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22 DE FEVEREIRO DE 1947 587

respeito. Será conveniente: Não será? É outro ponto digno de reflexão.
Além disto, é preciso considerar que a protecção ao cinema nacional não deve revestir-se do carácter de um monopólio, paru beneficiar uma produção em prejuízo de outra. Ambas têm a sua, posição, que ao Estado interessa manter, embora a do cinema -
nacional tenha o direito a especial atenção.
Depois fala-se no decreto na divulgação do cinema, nas possibilidades que o cinema tem de pagar altas percentagens nas receitas dos espectáculos.
Não sei se os números estão certos, porque não tive possibilidade de os controlar, mas se estão verifica-se que há cinemas que têm sentido, uma depressão enorme no que diz respeito às suas receitas. Diz-se numa dessas exposições, por exemplo, que o -
número de cinemas não tem aumentado, que este decreto deu já lugar a que fechasse uma firma distribuidora e que é alarmante a situação de alguns desses cinemas recentemente construídos, havendo-os que não chegam a render 2 por cento líquidos ao capital empregado. Será assim?
Outro ponto em que aqui se fala é na dobragem. Nada sei de dobragem, pois nada conheço da técnica cinematográfica, e pela frequência a espectáculos desses nada posso dizer também, porque frequento pouco os cinemas, visto que de ordinário saio de lá, com raras excepções, mais contrariado com o que vi e ouvi do que edificado, nada ou muito pouco trazendo para a vida em satisfação ou entretenimento do espírito que me seja útil ou agradável, como legítimo seria de esperar de uma arte soberba, magnífica quando divulga o que é belo e eleva e educa e distrai dignamente, mas perigosa quando serve para divulgar o que é nefasto.
Portanto, não sei bem como para a dobragem possa ter tão grande importância ser ou não ser em língua portuguesa.
Confesso que nos meios pouco cultos, como acontece em certos meios provincianos, o que vale ao espectador são as legendas ou a dobragem em português. Considera-se a dobragem em língua portuguesa o maior inimigo da produção nacional e que se impõe a defesa do património linguístico. Vozes, aliás não desinteressadas, é claro, citam-nos exemplos de fora em sentido contrário.
Nós encontramo-nos sob uma avalanche de filmes norte-americanos que invadem os nossos cinemas numa percentagem de 80 por cento e que são, na verdade, néon mais nem menos do que uma verdadeira desnacionalização para nós, porque são tanta vez a adulteração do nosso carácter, do nosso modo de sentir, da nossa própria dignidade, das nossas tradições familiares, das nossas tradições religiosas e sociais, e que representam uma porta aberta para perigos que atingem as crianças, os jovens e os próprios adultos, enfim, toda a gente que ali encontra elementos próprios para se perverter, com emoções graves para as crianças, como já foi constatado em inquéritos feitos, despertando precocemente nos sentidos tudo o que de perigoso eles contêm, em impressões que mão são fugazes, porque permanecem e estimulam doentias curiosidades como a daquela criança que se lastimava à mãe por ter chegado, tarde ao cinema e não ter visto uma parte do filme em que se 'fazia referência ao nascimento de um bebé. Então perguntava ela insistentemente à mãe como era isso, ao que a mãe nada podia responder. A criança, assim perturbada, tinha uns 12 anos, e era uma rapariga!
Todos sabemos que a criança é naturalmente curiosa e deseja ser informada de tudo o que a impressione, da tudo quanto vê.
Todavia, continua letra morta a lei, que aqui foi aprovada, de protecção aos menores, proibindo-lhes a assistência a espectáculos cinematográficos até uma certa idade.
Não se regulamentou ainda a lei, o que permite portanto que as crianças continuem a ir ao cinema.
O nosso ilustre colega Dr. Manuel Múrias disse-nos ontem ser coisa difícil evitar a ida das crianças ao cinema, por meio desse regulamento, por ser pouco prática a verificação da sua idade.

O Sr. Carlos Borges: - Já há alguns cinemas em Portugal onde as crianças não entram.

O Orador:- Talvez; mas o que verifico, sobretudo nos cinemas populares, é justamente o contrário.
Não me parece que seja de impossível prática tal regulamentação.
A própria juventude se (perverte de uma maneira extraordinária nesses espectáculos.
É um problema grave para o futuro da nossa gente.
Numa nota que aqui tenho a respeito de um inquérito feito aos filmes americanos, lêem-se os seguintes números: de 632 filmes que foram inspeccionados, 113 representavam atentados contra o pudor, 117 giravam à volta de adultérios, 38 faziam a apologia do divórcio, 172 eram bazares de modas indecentes e 192 respeitavam a flirts descarados e inconvenientes.
A conclusão deste inquérito é deveras significativa.
Isto para não falar de outros, como o de um professor de Praga a respeito dos filmes que percorreram a Europa em 1935.
E «notem V. Ex.ªs: não é um português, amante da sua tradição católica e religioso, que fala naquele inquérito. É um jornal americano, do próprio país que tanto tem enriquecido com a sua produção cinematográfica, o New World, que nos trouxe há tempos essa preciosa elucidação.
Isto é porventura cinema educativo?
Mas é claro que o prejuízo que isto representa para as crianças que vão ao cinema é enorme, para as crianças e para os adolescentes e jovens, e sobretudo para estes, pois nestas idades o perigo é maior, por poder traduzir-se na deformação do carácter. Eu bem sei que a culpa pertence em primeiro lugar aos pais. Já ontem se disse isso aqui, e realmente os pais deveriam ser os principais polícias para vigiar os filhos e impedi-los de se perverterem. Não se preocupam com isso, até os próprios, católicos, apesar das elucidações do secretariado de cinema e rádio da Acção Católica.
E sob o ponto de vista da saúde pública o problema também é de ponderar. Estão aqui presentes ilustres médicos que podem confirmá-lo; lembro-me neste momento de um médico italiano, o Dr. Fábio Peunachi, que afirma que a tuberculose tem no cinema vasto campo para proliferar.

O Sr. Carlos Borges: - Isso seria motivo para se restringir o cinema, e não para o valorizar e proteger, como V. Ex.ª pretende. Parece que V. Ex.ª está sendo contraditório.

O Orador: - Pelo contrário. O que é preciso é valorizá-lo num sentido - educativo. Mas há um outro aspecto que não se pode perder de vista, a respeito do esquecimento em que jaz a lei aqui votada - o da nossa soberania, que está em causa.
Depois de larga discussão, com tanta cópia de argumentos a seu favor, publicou-se, depois de aprovado pela Assembleia, uma diploma como esse, tão digno, tão notável e tão elevado nas suas bases e motivos que o inspiraram, e afinal é letra morta no País. Faço daqui, acompanhando o ilustre Deputado que me antecedeu, unia exortação ao ilustre e jovem Ministro da Educação