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770 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 94

A palavra «democracia» - entendida por cada um à sua maneira e que tanto servia para a tão formalista monarquia britânica ou para o autoritário presidencialismo americano, como para os Estados-servos do Leste, baptizados pelos déspotas do Kremlin de «democracias, populares» -, a palavra-ídolo foi ostentada como atributo puramente genérico, susceptível de adaptar-se a quaisquer espécies políticas.

O Sr. Carlos Borges: - A democracia é um caleidoscópio.

O Orador: - Mas a essência da democracia genuína - a soberania do número - essa foi, em todos os lugares, escamoteada e falsificada.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Daí os governos de concentração de partidos, ou, pior, os governos de partidos minoritários - negações flagrantes da ortodoxia democrática. Adoptaram-se a cada passo estratagemas híbridos, equívocos, em que se evitava repudiar os preconceitos da escola e, todavia, se procurava viver e governar fora deles ou apesar deles...
Tanto mais que do lado de lá da famosa muralha soviética nem as aparências mesmo se sacrificavam a esses preconceitos e, sobre uma engrenagem tirânica de caserna, meia dúzia de homens, graças a uma política de absoluto segredo e de desumana violência, conduziam e conduzem arbitràriamente um povo imenso e passivo, desde sempre modelado para a imolação e para a servidão.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Diante de um tal adversário, que, desprovido de limitações éticas, utiliza todos os trunfos de uma autocracia discricionária, vamos nós, os ocidentais, ficar presos aos simulacros e às imposturas da desacreditada ficção liberal-democrática?
Esse adversário visa, aliás, com o domínio do Mundo, a destruição radical da civilização em que nos enquadramos-nos seus fundamentos metafísicos, morais, sociais e económicos.
No excelente parecer subsidiário da secção de Interesses espirituais e morais da Câmara Corporativa encontro uma legenda perfeita: «a uma negação total há que opor a afirmação total».
Refere-se a frase ao caso religioso. Vale igualmente, quanto a mim, para o caso político. Também aí temos de opor a afirmação total à total negação que Moscovo representa.
E porá nós, portugueses, afirmação total implica restauração total - restauração das instituições políticas que fizeram a Nação, a estruturaram, a apetrecharam para os vastos empreendimentos nas várias partes do Mundo, a guiaram em sete séculos de livre existência e de prestígio histórico!

O Sr. Carlos Borges: - Com a Carta...

O Sr. Paulo Cancela de Abreu: - Até com a Carta!

O Orador: - É que a força da instituição era tal que resistiu mesmo à Carta e continuou a sua obra.
Mas, reatando:
Sr. Presidente: há vinte e cinco anos que se iniciou a Revolução Nacional. Tem sido tal a sua obra neste quarto de século - exactamente o mesmo quarto de século durante o qual (segundo a frase citada do parecer da Câmara Corporativa) a Europa tacteou, e tacteia, à busca de uma solução para a crise política do Estado - que pareceria havermos nós descoberto a solução para essa crise. De facto, a tentativa portuguesa (como se lê ainda no parecer) é a mais antiga e a mais prestigiosa. Daí a admiração e o louvor que provocou e provoca; a real influência que exerceu e exerce, a posição a que nos alçou nos centros da opinião mundial.
E porquê?
Primeiro, porque houve a coragem e o bom senso do proclamar e seguir a doutrina tradicionalista e realista do fortalecimento do Poder, da sobreposição do interesse nacional aos interesses de grupos ou clientelas, da conciliação dos factores da produção ao serviço de uma finalidade superior e harmonizadora -enfim, de recorrer àqueles valores espirituais, morais e políticos que cimentaram e estimularam a vida colectiva ao longo dos séculos.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Segundo, porque surgiram duas personalidades excepcionais: o Sr. Marechal Carmona, com as suas reconhecidas virtudes, a sua firmeza e a sua prudência, o seu aprumo e a sua bondade, soube ser na chefia do Estado o símbolo vivo da presença e da responsabilidade do Exército, à frente da Revolução em marcha...

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - ... O Sr. Dr. Oliveira Salazar, doutrinador, reformador e homem de Estado, definiu os princípios, apontou os caminhos, executou na acção fecunda o que o seu pensamento concebera e formulara e ergueu-se ao nível das figuras maiores da nossa história política.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - A restituição do País a certo número das suas directrizes essenciais e o concurso destes dois homens que se impuseram ao respeito de todos, dentro e fora das fronteiras, abriram-nos as estradas da convalescença e valeram-nos um período magnífico de trabalho na ordem, de confiança na paz, de progresso na unidade.

O Sr. Sousa Rosal: - É preciso, por isso, muita prudência, para não haver uma recaída, porque as recaídas são sempre, muito graves na convalescença.

O Orador: - O meu intuito é, precisamente, evitar uma recaída.
Nem assim escapamos, no entanto, à sensação de tudo estar ainda suspenso de um equilíbrio transitório e incerto.
As forças adversas, que ambicionam arrastar-nos de novo aos abismos de onde saímos, nem renunciaram nem desarmaram. Além de alguns abortados ensaios revolucionários, bastará evocar as duas elucidativas erupções de 1945 e de 1949. Em ambos os momentos os inimigos da Revolução Nacional agitaram a bandeira da democracia e da segunda vez, há dois anos, a mais perigosa arma que lhes ficara nas mãos: a eleição do Chefe do Estado.
Não nos esqueçamos de que das duas vezes - tanto na fase do alarido pré-eleitoral de 1945 como, muito expressamente, na fase da candidatura Norton de Matos - foi enunciado o propósito de destruir e abolir tudo quanto se fizera desde 1926. Se conseguisse o triunfo a oposição, aí estava o tal «lance de dados» em que, nas palavras do parecer, tudo se perderia.