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808 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 96

A Oradora: - Pela experiência de doze anos de serviço social e muito especialmente de quatro anos de trabalho no Instituto de Assistência à Família, sei vivo em milhares de casos, o que poderão render certos artigos da nossa Constituição se se lhes der todo o relevo na sua execução.
Não estou positivamente a ignorar (eu que também o sei e vivo nas lides sociais) o muito que o Estavo Novo realizou já a favor da família.
É com a maior satisfação que notamos que, quer na doutrina quer na prática, a realidade «família» entra como elemento fundamental da vida portuguesa.
Não estou a ignorar toda a acção desenvolvida pelo Instituto de Assistência à Família, que em quatro anos de existência se ocupou e se preocupou já com milhares e milhares de casos e cujo montante de subsídios familiares, para não falar de outras rubricas de subsídios que o mesmo Instituto tem concedido, se eleva em cada ano a milhares e milhares de contos.
Apoiados.
Porque sinceramente reconheço a obra incomparável que, principalmente pelo Ministério do Interior, através do Instituto de Assistência à Família, pelo Subsecretariado das Corporações, através do serviço social das Caixas de Previdência, pelo Ministério das Obras Públicas, através do Comissariado do Desemprego, e pelo Ministério da Educação Nacional, através da Obra das Mães pela Educação Nacional, por tudo, enfim, o que se tem feito, verifica-se ser inteiramente possível realizar integralmente o programa de acção «pró-familia» contido nos n.ºs 1.º a 5.º do artigo 14.º da nossa Constituição. Se esta tarefa social está apenas no inicio, não é sòmente ao Estado Novo que temos de pedir contas.
Penso, Sr. Presidente, que o mal está principalmente nos meandros em que só perde tanta boa iniciativa, onde morrem tantos textos magníficos da nossa legislação social.
É uma questão de mentalidade-que logo acaba em burocratismo feroz, em entraves de funcionalismo-manga-de-alpaca.

Vozes: - Muito bem!

A Oradora: - Bergson falou de um «suplemento de alma» que falta ao nosso tempo. Eu direi, glosando o pensamento do eminente filósofo: é um suplemento de alma que vem faltando em muitos sectores do social, do educacional e em outros mais.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

A Oradora: - Sr. Presidente: não quero demorar-me a fatigar a Câmara...

Vozes: - Não apoiado.

A Oradora: - ... mas, trazendo no coração e nos olhos tantos e tantos lares a que ainda não foi possível acudir com trabalho, com habitação, com meios de tratamento das suas doenças, muito especialmente da tuberculose, recordando as dificuldades de tantos pais em darem aos seus filhos a instrução e educação convenientes, a ouvir, digo, tantas vozes que confiam e esperam a acção supletiva do Estado para desempenho da sua alta missão, eu peço, em nome deles, Sr. Presidente, que nesta revisão constitucional se afirmem mais claramente, mais exigentemente, certos pontos.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

A Oradora: - Porque não se fixar desde já a adopção do salário familiar, indo-se além duma simples aspiração?
Está já feita a experiência com o abono de família. Não chega esta medida para as necessidades vitais da família. E se nos atrasamos, Sr. Presidente, é possível que já não vamos a tempo de acudir ao desmoronamento de tantos lares, e creio que as ruínas, que infelizmente verificamos, são já motivo bastante para nos apressarmos a adoptar o sistema.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

A Oradora: - Se eu trouxesse a VV. Ex.ªs os relatórios das condições económicas das centenas e centenas de famílias que batem à porta do serviço social, VV. Ex.ªs ficariam, como eu, a viver a angústia da demora da aplicação deste remédio vital.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

A Oradora: - Não será ainda possível a instituição do casal de família?
Seriam estes meios eficazes para evitar tantos males que actualmente se verificam com a saída da mulher do lar, que, indo à procura de um salário de compensação, mais não traz muitas vezes do que o agravamento do desequilíbrio do seu orçamento familiar.
Isto, Sr. Presidente, para não falar dos prejuízos, dos às vezes irremediáveis prejuízos, que a sua ausência acarreta na vida moral da família, que também tem o seu delicadíssimo orçamento de valores espirituais.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

A Oradora: - Só é de louvar, só é motivo para portuguêsmente nos orgulharmos, o clamor que de tantos lados se levanta para que a mulher fique e se fixe no lar.
Pedem-no os chefes de família, e ninguém mais do que nós o deseja, pois para ele converge naturalmente toda a riqueza da natureza e alma feminina. Mas, se a mulher não tem lar? Se por qualquer razão renunciou a constituí-lo? Se o não pode constituir? Se o seu lar está extinto? Se, ao contrário, o seu lar, bem vivo e crepitante, exige que a chama seja alimentada? Se o esforço do marido não é suficiente, ou se, indignamente, se recusa a colaborar?
E se a mulher pode, sem detrimento da sua missão de esposa e mãe, estender a sua acção fora do lar?
Não podemos responder a estas situações firmando-nos num bonito axioma. Não se resolvem com palavras questões desta natureza. É preciso ter em conta os factos, e estes são muito complexos para se resolverem por máximas.
Há que procurar por todos os meios que a mulher não saia do seu lar, condicionando porventura, sensatamente, o seu acesso a actividades que possam vir a ser prejudiciais à sua própria condição de mulher e da vida familiar. Mas não basta. Há depois que dar-lhe, direi mesmo, matéria-prima, para que ela possa ser dona de casa.
Como pode uma mulher outorgar-se esse título, se vive num vão de uma escada, se tem que repartir às vezes com cinco e seis famílias a mísera cozinha em que tem de preparar refeição para os seus? Se o quarto onde vive e pelo qual paga uma renda exorbitante, é mais antro de dissolução de costumes e promiscuidade do que abrigo de paz e moralização? Entra então aqui todo um outro problema gravíssimo, o da habitação, que é causa e consequência de muitos outros, o da emigração urbana, por exemplo, problema que, permitindo Deus, hei-de tratar na próxima sessão legislativa com todo o interesse.

Vozes: - Muito bem!