866 DIÁRIO DAS SESSÕES - N.º 103
passo que os suínos do distrito representam apenas cerca de 10 por cento da população porcina do País.
No entanto este distrito produz 35 a 42 por cento do grão de bico do País; 28 a 29 por cento da fava; 31 a 34 por cento da aveia; 26 a 27 por cento da cevada; 10 a 12 por cento do azeite, etc. Mas não só estas culturas e produções, que de facto são as dominantes, têm uma grande importância para a economia da região e do País, mas muitas outras há que, sendo representadas por pequenas percentagens da produção total, têm um grande valor económico, e social para a região no complexo das suas actividades. Ë o caso da cultura da vinha.
A produção de vinho do distrito de Beja foi representada, em média, no quadriénio de 1935-1938 por 37:192 hectolitros, ou 0,52 por cento da produção do País, mas já em 1942 baixou a produção para 30:365 hectolitros, ou 0,36 por cento da produção total. Pode parecer à primeira vista que uma tão diminuta produção não deve ter importância na economia do distrito, mas é necessário não esquecer que no distrito de Beja, como em todo o Alentejo, a cultura da vinha não está generalizada, como o dos cereais e legumes de sequeiro, mas sim concentrada em determinadas zonas, principalmente na região dos terrenos argilo-calcários e seus derivados, e em menor escala em terrenos do mioceno e plioceno e em manchas de saibros graníticos, como na Vidigueira, Vila de Frades e poucas mais.
O Sr. Cincinato da Costa: - Dê-me V. Ex.ª licença para uma pequena interrupção.Não sei se V. Ex.ª conhece - conhece com certeza - um trabalho de Rebelo da Silva denominado Memória sobre a população e a agricultura de Portugal, onde se lê o seguinte: «No Alentejo, os vinhos de Évora, do que se estimavam muito os de Peramanca, os brancos de Beja, os palhetes de Alvito, de Viana, de Vila de Frades e das Alcáçovas, competiam com os de Alcochete e Caparica, apreciados pelos paladares mais delicados de Flandres, e com os do Lavradio, Seixal, Barreiro e Alhos Vedros, não menos procurados do que hoje».
Isto certamente deve agradar a V. Ex.ª
O Orador: - Eu agradeço a V. Ex.ª o seu esclarecimento e ele só vem corroborar o que vou dizer.
De facto, o Alentejo produz vinhos que não há «Porto» melhor do que eles, além de outros tipos de vinhos de pasto semelhantes aos melhores das regiões demarcadas. E tudo uma questão de fabrico.
Ainda há pouco tempo, numa visita feita pelo Sr. Subsecretário de Estado da Agricultura a Serpa, eu fiz notar a S. Ex.ª que o vinho que ali nos foi servido em casa do Sr. engenheiro Fernandes de Oliveira era uma verdadeira especialidade. Este vinho era da Herdade da Charneca, do concelho de Serpa.
Algumas destas manchas vitícolas tiveram uma grande importância há mais de sessenta anos, antes da destruição dos vinhedos de pé franco pela filoxera e mesmo depois da sua reconstituição com videiras americanas, como porta-enxertos. A cultura da vinha principalmente se deve a divisão de grandes propriedades e a colonização de vastas regiões do Alentejo e do distrito de Beja, e, de entre outras, de Oeste para Leste, citarei, além da vinha recente de Conqueiros, as de Montes Velhos e outras, no concelho de Aljustrel; Gasparões, Mancoca, Abegoaria e outras, no concelho de Ferreira, zonas vitícolas ainda hoje de uma certa importância; Vidigueira e Vila de Frades, zona também ainda hoje de muita importância; Beringel, Santiago e a maior parte da freguesia das Neves, no concelho de Beja, ainda hoje de uma certa importância, algumas zonas do concelho de Serpa, como Brinches, Pias (onde existe, além de outras, uma vinha de 200:000 pés armada em arames) e diversas zonas do concelho de Moura, sendo a principal a de Amareleja.
Em todas estas zonas foram muitas as herdades divididas em courelas e aforadas ou vendidas para plantações de vinhas. E onde hoje já não existem vinhas estão criados óptimos olivais, e tanto o parcelamento dos latifúndios como a colonização de muitas destas zonas, e principalmente a criação dos olivais não teria sido possível se não fosse a cultura da vinha.
Ainda hoje, ou pouco antes da restrição do plantio, muitas vinhas que se plantaram tiveram como principal objectivo a criação de olivais, o que não teria sido possível, como se disse, sem a protecção e concurso desta cultura.
Em todas estas zonas vitícolas a cultura da vinha tem importância não só económica mas também, e principalmente, social.
Antes da restrição da plantação eram raras, nestas freguesias, as crises de trabalho, e quando as havia eram de pequena importância e de pouca duração. O granjeio ou tratamento das vinhas e as novas plantações, embora pequenas, mas que todos os anos se faziam, empregavam muitos braços em quase todas as épocas do ano e principalmente naquelas em que os trabalhadores eram menos precisos para os trabalhos mais importantes da cultura cerealífera e da apanha da azeitona, que, além da vinha, são as culturas que empregam maior número de braços.
Depois de começarem as restrições do plantio e as dificuldades de vária ordem para a reconstituição das vinhas decadentes as crises de trabalho são permanentes, a não ser nas épocas das colheitas dos cereais e da azeitona, o que causa enormes prejuízos às classes rurais e a todas as outras classes que com elas têm ligação de interesses e produz perturbações de ordem social, que só tem sido possível remediar, em parte, com a abertura de trabalhos públicos.
Nesta altura assumiu a Presidência da Mesa na Assembleia o Sr. Deputado Paulo Cancela de Abreu,
O Sr. Franco Frazão: - No Alentejo tem sido autorizado o plantio da vinha, mas só em determinadas condições, especialmente quando se destina à colonização.
Ainda ultimamente foi dada uma licença u Junta de Colonização Interna para o plantio de 400:000 pés de vinha.
O Orador: - O que eu garanto a V. Ex.ª é que há casos em que o plantio era de toda a justiça que fosse autorizado, e não o foi. Defeito da lei? Má interpretação dela? Não o sei, mas o que é certo é que esse ponto da lei necessita de ser esclarecido, para não admitir dúvidas.
O Sr. Franco Frazão: - Esses casos não serão anteriores a 1944?
O Orador: - É possível que sim, mas não o posso afirmar a V. Ex.ª O que sei é que eles se deram durante a guerra.
As vinhas têm diminuído e tem baixado as produções, devido ao envelhecimento das cepas existentes e desânimo no seu tratamento, e, por este andar, dentro de algumas dezenas de anos o Alentejo estará sem vinhas se não se derem a estas regiões facilidades para a reconstituição dos vinhedos e plantação de novos, porque muitos dos velhos nem são reconstituíveis, porque o terreno está já dominado pelas oliveiras que nas vinhas foram plantadas. Dir-me-ão que o decreto-lei n.° 33:544