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810 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 96

por soluções adrede utilizadas), os homens conseguem efectivamente superar os defeitos do regime. Porém, Sr. Presidente, inquieta-me ver gastar energias sobre-humanas a rolar pela encosta acima o penedo de Sísifo, porque vejo que ao fim da subida não se encontra o planalto onde poder firmá-lo de uma maneira estável.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente: a questão que neste momento se propõe é a da salvaguarda do futuro e não apenas a da garantia do presente. Se tal fosse o único fim, creio que não se justificaria sequer tudo quanto fosse além da revisão do Acto Colonial e da sua integração no corpo da Constituição Política do Estado.
Para além do que se refere ao Acto Colonial é justamente a projecção desta Constituição no futuro o que actualmente se encontra em causa. E tal ponto de vista, repito, não colide por forma alguma, antes pelo contrário, com o reconhecimento, aliás indiscutível, do valor pessoal dos homens que encarnam as nossas instituições políticas.
Já nesta Assembleia ouvi, Sr. Presidente, emitir a opinião de que se deveria considerar fora do assunto aquilo que respeita à organização fundamental da estrutura política do Estado.
Em meu entender, porém, este ponto de vista não pode considerar-se inoportuno quando se pensa na construção de uma obra em condições de resistência aos desvarios que no presente abalam o Mundo inteiro. Desvarios que por toda a parte vão comprometendo as próprias instituições a que deram vida, sob o signo do pecado original de um idealismo porventura generoso, mas certamente abstracto, em que se reflectem as utopias do «angelismo» de Rousseau.
Parece que é de olhos postos neste panorama da política exterior, gerado da desorganização das instituições tradicionais; que é da contemplação destas organizações novas, que em poucos, mas agitados, anos substituíram a tranquila operosidade dos estados pelo inquieto e inseguro bulício internacional; que é de olhos fitos nestes sistemas políticos, que trocam a permanência da segurança no trabalho pela permanência de uma desorganização activa; destes governos que, inquietados pela obra da agitação social interna, pretendem - não se compreende a que título - coarctar a liberdade dos outros estados e interferir na orgânica das suas instituições; parece que é em face desta bola de neve que vai avassalando a estabilidade do Mundo que alguns políticos insistem em afirmar que os tempos são outros, que se não volta para trás e que, como na «Parábola dos Cegos» do quadro célebre de Breughel, as nações devem marchar em fila incessante, seguindo as pisadas dos outros, Sempre para a frente, ainda que se afundem umas atrás das outras na torrente que a todas subverterá.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Razão tinha Gustavo Le Bon quando escrevia nas Bases Científicas duma Filosofia da História que:

...as instituições democráticas conduzem a hecatombes mais terríveis que todas as do passado.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - E noutro ponto da sua obra acrescentava:

... o comunismo, a forma última do poder das massas, parece representar uma última evolução da democracia, a qual tem a sua terminação nas ditaduras pessoais, seguindo uma lei já formulada por Platão e viárias vezes verificada no decorrer da História.

O Sr. Jacinto Ferreira: - Verifica-se que a profecia está a ser cumprida.

O Orador: - Creio bem que sim.
São bem insuspeitas estas palavras, ditadas apenas pelo estudo científico e desapaixonado do grande psicólogo das multidões.
Que eu me submeta às fatalidades que é improducente tentar dominar e desista temporàriamente perante as consequências de um inêxito poderá ser medida de prudência à espera de melhores dias; mas que eu proclame a excelência do sistema que destrói e abdique de pensar na própria salvação, porque neste momento se não usa, é, no meu entender, submissão demasiada às leis da moda.

Vozes: - Muito bem!

O Sr. Morais Alçada: - V. Ex.ª disse às leis da moda ou às leis da morte?

O Orador: - Às leis da moda.

O Sr. Morais Alçada: - Ah! Tinha-me parecido ouvir «às leis da morte», mas afinal o sentido das expressões é equivalente...

O Orador: - Sim, as palavras são diferentes, mas creio que não existe equivoco.
A própria sugestão da palavra «Estados implica a apologia do permanente sobre o transitório. A ideia de «Constituição » implica naturalmente o conceito da construção do futuro em condições de resistência aos abalos do presente. Fazer a apologia do que há de louvável no Estado actual bem está. Porém, a maior homenagem que se me afigura possível prestar à obra realizada consiste justamente em pretender ver estabelecida a orgânica do Estado por forma a garantir-lhe a sua continuidade.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Proceder de outra forma seria, perante a minha consciência, deixar-me ofuscar pelo brilho do transitório, conservando-me alheio à superioridade do perene; seria confiar da minha própria indiferença ou da imprevidência política da sociedade a salvaguarda f u lura dos interesses nacionais.
Sr. Presidente: os problemas honestamente tratados não necessitam de ser impulsionados pela paixão quando neles existe uma filosofia política, que, exactamente porque o é, não pode ter outra atmosfera que não seja a da serenidade.
Perante os altos problemas nacionais, todos nós temos de reconhecer que nunca os monárquicos desertaram ou hesitaram em servir os superiores interesses da Nação dentro do Estado republicano. O próprio rei D. Manuel II prestou altíssimos serviços à nossa pátria, apesar de nesse tempo estar em plena vigência uma república particularmente demagógica.
Nunca os monárquicos antepuseram aos interesses sagrados da Pátria o ponto de vista de um partidarismo estreito.
Já o ilustre Deputado Dr. Mário de Figueiredo, com a autoridade que lhe dão as suas funções nesta Assembleia, aqui pôs a questão precisamente nos mesmos termos em que os monárquicos sempre a puseram quando declarou que a organização desta Assembleia desconhe-