12 DE ABRIL DE 1951 811
cia a existência der maiorias e de minorias. É um bloco ao serviço da Nação. Ninguém foi escolhido por ser monárquico. Ninguém foi escolhido por ser republicano. Todos foram escolhidos por serem bons portugueses, pela sua honestidade mental e - ouso dizê-lo - pela garantia de serenidade atribuída a cada um na avaliação dos altos problemas que interessam à Nação. De resto, a União Nacional está sempre aberta a todos quantos queiram colaborar honestamente no serviço da Pátria. E desta forma apenas se encontram naturalmente excluídos quantos, levados na corrente individualista, tenham transposto os horizontes morais para além de cuja linha se quebra o sentimento de fidelidade à Pátria.
Posso afirmá-lo eu, que desde a primeira hora - muito antes mesmo da aprovação dos seus estatutos, na discussão dos quais tive a honra de intervir - trabalhei activamente como vice-presidente de uma comissão distrital que, pregando esta orientação, foi a primeira a organizar o quadro completo de um distrito inteiro, estabelecendo as comissões políticas em todos os concelhos e freguesias.
Nestas condições, e terminado o acto eleitoral em todo o País, se alguém se der ao trabalho de perscrutar a orientação política de cada um e dessa observação concluir alguma coisa sob o ponto de vista numérico, teremos de reconhecer que estamos em face de uma coincidência puramente fortuita, de uma realidade observada a posteriori.
E se alguém pretender colher uma lição de tal facto, orientando o seu juízo por essas realidades numéricas, poderá, evidentemente, e seja o resultado qual for, tirar daí uma ilação sobre o valor efectivo do número e submeter ou não a essa expressão numérica o seu raciocínio lógico ou os seus sentimentos mais ou menos apaixonados. Apenas haveria a notar que esta liberdade plena, em face do número, só poderiam lògicamente mante-la os monárquicos. E que, logicamente também, ao valor dessa expressão deveriam subordinar-se quantos politicamente informam o seu espírito na essência da doutrina democrática.
Não serei eu, pois, a orientar a minha inteligência em busca de razões desta natureza para proclamar a excelência de uma ideia. Quanto a mim, a apreciação das ideias tem de estar completamente liberta da contingência do número. Quando Pilatos afirmava a ideia da inocência de Cristo em face das acusações que lhe faziam, o número correspondente aos que representavam a verdade era apenas de dois. E o número dos que estavam no erro - e quantos não estariam de boa fé! - representava uma multidão. Porém, o triunfo da ideia que apoiava a condenação dos juizes demonstrava que a supremacia numérica era apenas a expressão do erro.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - A legislação portuguesa livrou-nos da instituição dos jurados, proclamando assim a falência do maior número, a supremacia do qualitativo sobre o quantitativo. Desta maneira sim. Feita a selecção qualitativa, já o número se poderá revestir de um significado exacto. Porém, esta restrição do qualitativo é já por natureza antidemocrática, pois atenta contra o mito do sufrágio universal.
Em meu entender, sujeitar a chefia da Nação ao sufrágio universal seria em muitos casos sujeitar o bem geral às paixões particularistas fie cada um, as soluções da competência às aprovações da incompetência. Se o sufrágio garantisse uma escolha firmada num justo juízo, como seria possível verificar nos jornais que lá fora, onde as democracias têm mais perfeitas tradições, se gastam quantitativos fabulosos para sugestionar as multidões, em vez de as deixar serenamente escolher o candidato proposto? E, ao ver nos jornais as cifras indicadoras dessas quantias astronómicas, expostas até como elemento da propaganda, fico hesitante sobre se o exame à opinião pública fia mais do conceito numeral das moedas do que da expressão moral das consciências. E penso que num regime de tão pura democracia nunca um homem como o Sr. Presidente do Conselho poderia gerir os destinos da Nação, por insuficiência numerária da própria bolsa.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Em países como o nosso, em que uma sensibilidade mais pura, e talvez mais ingénua, põe a opinião pública ao abrigo da discrição absoluta da moeda, nem por isso os defeitos do sistema electivo são menos perturbadores quando pretendem dar uma aparência real ao mito representativo do sufrágio. Todos nós temos presente a atmosfera de excitação geral do País durante os períodos de propaganda e a quebra de ritmo do trabalho que em tais épocas se reflecte de uma maneira geral em toda a vida da Nação.
Não me parece descabido, Sr. Presidente e meus senhores, apresentar a VV. Ex.ªs e justificar a minha opinião quanto a este capítulo da revisão constitucional, cujas disposições eu poderei aceitar como disposições de emergência, mas não como solução estabilizada.
Não me é possível, pois, concordar com algumas opiniões de colegas que, aliás, muito prezo, as quais consideravam que tal assunto devia estar à margem das discussões? Mas como poderia suceder semelhante coisa se é a própria revisão constitucional que nos compele a ocuparmo-nos deste assunto?
A minha opinião é a de que o enunciado destes pontos de vista, pelo que diz respeito à generalidade, é indiscutivelmente oportuno, até como expressão de uma liberdade de pensamento, que, segundo um rumor insidioso, se encontraria limitadamente coarctada nesta Assembleia. É necessário que todos saibam que nem neste nem em ponto algum foi coagida a liberdade total dos Deputados nesta Assembleia, onde as próprias opiniões divergentes não deixaram de ser atendidas com perfeita e desapaixonada correcção.
Só no que diz respeito à discussão na especialidade eu posso considerar a oportunidade discutível.
E os Deputados que nesta Assembleia comungam num credo monárquico têm certamente conquistado o direito de serem bons juizes desta oportunidade, pois ninguém duvidará que desde a primeira hora, fiéis à sua doutrina e de olhos postos no futuro, têm sempre manifestado a altíssima isenção com que oferecem ao Estado Novo a cooperação mais desinteressada.
Vozes: - Muito bem!
O Orador:- Não esqueçamos que foi a doutrinação para o conceito político de uma orgânica antielectiva o que criou o despertar de uma consciência nacional e um estado de espírito que moveu as forças do Exército para realizar a obra de salvamento capaz de revigorar o corpo exânime da Nação. Nunca os monárquicos deixaram de servir a Pátria dentro do Estado republicano. Creio que é fazer justiça ao carácter dos nobres adversários políticos da sua doutrina o pensar que a mesma atitude de honesta fidelidade aos mais altos interesses da Nação orientaria em todas as circunstâncias o seu procedimento. Os monárquicos nunca se julgaram certamente os únicos detentores das virtudes sociais e sabem que não são eles apenas os patriotas capazes de porem acima dos seus conceitos teóricos as realidades mais altas dos interesses da lei.