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15 DE DEZEMBRO DE 1950 179

Esta sua atitude é para nós de tanto mais valia quanto é certo que hoje, como ontem, continuamos a ver nele a personificação do regime, a cujos valores morais estamos estritamente ligados pela inteligência e pelo coração.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Entre os mais delicados encargos que até agora têm estado cometidos à Assembleia Nacional situa-se, sem dúvida, aquele que se traduz no seu direito de análise aos actos da nossa Administração; exercendo-o, pratica, afinal, um acto da mais alta transcendência política, visto dar ao País que a elegeu a certeza da presença de uma instituição capaz de traduzir os seus anseios, reflectir as suas tendências, levantar as suas objecções, controlar e estimular, dentro do interesse geral, a própria actuação governativa.
Contribui, assim, eficazmente para a sua maior eficiência, visto fornecer ao Governo parte da crítica que este precisa para o exame objectivo dos seus próprios actos, facilitando-lhe o processo de melhor se orientar ou mostrando-lhe a necessidade de melhor esclarecer e comunicar com os governados.
No dia em que o não fizesse, pode dizer-se que traía uma das suas principais missões.
A par, portanto, de uma função de limitação a eventuais desvios do Poder, a par da sua função legislativa ou de correcção a erros que porventura se cometam, tem outra, importantíssima, a traduzir-se no estabelecimento de uma ligação entre as reacções e as dúvidas do País e a acção dos governantes: constitui, portanto, um elemento de auxílio precioso para aqueles a quem cabe a delicada função de governar.
Na realidade, o Governo está numa permanente obrigação perante o País, e não na fruição dum direito, adquirido ou usurpado, que o leve a poder desinteressar-se da opinião e da vontade da gente que governa: um governo, para governar, tem de conhecer e, para conhecer, tem de ouvir, mas o País tem de ter a consciência que se faz ouvir e de saber claramente se foi ouvido ou não.
E é aqui, exactamente aqui, que a Assembleia Nacional pode prestar ao País e aos governantes um relevante serviço nessa acção de ligação imprescindível; e pode fazê-lo sob uma forma própria, que nasce do modo como a sua composição se encontra estruturada, onde não há ligações que nos desviem ou limitem, mas uma plena liberdade dentro dum só princípio: «tudo pela Nação, nada contra a Nação».

Vozes - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Temos, meus senhores, a consciência de que não nos falta o fecho da estrutura para objectivar convergentemente as questões. Temos de acautelar unicamente a base, para que toda a estrutura se equilibre da forma que mais se impõe.
Não vemos esta Assembleia, Deus louvado, constituída por facções ou agrupamentos partidários, por elementos representativos de vários entendimentos políticos, que acintosamente, dentro daquele facciosismo que uma disciplina de grupo tornaria inevitável, jogassem tudo por tudo, procurando utilizá-la para alcançar o Poder.
Os povos estão já devidamente esclarecidos quanto ao valor construtivo dum trabalho parlamentar em moldes tais, o qual, muito para além das dificuldades e atrasos que acarretam aos governos, a repercutirem-se em dificuldades e atrasos para a vida nacional, está claramente demonstrado quanto à própria insegurança das nações. E esta não ficará, mais tarde, a lembrar-se unicamente através dos relatos das sessões tumultuosas ou das recordações das habilidades e processos pouco limpos com que interesses partidários conseguiam desviar a justa solução dos problemas: fica a testemunhá-la, quantas vezes, o sacrifício em sangue, de uma ou de várias gerações.
Sendo a acção interventiva destas câmaras puramente partidária, puramente subjectiva, não pode merecer respeito ou confiança por parte das nações: não está, porque não pode estar, na nossa consciência nacional.
Apoiados.
No pólo oposto poderíamos encontrar uma câmara amorfa, num anodinismo condenável, que lhe tirasse toda a personalidade e todo o interesse; seria então um simples prolongamento da vontade do Governo, estabelecendo, na aparência de um respeito por certas garantias uma ligação orientada num sentido só. A sua função essencial, senão a única, seria a de encobrir uma ditadura pura e simples, dando-lhe uma exteriorização, aliás inconsistente, de sujeição e de acatamento à vontade nacional.
Câmaras assim constituídas não têm aceitação nem interesse para a política interna de um país, e muito menos se poderiam conceber numa política de verdade: são simples prolongamentos disfarçados dum estatismo omnipotente e omnisciente.
É certo que às nações interessam governos que perdurem, a poder garantir, através da sua continuidade, a solução dos problemas de fundo, e não unicamente daqueles casos burocráticos mais correntes, ou a enunciação de planos e reformas que, às vezes, nem sequer chegam a ver a luz do dia através do texto que os traduz; só a expectativa confiante de uma permanência prolongada, a certeza indispensável de se manterem princípios formativos da política em que um governo se integra, permitem trabalhar com aquela segurança que se torna imprescindível para o progresso e bem-estar das nações - só elas nos dão a garantia de que a ponderação, a seriação e a realização dos problemas, a que é indispensável o tempo, não ficam comprometidas pela improvisação aventurosa do momento.
Sinto poder afirmar, meus senhores, com a aquiescência de todos, que, ultrapassando de longe os seus defeitos, a experiência portuguesa comprovou plenamente as vantagens do sistema, e esta convicção enraizou-se de tal modo em nós, cimentada até pela comparação com aquilo que se viveu já em Portugal, e que outros, por seu mal e mal de todos, vão vivendo ainda pelo Mundo, que a grande preocupação na política interna do presente é simples preocupação da política no futuro.
Apoiados.
Mas, se o princípio se pode considerar inatacável, o mesmo não acontece quanto à forma como um Governo pode viver dentro dele: o interesse que se apontou fica condicionado pela frescura e novidade do labor governativo, pelo sentir-se a evolução constante dos métodos e dos processos que a experiência dia a dia nos impõe, pela adaptação de novos meios que a prática aconselha, pelo ajustamento de ideias e conceitos que o evoluir da política legitima, pelo reparo dos erros inevitáveis que a melhor, mais pura e mais bem intencionada acção governativa pode acarretar nas suas decisões.
Um Governo que se feche em volta de si mesmo, que cristalize na sua actuação, que deixe acumular o pó do tempo nos processos de que vive, que teime em manter erros condenáveis, com o medo incompreensível de sofrer um desprestígio, retirando a tempo uma medida - buscando, assim, na intransigência o prestígio que melhor encontraria na razão -, que não deixe atrás de si, em consequência da sua própria forma de actuar, um rasto institucional a assinalar a sua integração no sentimento