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348 DIÁRIO DAS SESSÕES - N.º 136

conceitos ideológicos e partidários não lhes permitem a visão clara da realidade.
É ainda cedo. É preciso que as gerações passem, porque nesta data tão próxima ainda está na nossa carne e no nosso sangue o eco das lutas e das paixões.
E preciso que esta data se afaste para se poder ver com serenidade e reflexão.
(E eu tenho a certeza, porque acredito na justiça da história, eu tenho a certeza, porque acredito no futuro da Revolução e no futuro da Pátria, que as gerações do futuro nos hão-de fazer justiça, e a data do 28 de Maio há-de ser inscrita com imperativo nacional nas páginas de ouro da nossa história.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Botelho Moniz: -Sr. Presidente: não era meu intento ocupar a atenção da Assembleia com intervenções neste debate acerca de feriados nacionais. Mas os discursos dos nossos ilustres colegas Dr. Paulo Cancela de Abreu, Dr. Albano Magalhães e Dr. Cerqueira Gomes obrigam-me a dizer algumas palavras.
Farei quanto em mim caiba para que sejam muito calmas e muito breves.
Talvez porque sou um combatente isento de ódios, sinto-me sempre animado pelo mais largo espírito de tolerância. Por isso compreendo perfeitamente a atitude desses nossos ilustres colegas.
Por exemplo, em relação ao antigo Deputado monárquico Sr. Dr. Paulo Cancela de Abreu faço a justiça de afirmar que ele, antes do 28 de Maio de 1926, nesta mesma sala, pronunciou contra o regime republicano palavras ainda mais violentas e, nesse tempo, muito mais corajosas.

O Sr. Paulo Cancela de Abreu: - Apoiado!

O Orador: - O meu espírito é tolerante por ser patriòticamente republicano. Não discuto o direito que S. Ex.ª tem de enunciar aqui, com deduções brilhantes, a sua acusação cerrada contra o 31 de Janeiro.
Só peço licença para me servir precisamente das mesmas fontes e das mesmas informações para acudir em sua defesa.
Não simpatizo muito com o número 31. Aceito que outrem não goste.
Mas será conveniente evitar um trinta e um maior...
Foi o 31 de Janeiro movimento nacional? Não foi movimento nacional? Constituiu revolta de um partido? Ia mais longe e buscava destruir um regime? Desejava-se que o eco de uma afronta fosse sinal de ressurgir?
Suponho não valer a pena discutir este ponto. Para mim é um feriado nacional decretado pela Constituinte de 1911. Para mim, que aprendi a ser republicano com o grande mestre que foi Sidónio Pais, é um feriado votado por Sidónio Pais, o homem cujo espírito tolerante permitiu que republicanos e monárquicos colaborassem num grande movimento-nacional.
E quando contra a República nascida em 1910 se fazem acusações cerradas, algumas justas se se dirigem aos homens, e não ao regime, permito-me defender o regime, quando mais não seja porque ele tornou possível o 28 de Maio.
Disse-se, em relação ao 31 de Janeiro, na argumentação do Sr. Dr. Cancela de Abreu, tratar-se de movimento que o próprio Directório do Partido Republicano Português de então considerou extemporâneo. Não importa esse desdém dos não combatentes; a fraqueza dos homens é muito grande.
Lastimemos que nem sempre tenham sido coerentes, ou não soubessem defender, como lhes cumpria, os vencidos. Misérias da política, que tornam ainda mais respeitáveis esses vencidos. Em contrapartida, encontramos no movimento de 31 de Janeiro alguma coisa que é perfeitamente portuguesa, perfeitamente nacional, perfeitamente digna da nossa veneração. Refiro-me à atitude que S. Ex.ª citou dos oficiais que, ao verem partir soldados humildes para a aventura, sabendo que eles a breve trecho iam ser vencidos, deram a Portugal um exemplo sublime de sacrifício, juntando-se a homens de antemão derrotados e assumindo o seu comando. È esse espírito de sacrifício que sobretudo eu admiro no 31 de Janeiro. É essa abnegação heróica, tão portuguesa e tão idealista, que paira mais alto que todos os partidos. Está acima do Directório Republicano e acima daqueles vultos monárquicos que S. Ex.ª aqui recordou. Estes últimos, no complexo de inferioridade em que viviam, não encontraram para defesa da existência da monarquia senão este tristíssimo argumento: «Se houver uma revolução republicana em Portugal, no dia seguinte teremos quarenta mil soldados espanhóis na fronteira!».
Não era o ideal monárquico, não era a força de doutrina, não era o amor ao Rei que os animava na defesa verbal das instituições!
Era apenas isto: o medo da trombeta castelhana.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Ora o som da trombeta castelhana, horrendo, fero, ingente e temeroso, de que fala o nosso Camões, nem sempre assustou os portugueses. Seja qual for o seu partido, ainda, há muitos que combatem por ideal e não por medo ao estrangeiro.

O Sr. Silva Dias: - V. Ex.ª dá-me licença?
V. Ex.ª não sabe que muitos do 31 de Janeiro estavam bandeados com alguns de Espanha ? Quer que traga aqui a documentação?

O Orador: - Já lá vamos. Tenho estado unicamente a analisar os argumentos do ilustre Deputado Cancela de Abreu, e não os de V. Ex.ª que até agora não tinha dito nada ...
Risos.
Segundo a acusação referida, eles estavam bandeados com brasileiros, e não com castelhanos. Nela foram arguidos o Deputado Latino Coelho e o Directório do Partido Republicano de então, e não os próprios revolucionários. Ninguém afirmou que os contactos com estrangeiros tivessem sido estabelecidos pelos republicanos que colaboraram efectivamente no movimento, pelos que lutaram com armas na mão, e que por isso foram parar às cadeias do País. Tais contactos, se existiram, foram obra dos políticos, que incitaram os militares à revolta, para depois, prudentemente, se colocarem de banda e renegarem o movimento como o apóstolo renegou o Mestre.
Vejamos agora outros aspectos do pedido de intervenção estrangeira.
Disse o Sr. Dr. Cancela de Abreu que o Directório do Partido Republicano se dirigiu a Rui Barbosa, isto é, a um Ministro do Governo Brasileiro.
Creio que não há partido político no mundo inteiro, nem no passado nem no presente, que não mantenha relações com políticos congéneres de além-fronteiras. A tal respeito as monarquias não podem atirar pedras às repúblicas, nem os liberais aos socialistas.
Abomino sinceramente a intervenção estrangeira nos negócios internos de qualquer país. Só a acho justificada quando se destina a equilibrar ou combater outra intervenção estrangeira, que já se tenha iniciado ou que ameace perigosamente começar: é o caso daquilo que