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106 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 58

uma certa pena variável de criminoso para criminoso, a sua «execução é que tem de ser individual, mo sentido de que cada criminoso constitui por si um caso à parte na categoria em que se enquadra, e, como tal, deve ser e é tratado.
Se o criminoso, com toda a luz e toda a sombra, é diferente dos demais, há que estudá-lo cuidadosamente e aproveitar o tempo da reclusão para completar e reforçar o poder intimidativo da pena, despistando ou anulando as solicitações para o crime.
Punir é necessário, mas a criteriosa execução da pena é essencial para que aquela atinja o sem fim. Em resumo e por outras palavras: a sociedade entrega os criminosos às prisões, mas espera que estas lhos devolvam como elementos úteis, como homens novos. A esta transformação radical aponta hoje toda a política prisional.
De que elementos se há-de lançar mão para operar a alquimia milagrosa?
De todos os que possam ajudar a alcançar o fim proposto: a pena em si mesma, o encarceramento, a disciplina prisional, o trabalho, o salário e suas divisões, a assistência imoral e religiosa, a leitura, a higiene, a instrução, as diversões e o mais que se omite. Dos elementos enumerados é o trabalho o que nos interessa para o caso em discussão e é sobre ele que nos fixaremos.
Abro agora um parêntese para pôr outra questão.
Sendo o que deixo referido o fim da ciência penal e penitenciária em geral, estará de acordo com ele o nosso sistema penal e prisional? Posso tomar a responsabilidade de responder afirmativamente.
Com efeito, para o nosso direito penal não há criminosos irrecuperáveis. Podemos encontrar e encontramos a categoria legal dos delinquentes de difícil correcção, mas, louvemo-nos por isso, não a dos incorrigíveis. E porque para o nosso direito penal todos os criminosos são regeneráveis, não temos nem a pena de morte nem a de prisão perpétua. O período de reclusão pode ser indeterminado para os delinquentes perigosos e que não foi possível modificar. Porque representam um perigo, a sociedade defende-se segregando-os até que dêem garantias de bom comportamento futuro. Se as derem e logo que as deremi, serão restituídos à liberdade. Até, pois, para os provadamente contumazes a lei guarda sempre a esperança de poder devolvê-las um dia à sociedade como elementos úteis.
Estará ordenado ao objectivo do sistema penal (recuperação de todos os criminosos) o nosso sistema prisional?
Quem se der ao trabalho de ler o Decreto-Lei n.º 26:643, de 28 de Maio de 1936, e os que posteriormente desenvolvem ou completam princípios ali enunciados, implícita ou explicitamente terá de reconhecer que todo o sistema prisional, na parte já realizada ou em vias de conclusão, se orienta exclusivamente para a recuperação dos criminosos.
E volto ao problema central de que nos ocupamos. Se a sociedade espera que o sistema prisional lhe devolva os criminosos como elementos úteis, então o sistema prisional deve proporcionar aos reclusos, durante a reclusão, condições de vida tão aproximadas quanto possível das que a sociedade lhes impõe, e, assim, o recluso terá de trabalhar, terá de cuidar da família, terá de pagar as dívidas legais e terá de economizar, como todo o homem prudente.
O trabalho é para todos os homens aptos para ele um dever moral e social. E ainda que tal obrigação não existisse, existiria, para nós portugueses, a obrigação legal de o fazer (artigo 6.º do Estatuto do Trabalho Nacional).
Ora se a sociedade exige de todos os homens aptos o cumprimento do dever do trabalho e o recluso ao ser restituído à sociedade tem de cumpri-lo, evidente se torna que a reclusão deve reforçar e estimular, para ser eficaz, as disposições e aptidões do recluso para o trabalho, isto é, deve ser organizado e funcionar o trabalho prisional, como primeiro e mais poderoso elemento de reeducação.
No seu livro Trabalho Prisional, escreveu Von Liszt:

O trabalho prisional organizado constitui a essência da pena privativa da liberdade, é o seu elemento vivificador, o elemento que a sustenta ou faz perecer.

Este pensamento tornou-se axiomático e ganhou foros de universalidade entre os povos cultos. Entre nós, há cerca de cem anos já o ilustre penalista Levi Maria Jordão reclamava o trabalho prisional, como elemento fundamental no cumprimento das penas privativas da liberdade, até para os condenados a prisão correccinnal. O problema, portanto, também repercutiu entre nós.
Não me deterei a exaltar o valor do trabalho como meio moralizador e correctivo. Isso está dito e creio não oferecer dúvidas. Não quero deixar de referir, porém, o que se escreveu no relatório do Decreto-Lei n.º 26:643, e passo a ler:

... o trabalho foi sempre uma escola de virtude e, portanto, um instrumento de regeneração, mas não é este sómente o motivo da necessidade de o estabelecer nas prisões; há ainda que contar com a preparação de condições necessárias para que o preso seja reabsorvido socialmente quando posto em liberdade, e esse objectivo será difícil de atingir se o preso esteve durante muito tempo ocioso.

Talvez não valha a pena ler o mais que sobre este assunto consta do referido relatório. Basta dizer que o decreto-lei, concretizando estes princípios, prescreveu (artigo 261.º) o trabalho como obrigação de todos os reclusos capazes. E, como só é trabalho o que tem uma finalidade útil, no artigo 266.º do aludido decreto-lei prescreve-se ainda: «O trabalho imposto aos reclusos deve ser sempre uma ocupação produtiva». Se nesta matéria não conseguimos ser inovadores, não ficámos atrás dos que foram mais longe.
Como se executam estas imposições do Decreto-Lei n.º 26:643?
Criando, equipando e alargando oficinas em todos os estabelecimentos prisionais para o cumprimento de certas penas. E para realizar o ideal, longínquo ainda, do pleno emprego retomou-se, noutras bases, o trabalho extraprisional. Para uniformizar, interligar e intensificar o trabalho criou-se em 1944 a Comissão para a Organização do Trabalho Prisional e Correccional e, pelo Decreto n.º .34:674, de 18 de Julho de 1945, organizou-se técnica e administrativamente esse trabalho fora dos estabelecimentos prisionais. Surgiram assim os campos de trabalho e as brigadas de trabalho prisionais, das quais o País conhece já algumas belas e grandiosas realizações. Ainda no intuito de facilitar o pleno emprego, o Ministro da Justiça projectou para 1948 o plano que vou ler, e que está em vias de conclusão:

Plano de construções e apetrechamento de oficinas para 1948

Projecto

I) Materiais de construção:

a) Cerâmicas:

1) Construção de fábrica de manilhas, azulejos, etc. (em Sintra).