendo-se um simulacro de iniciação com a exposição do artigo 653.°, alínea a), do Código e, quando muito, o depoimento de uma testemunha.
A reforma de 1945 manteve os tribunais colectivos, isto é, a oralidade.
Esta tem tradições no nosso processo criminal, como as tinha no comercial, mas estava ligada à existência do júri. Extinto este, deveria também desaparecer.
Subsiste, porém, o contra-senso de os crimes mais graves serem decididos em colectivo sem depoimentos escritos, enquanto dos crimes menos graves o julgamento pode, se a acusação ou a defesa o quiserem, ser escrito, com apreciação da prova pela 2.ª instância.
A minha posição relativamente à oralidade continua a ser a que, como a quase totalidade dos advogados, assumi-a de inimigo irreconciliável.
E não compreendo como, ao mesmo tempo que se fazem economias drásticas nos serviços de justiça, no nosso Pais existam nada menos de quatro tribunais de revista, sem falar nas Relações ultramarinas. De facto, além do Supremo Tribunal de Justiça, as nossas Relações só por grande excepção funcionam como tribunais de prova. Nestas circunstâncias, a manter-se a oralidade, a 2.ª instância devia desaparecer, caso não se permitisse a repetição da prova ou se criasse outra forma de tornar possível a apreciação dos depoimentos à 2.a instância.
Mas eu, receando embora que esta opinião possa ser julgada pelo nosso distinto colega e douto magistrado Sr. Dr. Armando Cândido "um indefensável retrocesso", ouso afirmar que a oralidade é um mal.

O Sr. Armando Cândido: - Defendo a oralidade, sim. Evidentemente que não posso, num breve aparte, dizer as razões por que a defendo, entre as quais avultam, necessàriamente, as derivadas dos abusos cometidos com os depoimentos escritos. De resto, os argumentos estão produzidos e alinhados. Desejo só lembrar a V. Ex.ª isto: a medida não está só na lei processual; está acompanhada de uma condição, de uma exigência - a do juiz capaz. E neste ponto muito se tem feito em Portugal.

O Orador: - Não pretendo negar a competência da maioria dos nossos magistrados; o que sustento é que os próprios juizes muito capazes podem constituir tribunais colectivos que cometam erros judiciários irreparáveis.
A regra é a comarca de província, em que vem um juiz de outra comarca completar o colectivo. E pergunto se é defensável que um juiz durante dois, três e até dez dias no mês - senão vinte - esteja ausente da sua comarca para julgamentos demorados noutra.
Actualmente o magistrado judicial é mais juiz de fora que do comarca.

O Sr. Armando Cândido: - Mas isso é outro problema: o da constituição dos tribunais colectivos.

O Orador: - Eu aprecio o caso tal como ele se dá presentemente. Se não fora a oralidade, não haveria essas andanças de juizes.
Nem todas as doutrinas inovadoras são aceitáveis. Cada povo deve aproveitar os ensinamentos teóricos que se mostram adaptáveis ao meio ambiente e que são benéficos.
As teorias de Carneluti, Chiovenda, Willougby e outros processualistas não podem ser executadas urbi et orbi, como se fossem dogmas de fé.
Ora o principal defeito do grande reformador Dr. Manuel Rodrigues - cuja obra é imorredoura - consistia em ser intransigente em questões de princípios, sem considerar a sua adaptabilidade ao nosso País.
Recordo o que aconteceu com os votos de vencido. Teoricamente, o julgado unânime impõe-se com mais autoridade.
Porém, na prática verifica-se que é impossível apagar as divergências na decisão de um tribunal colectivo. Se o relator fica vencido, tal facto transparece da redacção do aresto.
A própria lei, que proibia - e em alguns casos continua a proibir- a declaração de voto, se encarregava de a denunciar.
Quando num assento do Supremo intervinha o presidente, sabia-se que houvera empate, e apenas se desconhecia quais os juizes que tinham votado numa ou noutra orientação.
Ainda hoje o vencimento do presidente de um tribunal colectivo criminal é palpável.
Eu entendo que as declarações de voto deviam ser permitidas em todos os casos, não só para elucidação do tribunal superior como também porque, se os juizes da maioria soubessem que o vencido faria tal declaração, porventura arrepiariam caminho.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Já nas Relações e no Supremo são possíveis declarações de voto.
O pretenso dogma de unanimidade aparente ruiu.
Infelizmente, porém, continuamos a viver sob a ditadura da, oralidade, deusa em cujo altar se sacrificam tantos ë tantos direitos. É o sistema bate-boca, a que alude o relatório do Código de Processo Civil brasileiro.