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15 DE DEZEMBRO DE 1950 185

a morte se avolumam ainda mais com o pavor da falta de dinheiro. Temos de actuar!
O Governo precisa de estar atento a este problema, não só em face do presente como pelas perspectivas do futuro, e vou, Sr. Presidente, esclarecer porquê:
O custo da nossa vida vai aumentando dia a dia, apesar de todos os cuidados, de todas as atenções, que o Governo ponha em campo para impedir tal aumento - e esta é que é a dura realidade. A pouco e pouco, portanto, vão as dificuldades crescendo, e a pouco e pouco, também, os vencimentos e os salários para menos vão chegando - esta é a situação presente, que o Governo tem de encarar depressa - e bem.
Mas, se olharmos aos valores dos índices de preços por grosso, por exemplo, que o Instituto Nacional de Estatística nos fornece, vemos que os índices relativos aos produtos nacionais e aos produtos importados (e donde aqueles resultam por simples média ponderada) são por completo distintos na sua ordem de grandeza: muito mais baixos os primeiros, muito mais altos os segundos.
Uns números para exemplo:

1939:

Índice geral .............. 103
Índice dos produtos nacionais ....... 94
Índice dos produtos importados ...... 131

1944:

Índice geral .............. 248
Índice dos produtos nacionais ....... 188
Índice dos produtos importados ...... 415

1949:

Índice geral .............. 252
Índice dos produtos nacionais ...... 225
Índice dos produtos importados ..... 328

E assim se vê que, embora indirectamente, o custo da nossa vida é altamente influenciado pelo custo dos produtos estrangeiros de que precisamos na mais larga escala; ora o certo é que pouco ou nada melhorámos no que respeita às quantidades que se importam e que nos mantêm em perigosa dependência dos mercados estrangeiros: melhorou unicamente, e louvemo-nos já por isso, a balança do comércio externo, no que respeita às consequências das condições do preço que se oferecem, mas não em relação aos quantitativos que absorvemos.
De facto, em 1943 importámos só do estrangeiro, por exemplo, 1.226:875 toneladas, ao preço de 2.265$ a tonelada; em 1944, 1.543:356, ao preço de 2.060$; em 1945, 1.480:558, ao preço de 2.227$; em 1946,2.153:460, ao preço de 2.704$; em 1947, 2.862:966, ao preço de 3.046$; em 1948 (já em plenas restrições), 2.832:445, ao preço de 3.347$, e em 1949 (com as restrições levadas muito mais longe), 2.861:000 (tantas, pràticamente, como em 1947), ao preço de 2.755$.
Não tenho por agora elementos que me permitam referir a importação só do estrangeiro em relação ao período de Janeiro a Outubro deste ano; se admitirmos, porém - e com toda a reserva duma hipótese bem frágil -, a mesma percentagem em relação à importação que se manteve ligada ao ano de 1949, ficaremos na mesma tonelagem com que se mediu a importação de igual período do ano que passou. E, contudo, o seu preço foi incomparavelmente menor.
É flagrante, por exemplo, o que acontece com as substâncias alimentícias, de que nunca se importou, talvez, tanto como agora.
Em 1947 importáramos 635:000 toneladas e em 1948 descemos para as 541:000, mas já depois, em 1949, fomos para números mais altos, para 694:000, e até agora,
nos dez meses decorridos até Outubro, já passámos as 672:000: quase mais 6 por cento do que em 1947, durante o ano todo, em que havia quem dissesse que a vida não estava fácil e quem pretendesse até, num exagero condenável, que lhe faltava alguma coisa... Boatos que sempre se cultivaram nesta terra em que vivemos. Sei que temos conseguido um aumento apreciável de importação das províncias ultramarinas; nunca será demais louvar quem tal conseguiu, nem os colonos que tanto contribuíram para dar realidade a um desejo de todos e tanta vez manifestado.
Apoiados.
Mas, continuando:
Os números mostram claramente que temos usufruído a vantagem - para que, aliás, não contribuímos e que, portanto, é estranha ao nosso esforço - de uma baixa de preços no estrangeiro e de uma maior facilidade de escolha de mercados, que o Governo tem procurado aproveitar do modo que melhor pode; mas não avançamos
muito para uma posição que nos defenda, por via do aumento da nossa própria produção, o que constitui, aliás, a causa fundamental de grande parte dos desequilíbrios que sentimos é de grande parte das surpresas que sofremos.
Estamos, assim, hoje, como ontem, na contingência de uma subida de preços, que nos levaria ao pior, e, se a Coreia está longe e os homens ainda discutem à procura nem se sabe bem de quê, as alterações exteriores vão-se sentindo, como repercussão inevitável do ambiente de guerra que já se está vivendo.
E aproveito a ocasião agora, e ao tratar exactamente deste ponto, para testemunhar ao Sr. Ministro da Marinha, como português, o agradecimento que lhe devo - e lhe hei-de ficar devendo - pela renovação a que obrigou a nossa marinha mercante, e cuja valiosa consequência talvez, infelizmente, possamos sentir ainda em breve.
O destino a Deus pertence, mas o ambiente que está pesando no Mundo pode ter uma influência decisiva no custo da vida em Portugal: e é este o problema para que o Governo se tem de preparar, olhando ao poder de compra reduzido da grande maioria da gente que trabalha no País.
Nesta tarefa enorme a que o Governo se vai lançar, neste mar tremendo de dificuldades que temos de atravessar, esteja bem presente no espírito dos que governam a lição insofismável que o passado nos deixou e que o presente nos afirma; agora o caminho é para a frente, mas para a frente noutra direcção, a não ser que queiramos tornar a vida incomportável àqueles que trabalham para viver. Não hesite o Sr. Presidente do Conselho em assentar, francamente, num plano de fomento a executar, como disse, em meia dúzia de anos, e devidamente «ordenado para satisfazer algumas das maiores e mais prementes necessidades do povo português».
Mas não deixemos, por Deus, que a modéstia dos processos torne demasiado lento o aproveitamento que se impõe dos recursos enormíssimos que, em potencial, se estendem por todo o vasto espaço que constitui o Império Português.
Vou terminar, Sr. Presidente, pedindo que todos me desculpem esta divagação, com que tanto os massacrei (não apoiados), mas não desejaria fazê-lo antes de chamar a atenção do Sr. Ministro das Finanças para certas interpretações que a proposta de lei que nos enviou está indubitavelmente suscitando.
E, porque elas se reflectem no campo político, merecem com certeza uma cautelosa atenção.
Parece da maior necessidade que o Sr. Ministro das Finanças, no relatório que há-de acompanhar o decreto do orçamento, apresente ao País as razões que francamente justificam as providências severas que pôs pé-