28 DE FEVEREIRO DE 1951 425
Mas, repito, os centros de estados devem apenas, a meu ver, constituir o embrião ou o elemento adjuvante essencial da Junta de Economia preconizada. Há entre o carácter e as funções desses centros, dum lado, e a natureza e função do organismo projectado, do outro, diferenças fundamentais.
Aqueles estudam livremente problemas de aplicação ou interesse variáveis ou impulsionam de modo geral estudos dessa ordem.
A Junta teria um papel mais permanente, mais sistemático e mais amplo, estaria num contacto mais directo com as esferas governativas, possuiria mais alta responsabilidade oficial.
Aliás basta ler as revistas a que aludi para se verificar que os centros procuram, sobretudo, coligir os materiais, realizar investigações originais, fazer progredir os estudos a que se consagram, efectuar, enfim, uma tarefa que se pode considerar de colaboração com os responsáveis dos projectos de acção governativa, quer de conjunto, quer de pormenor, ou seja com os responsáveis da planificação geral ou parcial da tarefa de administração e de fomento do País.
Abandonando, porém, este aspecto das minhas considerações, que aliás não deixará, assim o creio, de ser ponderado por quem houver de se ocupar da eventual organização da Junta, mais uma vez sugerida ao Governo neste debate, não posso omitir ainda algumas palavras sobre dois aspectos, que considero fundamentais, do assunto em discussão.
Trata-se da necessidade de imprimir um novo impulso e fecunda continuidade à investigação científica em Portugal, e, por outro lado, de intensificar a coordenação dos problemas económicos, e, implicitamente, dos problemas da população da metrópole com os do ultramar.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - Num esquema satisfatório do desenvolvimento nacional não pode deixar de ser dado um lugar importante à investigação científica, quer como rubrica independente, quer como preliminar de aplicações especiais. É evidente que nas rubricas das tarefas dotadas nos quinze anos decorridos se encontravam naturalmente implícitos os ensaios, os estudos e os projectos que a realização dessas tarefas exigisse.
Mas nunca será demais especificar tal necessidade, mormente para efeitos de conjunto ou em ramos de pesquisa que não estejam necessariamente abrangidos nas tarefas do esquema, mas os quais nem por isso deixam de interessar à elevação do nível cultural e científico no País.
Tenho lido alguns planos do género noutras nações: nunca vi que nos países de maior progresso e cultura fosse esquecida a investigação científica.
Recordo no momento os esquemas feitos pelo Colonial Office para as colónias inglesas em cumprimento das leis do Colonial Development and Welfare; lá figuram inevitavelmente verbas consideráveis para a investigação, mesmo em matérias que não parecem de interesse económico directo, como as línguas indígenas, a ciência social, a antropologia, etc.
Colossal é também o esforço financeiro da França e da Bélgica na pesquisa científica nos respectivos territórios ultramarinos: não creio que, depois dos ziguezagues dos últimos anos na matéria, os brilhantes e meritórios impulsos iniciais venham a transformar-se entre nós num desordenado e definitivo recuo.
Não perdi a fé que até agora me animou, mormente estando o departamento do ultramar confiado a lúcida e decidida orientação do comandante Sarmento Rodrigues, que até há pouco colaborou nos trabalhos desta Assembleia e expressamente se associou aos votos desta para a intensificação da investigação científica colonial. Aliás, como se pode planificar sem conhecer os recursos naturais e humanos de um pais? Planificar o desconhecido!...
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - Não podemos nem devemos ficar lamentavelmente para trás quando em todos os países civilizados há um grandioso movimento de intensificação da actividade pesquisadora. As próprias empresas privadas nalguns desses países dão o exemplo: de um artigo de um seu director que há meses li consta que a Standard Oil Company, de Nova Jérsia, ocupa na investigação várias entidades, contando só um dos seus novos centros cerca de seiscentos técnicos e tendo as despesas daquela empresa em 1948, com a investigação sobre o petróleo e seus produtos, atingido uma soma superior a 20 milhões de dólares.
Pode dizer-se que neste caso a investigação se encontra relacionada directamente com os fins da empresa. Mas há muitos casos em que tal não sucede: a Companhia de Diamantes de Angola, por exemplo, não tem esquecido no programa dos seus serviços culturais a história natural, a etnologia, a pré-história, o próprio folclore musical das populações da Lunda. Criou um museu no Dundo.
Nós não temos ainda em Lisboa um museu do ultramar, como a Bélgica tem o grandioso Museu do Congo, em Tervuren, etc.
Sobretudo torna-se necessário, imprescindível, criar e formar legiões de técnicos e de especialistas, dando-lhes, é claro, tarefas adequadas para realizarem e as condições indispensáveis de continuidade, de retribuição e de actividade.
Há quem suponha que não temos nada que aprender no estrangeiro e que tudo o que por cá fazemos nada fica a dever ao que se faz lá por fora.
Certamente alguma coisa podemos ensinar aos outros, mas, se julgarmos que não é útil o contacto repetido com os meios estrangeiros de especialidade, um intenso intercâmbio com estes, aliás sem perda do nosso critério próprio - quando nos pareça melhor -, ficaremos vergonhosamente para trás.
Lembremo-nos de que os geólogos nas colónias inglesas de África são hoje mais de cem. Os nossos são meia dúzia de contratados, a maioria dos quais sem perspectivas de melhoria de situação, sejam quais forem a duração e a qualidade dos serviços prestados.
E já se têm chamado geólogos e outros especialistas estrangeiros para estudarem e descobrirem o que já cá se sabia há muito. Decerto não ficariam mais baratos do que nos ficariam a preparação e utilização dos nossos.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - Nem por isso julgo possível, nem mesmo seria conveniente para a eficiência da tarefa, pretender o desenvolvimento imediato de uma infinidade de especialidades científicas em todos os nossos territórios. Seria uma improvisação tão aparatosa e insensata como de antemão condenada ao mais estrondoso fracasso.
Devagar só vai ao longe, mas é preciso caminhar em terreno firme, com prudente, são e esclarecido critério. E que os programas e relatórios de trabalho sejam orientados ou julgados por quem tenha competência técnica para o fazer, o que, implicando um acréscimo de responsabilidade (que a permanente interferência da Administração ou dos não especializados na actividade pesquisadora tornaria mínima), requer também uma