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4 DE ABRIL DE 1951 729

Pela minha parte limito-me a pedir providências ao Governo, em especial aos Srs. Ministros da Economia e da Marinha, convencido, como estou, de que uma comissão de reconhecida competência, expressamente nomeada para estudar em profundidade o repovoamento e a pesca do salmão, forneceria aos ilustres titulares daquelas pastas bases sólidas para realizações fecundas.
E desde já declaro, para me sangrar em saúde, que não desejo nem devo fazer parte dessa comissão, porque não sou do métier, nem tecnicamente, nem desportivamente, conclusão esta a que VV. Ex.ªs decerto já tinham chegado.
Disse.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Presidente: -Vai passar-se à

Ordem do dia

O Sr. Presidente: - A ordem do dia é a discussão, na generalidade, da proposta de lei de revisão da Constituição e do Acto Colonial.
Tem a palavra o Sr. Deputado Mendes do Amaral.

O Sr. Mendes do Amaral: - Sr. Presidente: ao ocuparem-se de problemas de revisão constitucional os membros de qualquer assembleia com poderes constituintes podem escolher, conforme o seu temperamento e as suas predilecções, ou a atitude de cínica incredulidade do ex-bispo Taíleyrand sobre a virtude dos textos constitucionais, ou a atitude piedosa de Benjamim Franklin na reunião da Convenção dos Estados da América do Norte, em 1786, para elaboração da Constituição dos futuros Estados Unidos.
Nessa convenção, no momento em que, depois de quatro longos meses de discussão, ela ameaçava dissolver-se sem ter conseguido qualquer, coisa de positivo sobre o fim para que tinha reunido, o velho inventor dos pára-raios, já octogenário, levantou-se e, dirigindo-se ao presidente Washington, disse:

Senhor: como é possível que, depois de andarmos aqui tanto tempo às apalpadelas, no meio da escuridão, sem conseguirmos atingir os objectivos para que nos encontramos reunidos, nos tenhamos esquecido de levantar os olhos para Deus, para o Pai de todas as luzes, para lhe pedirmos que ilumine os nossos espíritos?
Nós, que tantas vezes no decorrer da luta pela independência, no meio das nossas aflições, nos dirigimos ao Altíssimo para que nos auxiliasse e que tão bem sucedidos fomos nas nossas preces e solicitações, temo-nos esquecido nestes quatro meses de que só Deus pode ajudar-nos na elaboração do alicerce fundamental da nossa vida futura.

E a partir desse momento, Srs. Deputados, a harmonia reinou entre os delegados à Convenção de Annapolis e a Constituição dos Estados Unidos, então elaborada, quase se tem mantido até hoje com o mesmo texto aprovado nessa ocasião.
Por mim, Sr. Presidente, entre a atitude de Talleyrand e a atitude de Benjamim Franklin, escolhi a última, e eu - que não sou dos que mais abusam da paciência divina com preces para a satisfação de ambições que não tenho - espero que a Divina Providência se tenha dignado iluminar o meu espírito na elaboração das propostas de alteração que há pouco apresentei e das propostas de emenda que vou ter ocasião de mandar para a Mesa sobre a matéria da proposta de lei em discussão.
E só mediante esta atitude, impelido pelo que julgo ser o meu dever de intérprete da opinião publica no sector político, eu poderia ter vencido os naturais escrúpulos em abordar esta matéria, escrúpulos dimanados da noção exacta que tenho da minha carência formativa, que nenhum autodidatismo poderia suprir convenientemente.
Considero, Sr. Presidente, o estatuto constitucional de qualquer país como a raiz da árvore mais ou menos frondosa, mais ou menos frutífera, de toda a legislação que cobre a vida orgânica do país: se a raiz está sã, a árvore pode produzir bons frutos; se a raiz não é boa, a árvore pode desentranhar-se em folhagem abundante, mais ou menos clorótica, mais ou menos caduca, mas é escassa de frutos. Se o solo onde mergulha a raiz é irrigado por fluxos de verdadeira moral, a árvore vive e perdura; se o solo é constituído apenas pela rocha do egoísmo e o fluxo e a rega são apenas o da moral utilitária, a árvore nunca poderá produzir bons frutos, e muitas vezes os produz bem amargos.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - O solo onde se implanta a Constituição Portuguesa é do melhor que há, porque é a própria índole do bom e generoso povo português. O seu subsolo é constituído pelas virtudes ancestrais da raça, pela sua homogeneidade, pela unidade da língua e dos costumes, tudo isto caldeado e depurado ao longo de séculos de heroísmo e de dedicação patriótica; e o fluxo que tem irrigado este solo tem sido sempre o da moral cristã.
É, portanto, legítimo esperar e confiar, Sr. Presidente, que a árvore cuja raiz é a nossa Constituição possa produzir e haja de produzir bons frutos.
Porque duram e de que vivem as Constituições? perguntava em 12 de Dezembro o Sr. Presidente do Conselho.
E ele próprio respondia:

Vivem, em primeiro lugar, da adaptação do regime ao sentir e ao modo de ser dos povos e, em segundo lugar, da institucionalização dos seus preceitos, isto é, da extensão e intensidade com que os preceitos abstractos tenham entrado na vida real através do funcionamento, por assim dizer automático, dos órgãos ou serviços apropriados.

E dizia mais adiante:

Nesta orientação, afigura-se-me ser preferível que a Constituição e, portanto, as alterações constitucionais vão acompanhando a organização, que os maiores esforços se empreguem para a fazer progredir, senão para a completar.

Pois bem, Sr. Presidente, o meu apagado esforço neste passo visa precisamente a isso: a que se progrida em matéria de descentralização administrativa, como reflexo da maturidade política e social que a Nação Portuguesa atingiu durante estes vinte e cinco anos de uma era de progresso material e de não menor aperfeiçoamento moral e social; a que se complete e se integre de vez na vida nacional a fórmula positiva de organização das sociedades que é o corporativismo, como também disse o Sr. Presidente do Conselho, e, uma vez atingido o grau de perfeição que lhe conferirá o direito à sua autonomia essencial, ela possa viver com essa autonomia perfeitamente articulada, com a autoridade política concentrada nas mãos do Governo.
Visa a que a moralidade dos costumes públicos domine, irmanada com a moral cristã nos costumes privados.