15 DE MARÇO DE 1947 867
e outra legislação subsequente permitem já a plantação até 20:000 pés. Mas as condições em que é permitida essa plantação exclui praticamente o Alentejo, visto que os números e alíneas do artigo 6.° deste decreto-lei só permitem esta plantação «em terrenos apropriados para vinhos de qualidade, em terrenos em que outras culturas não tenham possibilidades económicas de exploração, devido às inundações frequentes ou sujeitos a erosão». Ora, como estas zonas vitícolas do Alentejo não são consideradas produtoras de vinhos de qualidade (apesar de produzirem muito bons vinhos, quando bem fabricados), não estão demarcadas nem são inundáveis, estão fora do âmbito da legislação em vigor e, portanto, não se podem plantar novas vinhas. Por isso, a lei parece que foi feita só para permitir a plantação de vinhas no Ribatejo.
Outro aspecto grave da diminuição das vinhas no Alentejo é a inutilização forçada do material e instalações vinícolas, o que ainda representa muitas centenas de milhares de escudos de prejuízo para o património e economia da região. Como é sabido, a maior parte das adegas alentejanas estão equipadas com talhas de barro e, modernamente, de cimento e com depósitos de cimento armado fixos, porque, apesar de todas as barbaridades que se têm dito e escrito contra a talha, ela é ainda o recipiente ideal para a fermentação dos vinhos nas regiões quentes, como o Alentejo, e este material, acabadas as vinhas, não pode ter outra aplicação económica.
Além de tudo isto, representando a produção vinícola do distrito de Beja apenas 0,3 a 0,5 por cento da produção do País, conforme os anos, que influência pode esta produção ter na crise vinícola, no sentido de a agravar, mesmo que as vinhas do Alentejo duplicassem ou triplicassem? No entanto, o aumento desta cultura auxiliaria grandemente a resolução do problema social das crises de trabalho em muitas regiões. E preciso não esquecer que o Alentejo também é Portugal.
O que não se justifica, Sr. Presidente, é que se tenham dado facilidades para largas plantações nas zonas inundáveis do Tejo, onde, apesar dos prejuízos das cheias, chegam os terrenos inundáveis a ser arrendados só para as culturas de primavera e verão (melão, tomate, cânhamo, milho, etc.) por 6 a 8 contos cada hectare, o que representa a renda de uma herdade no Alentejo, com a agravante de a vinha nestes terrenos produzir cinco a seis vezes mais, pelo menos, do que nos do Alentejo, e, portanto, o alargamento desta cultura nestes terrenos contribui grandemente para o agravamento da crise vinícola quando vier outra série de anos de grandes produções.
Tenho aqui presente a produção de uma tias boas vinhas da Vidigueira, com 36 milheiros de cepas, que em catorze anos deu uma média de 14:883 quilograma de uva por ano, ou uma média por milheiro de 413 quilogramas. Mas muitas vinhas, mesmo regulares, noutras regiões do Alentejo nem esta produção atingem, podendo afirmar-se que a produção média por milheiro não vai além de 300 a 400 quilogramas de uva ou, em vinho, cerca de 2 a 2,5 pipas por hectare. No Ribatejo a produção é, pelo menos, cinco vezes mais, pois, segundo me informam, não são raras as produções de 10 a 12 pipas por hectare. Estas produções e as dezenas de milhares de cepas que nos últimos anos se têm plantado nesta região é que constituem um perigo para o agravamento da crise de superprodução nos anos de boas colheitas, e não as fracas produções das escassas vinhas do Alentejo.
Uma outra disposição da lei com a qual também não concordo é a que autoriza a plantação «lê vinha na lezíria para fixar terrenos erosionáveis, pois que, sendo o terreno da vinha cavado todos os anos, a mobilização
do solo facilita a erosão, em lugar de a dificultar. Sempre ouvi preconizar contra a erosão plantas com grande raizame, que invade todo o terreno e dispensa a sua mobilização, mas não a vinha, que nem tem grande raizame superficial nem dispensa uma mobilização cuidada do terreno.
Compreenderia que se preconizasse nestes terrenos a cultura do choupo, que é de rápido crescimento, dispensa a mobilização do terreno e dá em poucos anos uma grande massa de madeira óptima para papel e fabrico da celulose, hoje de tão larga aplicação em variadíssimas indústrias.
Compreenderia ainda, até mesmo, a obrigatoriedade de plantar estes terrenos destas ou de outras árvores florestais de rápido crescimento, como o eucalipto, mas não de vinha, tanto mais que, sendo os terrenos inundáveis e as vinhas de grande produção, os vinhos devem ser fracos, o que também é contrário à política seguida ultimamente de protecção aos vinhos de qualidade. E o relatório da Câmara Corporativa que o diz a p. 630-(3) do Diário das Sessões:
Há outros vinhos baixos, de terrenos alagadiços de frescos na época da maturação das uvas, que são aquosos, deslavados, não raro com menos de 8 graus de força, alcoólica, verdadeira água-pé, sem qualidades que os recomendem, e o mesmo se dá com certas castas cujos mostos são natural e normalmente aquosos, dando vinhos chilros.
Tudo quanto seja conducente ao aumento da produção de tais vinhos deve ser condenado, para que esses produtos não vá o fazer luta desleal, em concorrência, no mercado, com os vinhos de qualidade.
O parecer da Câmara Corporativa nem mesmo admito a hipótese de estes vinhos serem necessários para, lotes quando diz:
Essa necessidade já referida de vinhos ligeiros para lotações não é bastante para se recomendar ou para se autorizar a plantação de vinhas criadoras de tais produtos, pois já os temos no País muito próprios para isso, vinhos de baixa graduação, mas bons, qualificados, em abundância.
Por todas estas razões, desejava, Sr. Presidente, e isso tem sido apresentado várias vezes a membros do Governo em várias representações da lavoura do Sul, que se facilitasse mais do que até aqui a reconstituição das vinhas do Alentejo e a plantação de novas, ficando consignado ou em bases que agora a Câmara venha a aprovar ou em novo diploma a publicar, quando for revista e actualizada a legislação sobre a plantação d« vinhas, o seguinte voto ou disposição:
«É permitida a plantação de vinha até 20:000 pés. mesmo nas regiões do Alentejo não demarcadas como produtoras de vinhos de qualidade, desde que nelas seja tradicional a cultura da vinha ou necessária para facilitar o parcelamento da grande propriedade e a colonização».
Tenho dito.
ozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi cumprimentado.
O Sr. Proença Duarte: - Sr. Presidente e Srs. Deputados: o decreto-lei n.° 36:038 propunha-se, a meu ver, essencialmente dois objectivos: primeiro, regularizar a situação de certa e determinada plantação de vinhas que tenham sido introduzidas contrariamente a preceitos legais; segundo, fazer um novo condicionamento da plantação de vinha.