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346 DIÁRIO DAS SESSÕES - N.º 136

ção da sua dignidade, afirmando a sua revolta e o seu protesto.
Devia ser uma afirmação pura, colectiva, sem divisões.
Mas, a certa altura, as oposições, tanto republicanas como monárquicas, quiseram aproveitar a corrente para fazer a sua política.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - E começaram então a envenenar uma questão nacional com a divisão partidarista e dividiram a Nação, diminuindo os altos e generosos desígnios que fizeram levantar o brado dos portugueses no meio da rua contra a afronta que tinham recebido.
Mais: falsificou-se a verdade pretendendo-se dizer, para levantar o protesto da Nação, que o Governo não tinha sabido acautelar devidamente a dignidade nacional, o que é injusto e falso.
O Governo, nas circunstâncias, procedeu com a mais perfeita dignidade, embora com o sentido da realidade.
Já se movimentavam as esquadras inglesas, prontas a tomar algumas das melhores posições do nosso Império Ultramarino, e todos sabem o que isso representava nessa hora de imperialismo inglês. Representava certamente a perda dessas posições para sempre.
O Governo considerou a realidade e, embora cedendo perante a força, ressalvou os direitos de Portugal nesse documento digníssimo do fraco que tem de se inclinar perante o forte, mas ainda assim em bons termos.
Pois as oposições aproveitaram as dificuldades do Governo, que não eram de partidos, eram nacionais, para as explorarem em seu proveito.
Mais, a injustiça foi mais longe, porque visou sobretudo a figura do Sr. D. Carlos, um grande monarca, que perante a justiça da história todos os dias cresce na nossa consideração e no nosso respeito.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - É injustiça primeiro porque esse homem, ascendido ao trono havia só três meses, trazia as mãos lavadas e a alma inocente de tudo o que pudesse haver de erros no passado.
Mas injustiça ainda maior porque agravava um homem que nessa hora mostrou o mais alto sentido e o mais alto carinho pela dignidade da Nação.
Era ele quem tinha razão, era preciso de facto protestar, era preciso que a dignidade nacional se levantasse perante o mundo, a reclamar contra esta espoliação de direitos e este abuso da força.
Mas era preciso ressalvar o futuro, e para o espírito sem névoa do Sr. D. Carlos só havia uma verdade profunda e permanente na nossa política internacional: a aliança com a Inglaterra.
Ressalvou o futuro e depois, a seu tempo, com o seu alto génio político, valorizou esse instrumento diplomático, pondo-nos com a Inglaterra em pé de igualdade e fazendo com que se salvaguardassem, à sua sombra, os nossos interesses ultramarinos, ao tempo à mercê de tantas cobiças.
Todos sabem até que ponto ele elevou o prestígio nacional pelas visitas dos mais altos chefes das maiores nações da Europa.
A política internacional de prestígio e dignificação ia coroar-se admiravelmente com a sua ida ao Brasil na ,hora em que brutal e canibalescamente o espingardearam ali no Terreiro do Paço, morrendo, como diz João Franco no final de um dos seus capítulos, morrendo, repito, dignamente, ao serviço da Nação.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Pretendeu dizer-se que o patriotismo da rua era superior ao patriotismo do rei. Foi esta mentira ainda que fez surgir o 31 de Janeiro, movimento partidário, movimento que resultou de uma desagregação do sentimento nacional, feito com falsificação de motivos.
Não; o 31 de Janeiro não pode ser dia festivo da Pátria, não pode figurar no calendário de glória da Nação.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Agora o 5 de Outubro.
O problema é ainda mais delicado, mas eu também vou direito a ele.
Não quero apreciar nem ideologias nem regimes.
Fico-me objectivamente no terreno dos factos, pois só assim, dentro da mais rigorosa objectividade, poderei talvez ainda entender-me com alguns dos que não estão inteiramente dentro da nossa posição e do nosso ponto de vista político.
Havia em 1910 um grave problema nacional, ou, melhor, muitos problemas nacionais que, em muitos aspectos da vida portuguesa, acusavam um estado de profundo abatimento, vindo de longe.
Havia um país descrente, que tinha perdido o sentido da sua missão histórica, do seu rumo e da sua vocação.
Havia o grave problema da ordem. Desde que lá de fora vieram os ventos malditos da democracia a nossa história deixara de ser o relato das lutas com o estrangeiro, deixara de ser o relato das nossas glórias nacionais, para ser o relato das nossas lutas internas fratricidas.
Havia um «problema financeiro, um problema económico que se arrastava há séculos, porque a insuficiência e a desordem financeira e económica são males orgânicos estruturais da vida nacional, que foram sempre remediados com os expedientes.
Já a primeira dinastia reparou os desgastes com as alterações da moeda. Depois, na segunda dinastia, foi o comércio do Oriente e mais tarde foi o ouro do Brasil, primeiro das minas e depois o ouro que os emigrantes para cá mandavam em cambiais.
Economicamente a nossa situação foi sempre deficitária depois dos primórdios da monarquia agrária. Era um problema que estava a precisar ser considerado com larga visão.
Havia um problema de cultura e ensino. Portugal tinha nesse plano um lugar mais que subalterno em face das grandes nações.
Havia o problema da insuficiência da nossa organização social, tanto no domínio da assistência como no campo da previdência, como nos restantes. E não há dúvida de que tudo isto precisava de remédio, tudo isto precisava de ser considerado num sério e amplo movimento de reconstrução.
Foi assim em 1910?
Sinceramente, eu apelo para todos, mesmo para os adversários do meu pensamento político, que consultem a sua consciência.
Que fez a revolução de 1910 no sentido de dar à Nação um sentido mais alto ao seu futuro e criar mais confiança no seu destino e tonificar a sua vontade? Que se fez para melhorar o grave problema da ordem?
Todos nós sabemos que esses dezasseis anos foram caracterizados por desordem na rua e na administração, desordem nos espíritos e na praça pública. Desordem permanente.
Resolveu-se o problema financeiro?
Sinceramente o digo: estão aí os números e os factos.
Todos nós conhecemos essa triste história da nossa vida financeira durante os dezasseis anos do regime implantado em 1910.