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24 DE FEVEREIRO DE 1951 397

A proposta faz a afirmação de que o culto da religião católica é livre como culto da religião da Nação Portuguesa. Já se viu acima que a liberdade de cultos deve ser igual para todos. Tanto mais que importa não esquecer que, dentro do princípio de comunidade de direito orientador da integração do Acto Colonial no texto da Constituição, este preceito contém a regra normativa da conduta do Estado em África, na China e na índia, onde outras religiões são professadas por grandes núcleos de súbditos portugueses, constituindo maioria nos seus territórios.
Por outro lado, a Câmara teme que a inscrição na lei constitucional da afirmação da existência de uma religião da Nação venha ia ser a porta aberta para o regresso a uma religião oficial, com os seus inconvenientes práticos.
Talvez não fosse inconveniente meditar nas reflexões do chanceler Schuschnigg, sucessor de Mons. Seipel e de Dollfuss na chefia do partido católico austríaco, a propósito da declaração inserta na Constituição da Áustria de 1934, de que a Áustria constituía um Estiado cristão:

...la déclaration de l'Etat «chrétien» ne fût un avantage ni pour l'Eglise, ni pour l'Etat. Pour l'Eglise, parce que tous ceux qui entraient en opposition avec l'Etat, fût-ce pour de minimes raisons administratives, rendaient en partie l'Eglise responsable de leurs mécomptes, d'où une désaffection de l'Eglise à titre de manifestation politique. Pour l'Etat parce qu'il se produisait une source continuelle de frictions inévitables. Les dificultes étaient nombreuses...
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On risque... de voir se développer cette hypocrisie et ce faux christianisme, qui ont toujours compté parmi les plus grandes plaies de l'Eglise. On peut croire personellement à l'idéal chrétien, on peut lutter pour lui, mais on ne peut pas vouloir en faire une sorte de monopole spirituel protege par l'Etat. Il perd dans ce cas de son contenu et de sa profondeur pour dégénérer en cette superficialité qui est la mort de toute conduite vraiment spirituelle, de tout caractère et de tout sentiment religieux sincère (Requiem, pp. 215 e 216).

As frases finais fazem lembrar a frase de um político católico francês do século XIX:

Le monde redeviendra chrétien quand l'Eglise sera non plus une force mais une lumière.

Uma breve nota será também oportuna acerca da referência feita na proposta às «concordatas e acordos aplicáveis na esfera do Padroado», que a algumas pessoas menos esclarecidas poderá parecer pouco actual:
O Decreto-Lei n.º 37:917, de 1 de Agosto de 1950, aprovou, para ser ratificado, o texto de um acordo entre a Santa Sé e a República Portuguesa que modifica profundamente o regime do Padroado do Oriente, por se reconhecer «a conveniência de adaptar à nova situação da Índia as disposições estipuladas na Concordata assinada em Roma em 23 de Junho de 1886 e no Acordo assinado na mesma cidade em 15 de Abril de 1928».
Este Acordo não suprimiu o regime do Padroado, que fica a subsistir, mas restrito às dioceses de Macau e de Goa, prevendo-se que o território desta última venha a ser objecto de nova delimitação.
O arcebispo de Goa e Damão mantém a dignidade metropolitana e patriarcal que lhe foi conferida pelo artigo 2.º da Concordata de 1886, e por este motivo conserva o privilégio de presidir aos concílios provinciais de toda a índia, na qualidade de primaz do Oriente.
O Governo Português conserva o direito de apresentação dos prelados dessas duas dioceses e a propriedade dos bens que possuía nos territórios da antiga jurisdição do Padroado e mantêm-se em vigor as estipulações relativas à nacionalidade dos párocos de determinadas paróquias.
O regime do Padroado subsiste, pois, quanto às dioceses (portuguesas de Goa e Macau.

23. Quais serão os pontos que, sob o aspecto estritamente jurídico-político, interessaria consagrar na Constituição quanto às relações entre o Estado e a Igreja Católica?
Em primeiro lugar, é inegável a necessidade de destacar a posição especial da Igreja Católica, em cujo grémio professa a grande maioria dos portugueses. O reconhecimento dessa posição parece suficiente para legitimar o estatuto privilegiado que em matéria confessional é dado à Igreja.
A Constituição irlandesa de 1937, que tanto parentesco espiritual oferece com a portuguesa, e onde manifestamente influíram os sentimentos religiosos que figuraram entre os mais fortes estímulos da independência nacional, resolveu assim o problema da posição do Estado em face das igrejas:

Art. 44.º ......................................................................
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2) O Estado reconhece a posição especial da Santa Igreja Apostólica Romana como guardiã dia fé professada pela grande maioria dos cidadãos.
3) O Estado reconhece também a Igreja da Irlanda, a Igreja Presbiteriana na Irlanda, a Igreja Metodista na Irlanda, a Sociedade Religiosa dos Amigos na Irlanda, assim como as comunidades israelitas e as outras confissões religiosas existentes na Irlanda à data da entrada em vigor da presente Constituição.

Em segundo lugar, convirá consagrar constitucionalmente o princípio de livre exercício da autoridade da Igreja afirmado no artigo 2.º da Concordata com a Santa Sé.
Finalmente, manter-se-á a referência ao regime de separação amigável actualmente vigente nas relações entre os dois poderes. A separação ida Igreja e do Estado surgiu em Portugal com carácter unilateral e sectário, lê por isso ofendeu [profundamente a consciência religiosa da Nação. Mas o regime é aceite pela Igreja quando estabelecido concordatàriamente, como é o caso no nosso país. E, desde o momento em que a Santa Sé o admitiu e aceitou, não se vê razão para que continuo a escandalizar.
Nestes termos, o artigo 46.º ficaria assim redigido, no parecer unânime dos signatários deste parecer:

Art. 46.º O Estado reconhece a posição especial da Igreja Católica, em que professa a maioria dos portugueses. É garantido à Igreja o livre exercício da sua autoridade, com a faculdade de na esfera da sua competência, exercer os actos do seu poder de ordem e jurisdição sem qualquer impedimento. O Estado mantém em relação à Igreja Católica o regime de separação, sem prejuízo das relações diplomáticas entoe a Santa Sé e Portugal, com recíproca representação, e das concordatas e acordos aplicáveis na esfera do Padroado ou de outros em que sejam ou venham a ser reguladas matérias de interesse comum.

Em anexo publica-se o parecer subsidiário que sobre a matéria destes artigos foi emitido pela secção de Interesses «espirituais e morais.